A “Designação por Eleição” nas CCDR


Como é sabido, foi recentemente promulgado, pelo Presidente da República, o Decreto-Lei que altera a forma de designação dos Presidentes e Vice-Presidentes das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regionais (CCDR) que se agrupam por “regiões continentais” (Norte; Centro; Lisboa e Vale do Tejo; Alentejo; Algarve). Não irei acrescentar mais ao debate sobre estas entidades mistas…


Como é sabido, foi recentemente promulgado, pelo Presidente da República, o Decreto-Lei que altera a forma de designação dos Presidentes e Vice-Presidentes das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regionais (CCDR) que se agrupam por “regiões continentais” (Norte; Centro; Lisboa e Vale do Tejo; Alentejo; Algarve). Não irei acrescentar mais ao debate sobre estas entidades mistas entre desconcentração e descentralização, num novo modelo híbrido que se avizinha. Concentrar-me-ei na forma de designação dos seus Presidentes e Vice-Presidentes.

O Partido Socialista há muito que é defensor da regionalização, mas na contingência de ser um debate político difícil no país, como se verificou aquando do referendo realizado em 1998, através da exploração do mais básico instinto “anti-políticos” e “anti-tachos” acabamos por adotar um modelo mitigado de descentralização (se é que assim se pode apelidar), que vá de encontro ao programa eleitoral do Governo.

Obviamente que em democracia nada é mais legítimo que o poder advindo do voto popular, o que significa, necessariamente, a existência de representantes políticos legitimados por esse mesmo voto, que vulgarmente apelidamos de “políticos”.

Esta necessidade urgente e imperiosa de descentralizar o poder no país, reconhecida pelos autarcas e por todos aqueles que dependem de uma licença, que seja, por parte da administração pública, seria, obviamente, poluído pela demagogia dos “tachos”. O PS, consciente disso mesmo e confrontado como o seu compromisso eleitoral, encetou, então, esta reforma de designação dos titulares dos cargos de direção superior das CCDR.

O problema é que este modelo de designação por eleições indiretas de autarcas, em meu entender, comporta outros problemas, também eles, de legitimidade, para além dos recentemente noticiados, quanto ao acordo entre as cúpulas do PS e PSD para escolher os candidatos à eleição.

Em primeiro lugar, considero que os candidatos a desempenhar esses cargos deveriam nascer de forma espontânea e não por escolha das lideranças dos partidos políticos e impostos aos diversos colégios eleitorais. Esse modelo em nada alteraria aquilo que já vemos hoje com a designação por parte do Governo. O Governo designa em função daqueles que entende deverem desempenhar esse cargo. Portanto escolher o candidato que depois se apresentará como candidato único a sufrágio é um modelo democrático, assim um pouco, pífio.

Agravado com o acordo do “tu indicas A para Presidente e eu indico B para Vice-Presidente”. Este género de acordos é fazer, precisamente, aquilo que tem levado a um descontentamento generalizado dos cidadãos em relação ao sistema político-partidário tal como o conhecíamos até há bem pouco tempo.

Os tempos são outros e genuinamente considero que os candidatos devem surgir como reflexo necessário de uma vontade individual e um programa de ação concreto com uma visão do desenvolvimento de uma região e que é colocado à consideração do colégio eleitoral em questão. O que não parece que vá acontecer.

Em segundo, este modelo de eleição indireta para os cargos referidos desvirtua e muito a representação eleitoral das diversas áreas geográficas. “Mutatis Mutandis” seria quase como o distrito de Portalegre passar a eleger 10 Deputados para a Assembleia da República e o distrito de Setúbal passar a eleger 5 deputados. Explicitarei com o caso concreto da eleição para Presidente da CCDR da Região do Centro, que abrange vários municípios do distrito de Aveiro, Viseu, Santarém e Lisboa e todos os municípios dos distritos de Castelo Branco, Coimbra, Leiria e Guarda, num total de 99 municípios/concelhos.

De acordo com o estabelecido no Decreto-Lei o Presidente da CCDR será eleito por um colégio constituído por Presidentes de Câmara e Vereadores, Membros eleitos das Assembleias Municipais e Presidentes de Junta de Freguesia que são membros não eleitos nas Assembleias Municipais o que significa, grosso modo, 3600 eleitores nesta região (651 presidentes e vereadores de câmaras municipais; 1960 membros eleitos de assembleias municipais e 971 presidentes de juntas de freguesia).

Tendo em conta isto, dá-se o caso dos municípios do distrito da Guarda, que representam cerca de 160 mil eleitores, representarem 16% do colégio eleitoral para o Presidente da CCDR Centro e os municípios dos distritos de Leiria (420 mil eleitores) e Coimbra (386 mil eleitores) representarem 15% e 19% respetivamente.

Como é que isto é possível? A resposta é bastante simples. Os Presidentes de Junta de Freguesia poderem votar desvirtua por completo a representatividade eleitoral dos municípios.

Nada me move contra as freguesias e os Presidentes de Junta de Freguesia, que considero terem a mesma dignidade e igual legitimidade democrática que todos os outros eleitos nas suas próprias circunscrições, mas estando já o seu território representado através dos eleitos para as Câmaras e Assembleias Municipais, não faz sentido que exista esta dupla representatividade.

Ao definirmos um colégio eleitoral, como o que foi definido, leva a casos como nos municípios da Guarda em que o colégio eleitoral é de 94 eleitores, apesar dos cidadãos eleitores do concelho serem cerca de 39 mil  e os municípios de Leiria e Coimbra,  com mais de 120 mil eleitores terem 62 votos no colégio eleitoral, apenas e só porque na Guarda existem 43 freguesias e em Leiria e Coimbra 18 freguesias.

E muitos outros casos existem. Veja-se os casos dos municípios de Aveiro e Ovar, que representam mais de 70 mil e 50 mil eleitores, respetivamente, mas com poucas freguesias no seu território. Estes municípios têm bem menos votos no colégio eleitoral que municípios de dimensão bem menor, como são os casos dos municípios do Fundão, Gouveia, Cantanhede, Covilhã, Pinhel, Sabugal, Seia, Trancoso, São Pedro do Sul.

Concluindo, (i) considero que os candidatos às CCDR deverão nascer de candidatos que se apresentem a sufrágio e que protagonizem projetos/programas de desenvolvimento regional com marca identitária própria e não resultado de cozinhado entre PS e PSD e (ii) o modelo de eleição terá de ser revisto de forma a ser mais consentâneo com a população que é representada.

 

Pedro Vaz

A “Designação por Eleição” nas CCDR


Como é sabido, foi recentemente promulgado, pelo Presidente da República, o Decreto-Lei que altera a forma de designação dos Presidentes e Vice-Presidentes das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regionais (CCDR) que se agrupam por “regiões continentais” (Norte; Centro; Lisboa e Vale do Tejo; Alentejo; Algarve). Não irei acrescentar mais ao debate sobre estas entidades mistas…


Como é sabido, foi recentemente promulgado, pelo Presidente da República, o Decreto-Lei que altera a forma de designação dos Presidentes e Vice-Presidentes das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regionais (CCDR) que se agrupam por “regiões continentais” (Norte; Centro; Lisboa e Vale do Tejo; Alentejo; Algarve). Não irei acrescentar mais ao debate sobre estas entidades mistas entre desconcentração e descentralização, num novo modelo híbrido que se avizinha. Concentrar-me-ei na forma de designação dos seus Presidentes e Vice-Presidentes.

O Partido Socialista há muito que é defensor da regionalização, mas na contingência de ser um debate político difícil no país, como se verificou aquando do referendo realizado em 1998, através da exploração do mais básico instinto “anti-políticos” e “anti-tachos” acabamos por adotar um modelo mitigado de descentralização (se é que assim se pode apelidar), que vá de encontro ao programa eleitoral do Governo.

Obviamente que em democracia nada é mais legítimo que o poder advindo do voto popular, o que significa, necessariamente, a existência de representantes políticos legitimados por esse mesmo voto, que vulgarmente apelidamos de “políticos”.

Esta necessidade urgente e imperiosa de descentralizar o poder no país, reconhecida pelos autarcas e por todos aqueles que dependem de uma licença, que seja, por parte da administração pública, seria, obviamente, poluído pela demagogia dos “tachos”. O PS, consciente disso mesmo e confrontado como o seu compromisso eleitoral, encetou, então, esta reforma de designação dos titulares dos cargos de direção superior das CCDR.

O problema é que este modelo de designação por eleições indiretas de autarcas, em meu entender, comporta outros problemas, também eles, de legitimidade, para além dos recentemente noticiados, quanto ao acordo entre as cúpulas do PS e PSD para escolher os candidatos à eleição.

Em primeiro lugar, considero que os candidatos a desempenhar esses cargos deveriam nascer de forma espontânea e não por escolha das lideranças dos partidos políticos e impostos aos diversos colégios eleitorais. Esse modelo em nada alteraria aquilo que já vemos hoje com a designação por parte do Governo. O Governo designa em função daqueles que entende deverem desempenhar esse cargo. Portanto escolher o candidato que depois se apresentará como candidato único a sufrágio é um modelo democrático, assim um pouco, pífio.

Agravado com o acordo do “tu indicas A para Presidente e eu indico B para Vice-Presidente”. Este género de acordos é fazer, precisamente, aquilo que tem levado a um descontentamento generalizado dos cidadãos em relação ao sistema político-partidário tal como o conhecíamos até há bem pouco tempo.

Os tempos são outros e genuinamente considero que os candidatos devem surgir como reflexo necessário de uma vontade individual e um programa de ação concreto com uma visão do desenvolvimento de uma região e que é colocado à consideração do colégio eleitoral em questão. O que não parece que vá acontecer.

Em segundo, este modelo de eleição indireta para os cargos referidos desvirtua e muito a representação eleitoral das diversas áreas geográficas. “Mutatis Mutandis” seria quase como o distrito de Portalegre passar a eleger 10 Deputados para a Assembleia da República e o distrito de Setúbal passar a eleger 5 deputados. Explicitarei com o caso concreto da eleição para Presidente da CCDR da Região do Centro, que abrange vários municípios do distrito de Aveiro, Viseu, Santarém e Lisboa e todos os municípios dos distritos de Castelo Branco, Coimbra, Leiria e Guarda, num total de 99 municípios/concelhos.

De acordo com o estabelecido no Decreto-Lei o Presidente da CCDR será eleito por um colégio constituído por Presidentes de Câmara e Vereadores, Membros eleitos das Assembleias Municipais e Presidentes de Junta de Freguesia que são membros não eleitos nas Assembleias Municipais o que significa, grosso modo, 3600 eleitores nesta região (651 presidentes e vereadores de câmaras municipais; 1960 membros eleitos de assembleias municipais e 971 presidentes de juntas de freguesia).

Tendo em conta isto, dá-se o caso dos municípios do distrito da Guarda, que representam cerca de 160 mil eleitores, representarem 16% do colégio eleitoral para o Presidente da CCDR Centro e os municípios dos distritos de Leiria (420 mil eleitores) e Coimbra (386 mil eleitores) representarem 15% e 19% respetivamente.

Como é que isto é possível? A resposta é bastante simples. Os Presidentes de Junta de Freguesia poderem votar desvirtua por completo a representatividade eleitoral dos municípios.

Nada me move contra as freguesias e os Presidentes de Junta de Freguesia, que considero terem a mesma dignidade e igual legitimidade democrática que todos os outros eleitos nas suas próprias circunscrições, mas estando já o seu território representado através dos eleitos para as Câmaras e Assembleias Municipais, não faz sentido que exista esta dupla representatividade.

Ao definirmos um colégio eleitoral, como o que foi definido, leva a casos como nos municípios da Guarda em que o colégio eleitoral é de 94 eleitores, apesar dos cidadãos eleitores do concelho serem cerca de 39 mil  e os municípios de Leiria e Coimbra,  com mais de 120 mil eleitores terem 62 votos no colégio eleitoral, apenas e só porque na Guarda existem 43 freguesias e em Leiria e Coimbra 18 freguesias.

E muitos outros casos existem. Veja-se os casos dos municípios de Aveiro e Ovar, que representam mais de 70 mil e 50 mil eleitores, respetivamente, mas com poucas freguesias no seu território. Estes municípios têm bem menos votos no colégio eleitoral que municípios de dimensão bem menor, como são os casos dos municípios do Fundão, Gouveia, Cantanhede, Covilhã, Pinhel, Sabugal, Seia, Trancoso, São Pedro do Sul.

Concluindo, (i) considero que os candidatos às CCDR deverão nascer de candidatos que se apresentem a sufrágio e que protagonizem projetos/programas de desenvolvimento regional com marca identitária própria e não resultado de cozinhado entre PS e PSD e (ii) o modelo de eleição terá de ser revisto de forma a ser mais consentâneo com a população que é representada.

 

Pedro Vaz