A factualidade contra os preconceitos


O mundo está bem melhor do que imaginamos. O que não significa que esteja tudo bem. Longe disso.


Nesta era de grandes incertezas, com acentuada tendência para o pessimismo, resolvi ler com toda a atenção o livro de Hans Rosling Factfulness, cuja tradução, factualidade, copiei para o título desta crónica.

Hans Rosling foi um médico sueco, especialista em saúde internacional, que conheceu no terreno as situações mais dramáticas em alguns dos países mais pobres do mundo.

Paralelamente à sua atividade médica resolveu, em colaboração com familiares, pesquisar e coligir dados concretos sobre algumas das questões que a maioria de nós damos por sabedoria adquirida. Alguns exemplos: todos, ou quase todos, acreditamos que, nos últimos 20 anos, a população mundial a viver em pobreza extrema aumentou. Ou que a percentagem de crianças até um ano de idade vacinadas no mundo inteiro é baixa. Ou ainda que o número de mortes por desastres naturais aumentou nos últimos cem anos.

Pois bem, se acreditamos nisto, estamos errados. Nos últimos 20 anos, a população mundial a viver em pobreza extrema diminuiu quase para metade; a percentagem de crianças vacinadas em todo o mundo é de 80% e o número de mortes por desastres naturais nos últimos cem anos diminuiu para mais de metade.

E o que nos leva, então, a alimentar estes e outros preconceitos, quando os factos os desmentem? O que nos leva mesmo a duvidar de dados que contrariam estas ideias que conservamos há décadas?

A maioria de nós acreditamos e defendemos que o mundo está cada vez pior, dividido em duas partes antagónicas: ricos, de um lado; e pobres, a imensa maioria, do outro.

É contra esta tese de um mundo bipolar que Hans Rosling nos confronta com dados concretos, isto é, com factos.

A esta teoria do mundo dividido entre pobres e ricos, Rosling chama “o instinto do fosso”. Para o combater, divide os países do mundo em quatro níveis, chegando à conclusão de que a maioria da população mundial – 70% – vive em países de rendimento médio (níveis 2 e 3). Isto é, 5 mil milhões dos 7 mil milhões de seres humanos vivem com condições acima da pobreza extrema.

Regressando à pergunta sobre a nossa visão pessimista do mundo, não será difícil concluir que a avalanche de informação diária ajuda, de forma decisiva, a cimentar o preconceito. Somos alimentados por “más notícias”. Ignoramos, quase totalmente, o “progresso secreto e silencioso”.

Rosling escreve: “Mantenhamos no espírito que as mudanças positivas poderão ser mais comuns, mas não nos encontram. Precisamos de as encontrar. E, se procurarmos nas estatísticas, elas estão por todo o lado”.

Conclusão: o mundo está bem melhor do que imaginamos. O que não significa que esteja tudo bem. Longe disso.

Vale a pena ler Factfulness, nem que seja para tentar contrariar tudo o que lá está escrito. Só que convém combater factos com factos.

Precisamos mesmo de descontrair. Outra sugestão pode ser a da ministra da Cultura: “ Um drink de fim de tarde”.

 

Jornalista