Terminaram as aulas. Começaram as férias. Não sei quem estava mais ansioso pela chegada deste momento, se as crianças, se nós, os pais.
Nos anos anteriores, à medida que se aproximava o último dia de aulas, os alunos iam ficando mais animados e entusiasmados com as férias grandes enquanto, ao mesmo tempo, esta aproximação despertava nos pais um sentimento de sufoco misturado com um desespero antecipado. As férias grandes já não eram fáceis de planear, nem tampouco eram recebidas de braços abertos pelos progenitores. Associadas às férias surgiam outras preocupações que se prendiam com a ocupação dos tempos livres das crianças e com a necessidade de encontrar quem cuidasse deles durante os dias de trabalho dos pais. As soluções passavam por vários formatos, consoante as carteiras, as redes familiares e a oferta de proximidade. Uns ficavam à guarda dos avós, outros das empregadas, outros iam para ATL; ainda havia os que passavam semanas nos campos de férias e outros, simplesmente, ficavam sozinhos em casa, com ou sem irmãos.
Este ano, parte destas soluções criam algumas dificuldades e inquietações, tendo em conta o contexto em que vivemos. O leque de opções encurtou bastante e, como se não fosse suficiente, a simples possibilidade de ficarem em casa assumiu uma dimensão alarmante para aqueles pais que já não suportavam ver os filhos em frente a um ecrã durante todo o santo dia.
É com este misto de sentimentos que celebrei o final das aulas. Um pouco esquizofrénico, podem dizer. Mas foi assim que me senti. Aliviada por não ter de andar de quarto em quarto a policiar as aulas e as tarefas que tinham de enviar e assustada com a perspetiva de ter os meus adolescentes em casa, com o dia livre, viciados em consolas, computadores e telemóveis.
Se lhes falo em jogar à bola no parque, respondem-me com “covid”; se sugiro um passeio ao ar livre, a resposta é igual; uma ida à praia tornou-se uma aventura em que me fazem sentir que estou a colocá-los em perigo de vida, ainda que vamos para uma praia deserta. Só de pensar que hoje é o primeiro dia de férias até ao dia 14 de setembro… e que ainda não tenho nada planeado para os dias que aí vêm, porque estamos a viver um dia de cada vez, sem certezas sobre o dia de amanhã, fico desconcertada e apreensiva pelos meus filhos.
Foi o ano mais difícil que alguma vez tiveram, em que mais lhes foi exigido e em tempo acelerado, e, mesmo assim, é como se ainda estivessem sujeitos a toda esta pressão, sem poderem desfrutar do melhor que estas idades têm: as férias.
A minha geração não sofreu nenhuma destas privações nem estivemos expostos a esta incerteza sobre o futuro, como estas crianças e jovens estão a ser. Todos, à sua maneira, acrescentaram às suas preocupações e problemas esta incerteza geral e intemporal que lhes retira a confiança necessária para que cresçam e se desenvolvam com estabilidade.
Não são ainda conhecidos quais os efeitos sociais e psicológicos do confinamento e desta pandemia, que trouxe medo e insegurança para todos nós. Mas uma coisa é certa: os mais novos deram-nos muitas lições de responsabilidade e sobre a forma imperativa de nos comportarmos e de recolhermos às nossas casas quando nos foi pedido. À sua dimensão, adaptaram-se às novas regras, e muitos deles operaram verdadeiros milagres de aprendizagem, sem condições mínimas para o fazerem. Mas não desistiram e foram exemplo para outros que tinham a sua vida mais facilitada. Na adversidade, houve muitas revelações e empenho que se evidenciaram. E são estes protagonistas as grandes referências que devemos enaltecer e recordar.
Não obstante os resultados escolares serem satisfatórios ou não, não esqueçamos que estas crianças não irão ter férias – pelo menos, não da forma que as idealizavam. O período de tempo livre que começa agora será um prolongamento desta tensão, mas sem as aulas digitais. A gestão dos dias será igualmente desafiante para pais e filhos.
Escreve quinzenalmente