A acreditação do curso de Medicina da Universidade Católica Portuguesa (UCP) tem sido alvo de muitas alterações. No ano passado – mais concretamente em novembro de 2019 –, a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES) recusou a validação do curso, o que levou o estabelecimento de ensino a recorrer, recurso esse que também foi chumbado. Ainda no ano passado avançou com uma nova proposta para acreditação, mas continua, já em 2020, em “processo de avaliação”. E, ao que o i conseguiu apurar, haverá ainda um alargamento no prazo previsto para a decisão, que decorreria até junho.
“A proposta de novo ciclo de estudos de Mestrado Integrado em Medicina está em processo de avaliação pela Comissão de Avaliação (CAE) nomeada pela A3ES. Os prazos habituais para decisão sobre novos ciclos de estudo não se aplicam neste ano civil. A A3ES esclareceu que, nos termos do Decreto-Lei n.o 10-A/2020, de 13 de março, que entrou em vigor no dia 14 de março, os prazos administrativos ficaram suspensos até 2 de maio, pelo que existirá necessariamente um alargamento do prazo previsto para a decisão”, sublinhou Maria Inês Romba, diretora do gabinete de comunicação da universidade.
De acordo com a A3ES, também contactada pelo i, o processo anterior foi encerrado e está agora a decorrer o novo, ainda sem qualquer decisão. “A Agência não interfere no processo até ter o relatório final da CAE. Os processos dos novos ciclos de estudos são documentais, sem visita, pelo que a pandemia não teve efeito significativo”, revelou Alberto Amaral, presidente da A3ES.
O chumbo inicial por parte da agência, recorde-se, esteve relacionado com dois pareceres negativos tanto da Ordem dos Médicos como da comissão de avaliação nomeada pela A3ES, que alertaram para o facto de a proposta apresentada pela universidade não ser suficientemente consistente para seguir em frente. A Ordem dos Médicos, por exemplo, alegou que existiam falhas em algumas questões pedagógicas, nomeadamente divergências existentes em relação a uma disciplina e à falta de atividade prática no curso.
Além disso, o presidente da A3ES explicou também, na altura, que havia ainda a questão da sobreposição de ofertas, dado que seria uma terceira formação em medicina só em Lisboa, juntando-se à Universidade de Lisboa e à Universidade Nova de Lisboa. Na altura, a UCP considerou o chumbo uma violação do princípio leal da concorrência.
“Discórdia e estupefação”
Apesar de o curso na UCP estar em processo de avaliação, novas vagas para as faculdades de Medicina não vão abrir no próximo ano letivo. Tal como foi referido pelo Conselho de Escolas Médicas Portuguesas (CEMP), as escolas não estão interessadas em aumentar vagas e falam mesmo em “discórdia e estupefação” em relação ao despacho que foi publicado. Além disso, apesar de o Governo dar a possibilidade de as instituições aumentarem até 15% o número de vagas, sublinharam também que enviaram uma carta ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a pedir esclarecimentos, mas alegam nunca terem recebido qualquer resposta.
“Infelizmente, tal nunca aconteceu, tendo o ministro [Manuel Heitor] implicitamente declinado o nosso convite. Manifestamos, pois, a nossa estranheza e profundo desagrado pelo facto de o CEMP ter sido sistematicamente ignorado, nomeadamente no que respeita a alguns aspetos tão básicos como seja quanto à existência, ou não, de condições de acolhimento deste excedente”, pode ler-se na nota divulgada, na qual é também referido que o aumento do número de vagas pode vir a prejudicar o ensino.
“O aumento do número de alunos, a verificar-se, iria naturalmente degradar a qualidade do ensino, sobretudo nas vertentes clínicas, dada a manifesta incapacidade de cumprir rácios aceitáveis. O aumento do número de alunos não equivale a um aumento do número de médicos futuros, sobretudo especialistas. Só vai engrossar o número de médicos sem acesso a especialização, não contribuindo em nada para colmatar as eventuais assimetrias na distribuição de médicos em Portugal”, confessou o CEMP.
Já o Governo admitiu não conseguir perceber a posição do CEMP, uma vez que considera positivo o aumento de vagas em Medicina. Manuel Heitor realçou mesmo que esta pode ser uma forma de o setor chegar a mais estudantes.
“Queremos ter mais jovens que querem estudar medicina e, portanto, é algo que nos deve encher de orgulho e de ambição para podermos alargar em Portugal o ensino das ciências biomédicas”, sublinhou, indicando que, há pouco tempo, visitou universidades e politécnicos e que houve dirigentes a querer a abertura de mais vagas em Medicina.
“Esta é uma área em que, ao contrário de muitas outras, temos uma vaga para cada quatro candidatos e, por isso, não posso acreditar que não há espaço para os portugueses, mas há espaço para os estudantes internacionais”, rematou Manuel Heitor.