A Comissão Executiva da Iniciativa Popular de Referendo “A (des)Penalização da morte a pedido” entregou, ontem, no Parlamento uma petição subscrita por 95.287 eleitores a favor da consulta popular. Isilda Pegado, António Pinheiro Torres e José Seabra Duque dirigiram-se a São Bento, onde, durante uma audiência com Eduardo Ferro Rodrigues e Luís Marques Guedes, entregaram mais 35.287 assinaturas do que aquelas que são necessárias para que a consulta popular sobre a eutanásia seja discutida em plenário.
Ao i, a presidente da Federação Portuguesa pela Vida, responsável pelo movimento #Simavida, diz que o número de assinaturas recolhido, por todo o país, é motivo para satisfação. “Recolher num mês 95 mil assinaturas é, de facto, revelador da adesão que esta iniciativa popular teve”, defende, lembrando que a recolha de assinaturas teve início no dia 8 de fevereiro. “É evidente este desejo do povo de se pronunciar sobre esta matéria”, afirma.
Apesar de a barreira dos 60 mil ter sido ultrapassada, é preciso ainda uma maioria no hemiciclo na hora da votação. Quer isto dizer que a proposta de referendo será discutida no Parlamento e posteriormente votada – e, tal como explica ao i Isilda Pegado, “uma coisa é a posição ideológica a favor da eutanásia, outra coisa é admitir um referendo”. Dos nove partidos com assento parlamentar, apenas o CDS e o Chega apoiavam, em fevereiro, a consulta popular.
Além da Área Metropolitana de Lisboa e do Grande Porto, houve um número “significativo” de assinaturas recolhidos em cidades como Braga, Évora, Setúbal ou na região autónoma da Madeira.
Eutanásia, referendo e lei fundamental Perante a possibilidade de a consulta popular em questão não vir a tornar-se realidade, apesar do número “muito significativo” de assinaturas recolhido, Isilda Pegado relembra que a realização de uma iniciativa popular de referendo está “prevista na Constituição e tem uma lei que a sustenta”. “Isto é meramente decorativo? Ou é um instrumento que o Parlamento quer dignificar?”, questiona a presidente da FPV, sublinhando que “se é meramente decorativo, é preferível que se retire da Constituição”.
Apesar de a consulta popular estar previstas na Lei Fundamental, para qualquer que seja o tema que consiga recolher as assinaturas necessárias, o assunto em discussão parece dividir constitucionalistas.
Na última segunda-feira, 15 professores catedráticos de Direito Público emitiram uma Declaração Pública sobre a despenalização da eutanásia. No documento, os especialistas consideravam que os cinco projetos de lei aprovados a 20 de fevereiro são inconstitucionais. Uma das razões que nomes como Jorge Miranda, um dos pais da Constituição, Fausto de Quadros, Jorge Bacelar Gouveia ou Sérvulo Correia evocam é a de que os projetos do PS, BE, PEV, PAN e IL, violam, “em termos flagrantes, o primeiro dos direitos fundamentais do ser humano – o direito à vida – e a sua inviolabilidade “.
Já Vital Moreira, após a divulgação desta declaração, contrariou a ideia defendida pelos quinze colegas. Num texto no blogue Causa Nossa, Vital Moreira considera que “não se deve subverter a lógica defensiva contra terceiros dos direitos de personalidade e de liberdade, transformando-os em obrigações. Direito à vida significa direito a viver mas não uma obrigação de viver em qualquer circunstância”.
“É muito relevante que pessoas de reconhecidíssima capacidade científica tomem esta posição”, defende ao i a presidente da FPV, sublinhando que a “é um belíssimo argumento contra a eutanásia”. “Mas não é a mesma coisa que o referendo”, alerta, recordando também que a eutanásia não foi levada a voto popular nas últimas eleições legislativas.
“Esta matéria não estava no programa dos maiores partidos políticos. Estava no do PAN e no do BE, mas em mais nenhum outro partido se encontrava a posição sobre a eutanásia. A ilegitimidade política de todos os outros partidos é gritante”, afirma.
Após a primeira reunião sobre o assunto, a 3 de junho, depois da interrupção da discussão, consequente da pandemia de covid-19, uma segunda reunião decorreu ontem. Na segunda reunião sobre o tema depois de os cinco projetos de lei serem aprovados, ficou decidido que as entidades que pediram para ser ouvidas sobre o tema terão até dia 1 de julho para informar se o farão presencialmente ou por escrito. Segundo a agência Lusa, a votação final não acontecerá antes de setembro.