A Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), em colaboração com a Agência de Investigação Clínica e Inovação Biomédica (AICIB), criou um apoio especial para projetos de implementação rápida para soluções inovadoras de resposta à covid-19 – o concurso Research4COVID. Das propostas submetidas entre 24 de março e 5 de abril, foram selecionadas 66 e, desse total, três projetos de implementação rápida têm como coordenadores três membros da comissão de avaliação – Margarida Correia-Neves, Pedro Morgado e Nuno Lunet.
Os resultados do concurso foram apresentados em duas semanas e Margarida Correia-Neves, da Universidade do Minho, viu o projeto que coordena, sobre a presença de anticorpos e diferentes formas de diagnóstico, aprovado com o máximo de financiamento, 30 mil euros. Já o projeto de Pedro Morgado, na área da saúde mental durante a pandemia, também da Universidade do Minho, será financiado com 29.500 euros. O de Nuno Lunet, do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, sobre o impacto da pandemia nos cuidados prestados a doentes oncológicos, vai contar com 22.020 euros.
Reação dos investigadores Questionados pelo i sobre este conflito de interesses, Pedro Morgado e Margarida Correia-Neves, ambos da Universidade do Minho, enviaram uma resposta conjunta, na qual explicam que informaram a FCT e a AICIB “da existência dos conflitos de interesses”. Asseguram ainda que não receberam qualquer proposta para avaliarem trabalhos próprios ou da sua instituição. Além disso, referem que lhes foi solicitada emissão de “parecer sobre um conjunto reduzido de propostas pela sra. Presidente da FCT, professora Helena Pereira, e pela sra. coordenadora da AICIB e Comissão de Avaliação, professora Catarina Oliveira”.
“A minha intervenção neste âmbito limitou-se à emissão do meu parecer sobre as propostas recebidas, não tendo participado no subsequente processo de tomada de decisão”, acrescentaram.
Também a presidente da FCT, Helena Pereira, referiu ao i que cada candidatura foi avaliada por dois avaliadores e que “os critérios de conflitos de interesse são uma condição essencial e foi-lhes dada particular atenção, pelo que nenhum avaliador esteve envolvido na avaliação de uma candidatura do seu grupo de investigação ou do seu centro de investigação nem, evidentemente, duma candidatura sua”.
A mesma explicação deu Catarina Resende Oliveira, coordenadora da comissão de avaliação do concurso em questão e presidente da AICIB, que avançou que “nenhum avaliador fez a análise de projetos em que ele próprio, elementos da sua equipa de investigação ou a sua unidade de investigação estivessem envolvidos, ou ainda dos projetos em relação aos quais declarou existir conflito de interesses”.
Nesta primeira fase do concurso Research4COVID foram, no total, avaliadas 284 propostas, distribuídas pelas áreas de diagnóstico, estudos clínicos e epidemiológicos, prevenção e terapêutica. Os 66 projetos aprovados na primeira fase correspondem a um investimento de 1,8 milhões de euros. A segunda fase do concurso terminou esta sexta-feira.
Sindicato Desafia MP A agir Para o presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), Gonçalo Velho, “houve alguma precipitação no processo e isso tem a ver com algumas falhas que existem”. A primeira, diz, é a estratégia de financiamento: “Há a ideia de ter uma percentagem relevante de financiamento à investigação por financiamento competitivo e não por financiamento estrutural, o que cria uma debilidade do ponto de vista das instituições”. E isso, acrescenta Gonçalo Velho, vê-se agora: “Era preciso pôr as instituições a funcionar e elas não tinham financiamento, portanto teve de se criar essa linha à parte”.
A segunda falha apontada “é o facto de o financiamento ter o objetivo de financiar quase diretamente algumas instituições, as que tinham trabalho produzido”: “Houve um simulacro de concurso”.
O presidente do SNESup assegura igualmente que, como “o meio é relativamente pequeno”, “os vencedores acabaram por ser aqueles que estão no painel de avaliação”.
“O que vemos neste caso é um conflito de interesses em que há uma possibilidade de benefício para alguns, a possibilidade de um conluio de interesses que beneficia os projetos de uns em detrimento de outros”, critica, apelando a que o Ministério Público não fique de braços cruzados.
“Esta situação levanta a possibilidade de intervenção do Ministério Público, o nosso propósito é que a prática possa ser alterada. São habituais as queixas acerca de conflitos de interesses e de se criarem pequenos núcleos que tomam conta da questão da avaliação de projetos e que têm repercussões em toda a ciência que se faz em Portugal. Criam-se pequenos feudos em determinadas áreas do ponto de vista da avaliação”, denuncia Gonçalo Velho, concluindo que “a partir do momento em que o caso é noticiado, o Ministério Público não terá outro remédio que não o de investigar”: “É a sua obrigação”.
“Os critérios de conflitos de interesses são uma condição essencial e foi-lhes dada particular atenção, pelo que nenhum avaliador esteve envolvido na avaliação de uma candidatura do seu grupo de investigação ou do seu centro de investigação nem, evidentemente, de uma candidatura sua”