Os pés fora da manta


De entre as diversas notícias que foram sendo divulgadas durante este período de confinamento e emergência, fiquei especialmente inquieto e sobressaltado com a avassaladora dimensão das necessidades em prover alimentação no imediato a crianças, idosos e famílias que não conseguem ter o mínimo de rendimento para poderem fazer uma refeição diária que seja.


Todos sabemos a dimensão da catástrofe social que foram os anos do programa de ajustamento da troika, incluindo a política de ir para além da troika (assumida publicamente por Passos Coelho em diversas ocasiões, em 2011, e das quais a comunicação social deu boa nota). Esse programa ficou concluído em 2014, e em 2015 um novo Governo, com o objetivo claro de devolver direitos e rendimentos aos portugueses, entrou em funções, e cujos resultados podem ser considerados como um sucesso (fim da sobretaxa no IRS, aumento do emprego, redução do défice e da dívida, etc.).

Também todos estamos recordados das notícias que davam conta das necessidades de alimentação à população mais carenciada com o surgimento em todo o país de cantinas sociais, das refeições escolares em período de férias e outras iniciativas que iriam surgindo, para nossa vergonha enquanto comunidade que não é capaz de apoiar socialmente de forma conveniente sem a caridade do apoio alimentar.

Nos últimos anos, e à medida que as condições socioeconómicas do país foram melhorando, com o aumento sucessivo do salário mínimo e o país a viver, até há bem pouco tempo, em quase pleno emprego, esperava-se que, mesmo em condições extraordinárias como o tempo em que vivemos, as coisas não estivessem praticamente iguais.

Tendo em conta o que se passa, não deixo de ficar assoberbado com o pouco caminho que fizemos em matéria social quanto aos mais desprotegidos.

Em menos de uma semana, e após o encerramento das escolas decretado pelo Governo, as notícias começaram a correr com a abertura das cantinas escolares, mesmo com as escolas encerradas, porque elas proporcionam as únicas, repito, únicas refeições de milhares de crianças e jovens durante o dia. Isto para não falar dos massivos (financeiramente) programas de apoio alimentar espalhados por todo o país a famílias, idosos e populações de risco, e até mesmo a pessoas que se encontram ou encontravam até há dias a trabalhar e a receber os seus salários.

Numa questão de dias e semanas, temos hoje milhares de pessoas que subsistem apenas destes apoios. Pergunto-me o que temos feito ao longo dos últimos anos (Estado central e autarquias) que faz com que, não obstante o emprego e as melhorias de condições de vida, existam tantos milhares de portugueses que não saíram deste círculo vicioso e viciado.

Dá a sensação que as políticas públicas do setor e os apoios sociais do Estado se resumem à criação de um gigantesco banco alimentar que se ativa em maior ou menor dimensão em função dos tempos de necessidade.

Não estou com a isto a dizer que está errado o que se está a fazer neste momento em providenciar alimentação a quem dela necessita para sobreviver. Longe, muito longe disso, mas este tempo de crise de saúde pública e económica, que se ergue à nossa frente como um Evereste, terá também de servir para refletirmos sobre a forma como pensamos as políticas públicas e os apoios sociais aos mais desfavorecidos. Um país da União Europeia, da OCDE e da zona euro não pode ter um sistema social tão frágil que não dê às famílias as condições para que, em tempos de normalidade, possam sair da necessidade de ter de andar à espera da caridade. A comparação com o que se passa nos Estados Unidos, onde se veem longas filas de carros para as pessoas receberem apoio alimentar, não colhe, pois o Estado social, em terras do Tio Sam, é coisa quase inexistente.


Os pés fora da manta


De entre as diversas notícias que foram sendo divulgadas durante este período de confinamento e emergência, fiquei especialmente inquieto e sobressaltado com a avassaladora dimensão das necessidades em prover alimentação no imediato a crianças, idosos e famílias que não conseguem ter o mínimo de rendimento para poderem fazer uma refeição diária que seja.


Todos sabemos a dimensão da catástrofe social que foram os anos do programa de ajustamento da troika, incluindo a política de ir para além da troika (assumida publicamente por Passos Coelho em diversas ocasiões, em 2011, e das quais a comunicação social deu boa nota). Esse programa ficou concluído em 2014, e em 2015 um novo Governo, com o objetivo claro de devolver direitos e rendimentos aos portugueses, entrou em funções, e cujos resultados podem ser considerados como um sucesso (fim da sobretaxa no IRS, aumento do emprego, redução do défice e da dívida, etc.).

Também todos estamos recordados das notícias que davam conta das necessidades de alimentação à população mais carenciada com o surgimento em todo o país de cantinas sociais, das refeições escolares em período de férias e outras iniciativas que iriam surgindo, para nossa vergonha enquanto comunidade que não é capaz de apoiar socialmente de forma conveniente sem a caridade do apoio alimentar.

Nos últimos anos, e à medida que as condições socioeconómicas do país foram melhorando, com o aumento sucessivo do salário mínimo e o país a viver, até há bem pouco tempo, em quase pleno emprego, esperava-se que, mesmo em condições extraordinárias como o tempo em que vivemos, as coisas não estivessem praticamente iguais.

Tendo em conta o que se passa, não deixo de ficar assoberbado com o pouco caminho que fizemos em matéria social quanto aos mais desprotegidos.

Em menos de uma semana, e após o encerramento das escolas decretado pelo Governo, as notícias começaram a correr com a abertura das cantinas escolares, mesmo com as escolas encerradas, porque elas proporcionam as únicas, repito, únicas refeições de milhares de crianças e jovens durante o dia. Isto para não falar dos massivos (financeiramente) programas de apoio alimentar espalhados por todo o país a famílias, idosos e populações de risco, e até mesmo a pessoas que se encontram ou encontravam até há dias a trabalhar e a receber os seus salários.

Numa questão de dias e semanas, temos hoje milhares de pessoas que subsistem apenas destes apoios. Pergunto-me o que temos feito ao longo dos últimos anos (Estado central e autarquias) que faz com que, não obstante o emprego e as melhorias de condições de vida, existam tantos milhares de portugueses que não saíram deste círculo vicioso e viciado.

Dá a sensação que as políticas públicas do setor e os apoios sociais do Estado se resumem à criação de um gigantesco banco alimentar que se ativa em maior ou menor dimensão em função dos tempos de necessidade.

Não estou com a isto a dizer que está errado o que se está a fazer neste momento em providenciar alimentação a quem dela necessita para sobreviver. Longe, muito longe disso, mas este tempo de crise de saúde pública e económica, que se ergue à nossa frente como um Evereste, terá também de servir para refletirmos sobre a forma como pensamos as políticas públicas e os apoios sociais aos mais desfavorecidos. Um país da União Europeia, da OCDE e da zona euro não pode ter um sistema social tão frágil que não dê às famílias as condições para que, em tempos de normalidade, possam sair da necessidade de ter de andar à espera da caridade. A comparação com o que se passa nos Estados Unidos, onde se veem longas filas de carros para as pessoas receberem apoio alimentar, não colhe, pois o Estado social, em terras do Tio Sam, é coisa quase inexistente.