Conversations with the beat. “Da Chick é o que eu quiser”

Conversations with the beat. “Da Chick é o que eu quiser”


No novo álbum, Da Chick, que aqui se estreia na produção, procurou inspirar todos os seus ouvintes a saírem do sofá e a criarem algo novo.  


A Da Chick não é o alter ego de Teresa de Sousa, é a sua identidade embriagada em Red Bull e a assinatura que marca o seu projeto musical. Amanhã é editado o segundo álbum da cantora, Conversation with the Beat, no qual se estreou na produção.

Onde gravou Conversations With the Beat?

Produzi quase tudo em casa, foi uma experiência nova. Para além da minha voz, nunca tinha gravado na minha casa. A única coisa que não me estava a sentir confortável [a gravar] foram as congas, gravadas no estúdio da Discotexas com a ajuda do Moulinex. Parece ridículo, mas no outro dia convidaram-me para produzir. Disse que não o sabia fazer e responderam-me: “Mas acabaste de produzir um álbum sozinha”. Não sei produzir ao request, é uma coisa que vai saindo e eu vou gravando.

Este álbum transmite esse lado mais intimo e de gravação caseira.

É um álbum pessoal por ter produzido sozinha. Queria que fosse lançado o mais parecido com aquilo que fiz. Tive ajuda a misturar e a masterizar, mas queria mantê-lo o máximo possível meu. O álbum chama-se Conversations With the Beat, é uma cena muito crua, o beat é uma cena que vem do hip-hop mais lo-fi, mais ligado aos anos 1990, onde o que interessava era a vibe. Queria manter essa identidade. Sempre estive envolvida na produção da minha música, nunca foi: “está aqui um beat, agora canta”. Ter sido eu a tocar e ter estado sozinha no processo, sinto que … não é uma questão de ser mais pessoal que os outros, é mais especial.

Como se sente antes de lançar o álbum?

Este álbum está feito há algum tempo e, agora, sinto que havia coisas que faria diferente. Quando comecei a gravar mal sabia tocar guitarra. Sinto que agora podia ter dado mais, mas estou muito satisfeita com o resultado final. Estou muito orgulhosa e estarei daqui a 20 quando pensar what the hell, o que é que eu estava a fazer.

Como está a ser processo de aprender a tocar guitarra?

Ainda estou a aprender e vai ser uma aprendizagem até ao final da vida. Há uns anos comprei uma guitarra, mas achei tão difícil e frustrante que acabei por desistir. Em 2018, ganhei uma vontade muito grande de voltar [a tocar guitarra]. Estive no South by Southwest, no Texas, vi muitas bandas de rock, especialmente girl bands e deu-me uma motivação extra. Sinto-me mais madura e adulta, consigo perceber que não é fácil e tenho que insistir. Estou numa fase muito persistente da minha vida, tento tocar guitarra todos os dias, comecei a ter aulas, tenho evoluído e está a ajudar-me a compor e a ver a música de outra forma. Já comecei músicas só com guitarra, se não tivesse aprendido jamais faria estas coisas novas. É importante o artista meter-se em territórios virgens. Agora estou na guitarra, mas certamente irei para outro instrumento mais tarde. Mas tem sido uma batalha intensa.

Sente que teria sido mais fácil aprender a tocar guitarra se tivesse começado mais nova?

Podia ser mais intuitivo, mas é interessante: quando tinha 15 anos gostava de ouvir música, mas estava longe de saber que ia ser a minha vida. Se calhar se tivesse aprendido na altura ia ser diferente, tens menos noções. Agora, pode ser frustrante: sabes o que queres fazer, tens as noções, mas falta a técnica [risos]. Mas, agora, a aprendizagem também pode ser mais rápida, estou constantemente rodeada de músicos e música. A música já existe dentro de mim, portanto, só falta a técnica e a teoria.

O que é que gostava de aprender a tocar a seguir?

Eu sempre tive uma crush pela bateria, mas não sei se vai ser isso. Gosto muito de instrumentos de sopro e de baixo.

Vai tocar guitarra nos seus concertos?

Sim, tenho ensaiado bué, sei que em algumas ocasiões vai dar merda e quero perceber como é que me vou desenrascar, mas estou com músicos que me vão ajudar a contornar as dificuldades. Mas gosto muito deles [dos erros], há bandas que me desiludem porque é tudo tão ensaiado e embelezado que tira a piada. Gosto dos artistas que erram, que assumem isso, que brincam com a situação e que se calhar até criam qualquer coisa com esse momento. Estou curiosa porque costumo estar à vontade em palco, mas no outro dia estava a tocar guitarra para uns amigos e estava muito envergonhada. Estou a tentar perceber se pela primeira vez vou ter vergonha em palco.

Sentes que a Da Chick que sobe ao palco é diferente da Teresa de Sousa do dia-a-dia?

Um bocadinho mais extrovertida, considero-me até bastante tímida. A Da Chick é um bocado mais wassup bitches e se eu fosse assim na vida real não tinha amigos [risos]. Tirando isso, não é um alter ego, é só muito Red Bull.

Esteve a falar das experiência no South by Southwest. Como é recebida na América?

Sinto que há uma maior surpresa. Aqui, quando vais dar um concerto, as pessoas já conhecem o teu trabalho, mas nos Estados Unidos o pessoal fica à toa por ser portuguesa. Eles identificam-se com o meu som e acham estranho quando digo que não temos uma cultura de funk, é um bocado confuso para eles. Gosto de dar concertos em qualquer lado, simplesmente é novidade para mim, é novidade para o público e acaba por existir uma energia diferente, mas não é mais ou menos boa. Também é fixe atuares cá e haver pessoas a cantar as tuas músicas.

De onde surgiu este interesse?

Não sei se vou dizer um disparate, mas em Portugal nunca houve uma cultura em torno deste som. Não sei explicar como é que este interesse surgiu na minha vida de uma forma tão natural. Foi de ver muitos filmes e televisão sem dúvida, mas não consigo perceber como é que me inspiro tanto nesta cultura americana ao ponto da minha música ser quase catalogada como isso. É um bocado estranho para mim também.

Houve algum filme em específico que a tenha inspirado?

Isto pode parecer muito clichê, mas sou uma grande fã do Quentin Tarantino. O Death Proof é o meu filme preferido dele. Já o último [Era Uma Vez em… Hollywood] tive que o rever recentemente porque saí do cinema mesmo triste… Não sei, não adorei.

Gostava que a sua música entrasse na banda sonora de um filme?

Adorava, mas mais do que estar numa banda sonora adorava atuar num filme de ação e de artes marciais. Pratico karaté e dei umas aulas a uns miúdos.

A sua música não segue tendências, em vez de procurar inspirações atuais, vai beber influências ao passado.

Não é propositado, estou a fazer algo de que gosto e só vai resultar para mim enquanto fizer algo de que goste. Cada um tem a sua forma de ver a música. Para mim é muito pessoal e não faz sentido estar a fazer música para agradar aos outros, sinto-me contente de conseguir agradar algumas pessoas. Tem piada porque o disco é algo intemporal, ouves e vais acabar por gostar. Mas neste álbum ficaram um bocado de parte. Continua a ser música eletrónica, mas é muito mais soul, hip-hop…

Pode falar um pouco sobre o título do seu álbum, Conversation with the Beat?

A minha ideia inicial era lançar um álbum instrumental, mas depois começaram-me a sair ideias e acabei por gravá-las. O Conversation with the Beat é uma conversa calma, relaxada e com muito espaço. Trouxe pensamentos que tinha na cabeça quando estou sozinha. Na watch me go, digo “Oh can i make it longer?”, era literalmente o que estava a pensar. “Vamos lá fazer isto maior, estou a produzir isto sozinha, posso fazê-lo”. Este álbum é uma viagem nos meus pensamentos. Acho que é um álbum de incentivo. Sei que, ao longo desta jornada, tenho motivado algumas pessoas a não terem medo de fazer aquilo que acham que deve ser feito. A razão pela qual quis deixar o álbum com esta sonoridade crua foi exatamente por isso, fui eu que o fiz, não tem que ser melhorado, vai ser uma aprendizagem. O próximo álbum que produzir vai estar melhor e se calhar até vou ser eu a misturar e a masterizar. Era importante perceber que não era impossível e agora quero motivar pessoas com isso.

Sente que o improviso foi fundamental neste álbum?

Na Do your thing, por exemplo, estava… trabalhar em casa é fixe, mas dá alguma molenga… deitada na cama às 15h, e só conseguia pensar “o que é que estou a fazer da minha vida?” Levantei-me decidida a ir para o estúdio fazer alguma coisa e comecei a cantar: “you gotta do your thing, you gotta do your own thing”. Fui até ao estúdio a cantar, gravei e depois meti um beat. Algumas ideias surgiram assim do momento, houve coisas que fui apontando num caderno e desenvolvi mais tarde, mas sim viveu muito do improviso, daí a razão para a qual tive que gravar tudo. Não sabia o que estava a fazer [risos]. Agora tive que reaprender tudo, precisei de perguntar aos meus músicos o que estava a fazer.

Tem uma música onde diz: “I don’t know what the fuck i’m doing, but i’m doing something”. Já sabe melhor o que está a fazer?

Mais importante do que saber o que estou a fazer, é fazer. Acho que o importante a reter é isso. Vais-te descobrindo. Acho importante meteres-te em situações de desconforto e tentares sobreviver. Foi o exemplo da minha guitarra, gastei dinheiro e tive que me orientar, eu funciono assim. Compro uma viagem para daqui a quatro meses e quando chega a altura tenho que ir. É bom arriscar porque alguma coisa vai sair daí. Houve um momento em que considerei criar um novo nome e um novo projeto, mas ao mesmo tempo… Da Chick é o que eu quiser. Qual é a necessidade de sermos a mesma pessoa que éramos quando tínhamos 18 anos? É bom haver mudança, é bom se as pessoas acompanharem, se não whatever. Não estamos a fazer isto para as pessoas, mas sim para nós mesmos.