Pasmo. Assisto a mais um aumento. O banco público tem um dos preçários de comissões e despesas mais elevado do mercado nacional. Posiciona-se agora em lugar cimeiro, entre os 4 maiores bancos privados, na corrida à cobrança desequilibrada e injustificada de comissões. Presentemente, é um luxo ter conta no banco público.
Sentenciou, com a última actualização do preçário, a manutenção da minha conta, aberta aos 2 anos de idade. Qualquer que tenha sido o pacto de fidelização que fiz, inconsciente e emocional, está agora posto à prova. Cresci com a Caixa. Estudei com a Caixa. Conduzi com a Caixa. Casei-me com a Caixa. Residi com a Caixa. Familiarizei os meus filhos com a Caixa. Vivo há 40 anos com o banco público. A Caixa. Com certeza. E não me arrependo. Fizemos muito juntos.
Mas passámos de uma relação de confiança feita de certezas, para a incerteza de quando ocorrerá a próxima campanha de comunicação a actualizar novamente o preçário com o objetivo de desapossar-me de valores da minha conta. É inaceitável a expropriação que tem vindo a impor. Incompreensível e digno de escárnio, algumas das comissões que hoje subtrai mensalmente das contas à ordem dos seus clientes, sem que tenha prestado qualquer serviço. Não se coaduna com a missão da Caixa Geral de Depósitos (CGD), que com o galopante aumento do valor das comissões rompeu com a confiança e legitima expetativa depositadas pelos clientes. Na maioria, clientes com uma relação de longo prazo.
Não se pretende que o banco público apresente resultados negativos. A CGD deve manter-se competitiva, no mercado financeiro dinâmico e concorrencial, mas não pode continuar a descurar o essencial da sua missão: a melhoria do bem-estar das famílias; o desenvolvimento do sector empresarial; o enfoque na captação da poupança; modelo de governo societário eficiente; e no respeito dos mais elevados padrões éticos. A criação de valor para a sociedade portuguesa. A Caixa. Com certeza. Desmarcou-se. Desalinhou-se. Despegou-se. Descomprometeu-se da própria missão. E comprometeu os seus valores e linhas de orientação. A sua visão, recentemente revelada, não tem qualquer correlação com a missão e valores definidos, que hoje estão irrefutavelmente comprometidos.
Desde 2017 que a CGD tem vindo a engrossar a fatia dos lucros por conta de uma estratégia que assenta no aumento reiterado das comissões. Há uma tendência para aumentar semestralmente o preçário de comissões e despesas. Adoptou definitivamente a política de cobrança imprimida pelos bancos privados. O número de clientes abrangidos é revelador da consolidação desta estratégia. Em 2018, tinha 4,5 milhões de clientes, dos quais 3,5 milhões estavam isentos do pagamento de comissões. Atualmente, reflectida esta última atualização de preços, somente 1 milhão de clientes – jovens com menos de 26 anos e reformados com rendimentos muitos baixos (a maioria dos clientes reformados/aposentados perderam a isenção) – estão isentos do pagamento. A taxa de isenção de pagamento de comissões evoluiu, a favor do banco público, de 78% (2018) para 22% (2020).
Pela recente divulgação do preçário de comissões e despesas, com valores a cobrar acima da média nacional, parece não ter cedido à tentação de concertar preços com os grandes bancos privados. A comissão cobrada pelas contas de serviços mínimos bancários (entre outras comissões inexplicáveis), a cêntimos de atingir o valor máximo permitido, prejudica irreparavelmente a sua missão. A Caixa, como referência no setor financeiro português, deve ter o discernimento de diferenciar entre um serviço bancário efetivamente prestado ao cliente, que naturalmente deve ser cobrado por um valor proporcional, e quando este não existe. A manutenção de uma conta bancária, o processamento de uma prestação mensal de crédito habitação / pessoal e a emissão do distrate no final do contrato, são alguns dos exemplos de comissões que continuam a ser cobradas, sem justificação, pela banca. Nesta linha de raciocínio, não deviam estar a ser cobrados, também, os débitos diretos? Impera a dualidade de critérios.
Hoje, a banca tem uma fonte de receita segura, subtrai religiosamente as comissões, que fixa a bel-prazer, das contas dos clientes. A estratégia abusiva de atualização repetida e ilimitada do preçário ultrapassa o limite da razoabilidade. Segundo o Banco de Portugal, todos os bancos, sem excepção, a operar no nosso país fizeram, no primeiro semestre de 2019, um total (impressionante!) de 788 alterações aos seus preçários de comissões e despesas. Em média, cada banco alterou (aumentou) os seus preços 5 vezes só na primeira metade do ano.
Invisto sem risco. Os bancos tradicionais – o público e os privados – irão manter a política de expropriação (dissimulada em comissões) acentuada dos seus clientes. Ano após ano, ou mesmo semestralmente (ou quando lhes for favorável), o valor das comissões será agravado. Os clientes pagam. A banca garante o aumento anual dos lucros. Os accionistas recebem os dividendos.
Invisto novamente, desta vez com risco moderado, que iremos passar a pagar, dentro de 5 anos, pelas operações de levantamentos em numerário, com cartão de débito, nas caixas ATM. A banca nacional aguarda impacientemente por esta oportunidade.
Estes investimentos, por minha conta e risco, podem sair gorados. Dependem, determinantemente, do resultado da reunião plenária agendada para o próximo dia 27. Sem regulamentação específica a proteger o consumidor, a balança continuará a pender, injustamente, a favor da banca.
Ainda há uma réstia de esperança de vir a perder tais investimentos. Eu perco, mas todos ganhamos.
Bruno Lourenço Cardoso
Licenciado em Gestão de Recursos Humanos