“Marcelo vai obedecer à Igreja” na questão da eutanásia, diz histórico socialista

“Marcelo vai obedecer à Igreja” na questão da eutanásia, diz histórico socialista


Recolha ganhou força nas missas do último fim de semana. Responsável diz que primeira contagem será feita a 4 de março.


O movimento para a realização de um referendo sobre a eutanásia já recolheu metade das 60 mil assinaturas necessárias para formalizar o pedido junto da Assembleia da República. O balanço foi feito ao i pelo porta-voz da campanha lançada há pouco mais de uma semana pela Federação Portuguesa Pela Vida e que quer travar a despenalização da morte assistida no Parlamento.

A petição online contava esta segunda-feira com 17 mil assinaturas mas já houve pelo menos 13 mil pessoas que assinaram a iniciativa presencialmente, disse José Maria Seabra Duque, admitindo que poderão ser mais uma vez que há diferentes pontos do país sobre os quais ainda não têm dados.

A recolha ganhou gás no último fim de semana, depois da Conferência Episcopal Portuguesa ter assumido o apoio ao referendo, com várias paróquias a iniciarem a recolha de assinaturas antes e depois das missas. E muitos padres a aproveitarem as homilias para apelar à mobilização. Seabra Duque adianta que a primeira contagem global será feita a 4 de março e que irão então decidir quando será feita a entrega da iniciativa no Parlamento. “Temos a perfeita consciência de que as iniciativas vão ser aprovadas esta semana na generalidade, isto apesar de, tal como aconteceu em 2018, todos os pareceres pedidos pelos deputados serem negativos. A única coisa que mudou é haver uma maioria que permite a aprovação”, afirma o porta-voz. “Temos pouca esperança de demover os deputados. Esperamos que quando entregarmos as assinaturas percebam que o povo quer ser ouvido. Se depois de entregarmos uma iniciativa popular, que a este ritmo poderá superar as 60 mil assinaturas, continuarem a ignorar este apelo, será preocupante”.

O debate está marcado para quinta-feira a partir das 15 horas. Os deputados vão discutir cinco projetos de lei (PS, BE, PAN, PEV e Iniciativa Liberal) a favor da despenalização da morte assistida. Ao contrário do que aconteceu há quase dois anos, em que a eutanásia chumbou por cinco votos, os votos da esquerda e do PAN serão suficientes para que estas iniciativas tenham sucesso.

Catarina Martins, do Bloco de Esquerda, anunciou ontem que os bloquistas votarão a favor de todos os projetos de lei. “Portugal será um país melhor, que respeita mais as pessoas, se conseguirmos dar esse passo para permitir o fim de vida digno de cada um e de cada uma”, disse.

Na prática, a esmagadora maioria dos deputados do PS, o Bloco de Esquerda, o PAN, o Iniciativa Liberal, o Livre e alguns deputados do PSD deverão apoiar a despenalização da morte assistida. CDS, PCP e uma parte significativa do grupo parlamentar do PSD votará contra.

O referendo também não deverá passar no Parlamento já que os socialistas e os partidos à sua esquerda são contra. Socialistas como Manuel Alegre ou António Campos estão contra uma consulta popular. “O referendo, nestas circunstâncias, é uma forma de desvalorizar a democracia representativa e uma forma de desvalorizar os deputados que representam o povo”, disse ao semanário SOL o histórico do PS.

O socialista António Campos, em declarações ao i, defende que o referendo daria origem “ao populismo e à demagogia”. Campos é favorável à despenalização da eutanásia, mas não tem dúvidas de que o Presidente da República vai fazer tudo para travar esta alteração à lei. “Marcelo vai obedecer à Igreja”, diz o ex-dirigente socialista.

Marcelo e o TC O Presidente da República recebeu ontem à noite antigos bastonários e o atual bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, bem como o grupo de líderes religiosos de várias confissões. Até agora todas as audiências foram apenas com opositores da despenalização, mas Marcelo garante que recebe “quem pede” para ser ouvido. O Bastonário da Ordem dos Médicos defendeu recentemente que “algumas pessoas ainda não perceberam que eutanásia é matar, o que é diferente de deixar morrer e não se prolongar a vida de forma artificial e desproporcional, que é algo que o código deontológico médico proíbe”.

Uma das hipóteses que está ao alcance do Presidente da República é recorrer ao Tribunal Constitucional. Vários constitucionalistas garantem que a lei pode ser chumbada. O constitucionalista Tiago Duarte defendeu, em declarações ao semanário SOL, que “legalizar a eutanásia viola a constituição”. Jorge Miranda, conhecido como pai da constituição, também defendeu, em declarações ao Expresso, que a violação da Constituição é “flagrante”. Já Vital Moreira defendeu que a a Constituição não proíbe a eutanásia. “Proponho que retiremos a Constituição do debate sobre a eutanásia. A Constituição não tem de ter resposta para todos os problemas políticos ou sociais, sobretudo quanto eles implicam juízos religiosos ou morais”, escreveu, no blogue Causa Nossa, em 2016, Vital Moreira.

PARECER NEGATIVO? O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, que em 2018 deu parecer negativo às propostas discutidas no Parlamento, aprovou esta segunda-feira em reunião plenária os pareceres relativos aos novos projetos-lei, que deverão ser conhecidos esta terça-feira. Dos pareceres solicitados pela AR estão também ainda em falta as análises das ordens dos advogados e psicólogos.

“Portugal será um país melhor, que respeita mais as pessoas, se conseguirmos dar esse passo para permitir o fim de vida digno de cada um e de cada uma” Catarina Martins coordenadora do bloco de esquerda “O referendo, nestas circunstâncias, é uma forma de desvalorizar a democracia representativa e uma forma de desvalorizar os deputados que representam o povo” Manuel Alegre Ex-deputado do ps ao semanário sol “Sou contra o referendo. Sou a favor da democracia representativa” António Campos ex-dirigente do ps em declarações ao i “Depois de percorrido o caminho parlamentar, faz sentido dar a palavra ao Povo num assunto tão grave e sério” Raul de Almeida ex-deputado do CDS, no facebook, “O referendo é não só uma obrigação, mas também a única forma digna que os dois partidos têm de resolver o assunto” Manuel Monteiro ex-presidente do cds ao semanário sol“Portugal será um país melhor, que respeita mais as pessoas, se conseguirmos dar esse passo para permitir o fim de vida digno de cada um e de cada uma”