Coronavírus. Portugueses na China à espera de melhores dias

Coronavírus. Portugueses na China à espera de melhores dias


Dois treinadores portugueses contam como vivem o dia-a-dia em cidades diferentes da China. Utilização de máscara e medição da febre são algumas das ações de precaução.


O surto do coronavírus tem sido uma dor de cabeça para muitas pessoas na China e alguns portugueses, que optam por não regressar a Portugal, pelo menos para já, vivem diariamente sob regras rigorosas e são analisados minuciosamente para que não acabem entre os infetados.

Tiago José dos Reis, de 41 anos, é um desses portugueses. Treinador de futebol, vive atualmente em Dalian, no leste da China, perto da fronteira com a Coreia, onde decidiu ficar “porque inicialmente a cidade não tinha uma situação tão complicada como no epicentro do vírus, em Wuhan, onde estavam os portugueses repatriados”.

Técnico no clube Inter Dalian, Tiago Reis é residente nessa cidade há quatro anos, mas contou ao i que desde que se começou a falar do coronavírus nada acontece nas ruas e que o melhor é mesmo “ficar em casa”, seguindo as indicações de segurança. “A cidade está praticamente parada. Em Dalian, neste momento, está tudo a ser extremamente controlado, desde a entrada na cidade, transportes públicos, supermercados, etc.”, começou por dizer o português, que aguarda pelo fim da epidemia sem ser necessário regressar a Portugal.

Há cerca de duas semanas que é obrigatório usar máscara de segurança e o álcool, neste caso, tem vindo a tornar-se o melhor amigo do Homem, uma vez que é uma das principais formas de todos se desinfetarem. “Os meus dias são passados em casa. Quando vou ao supermercado levo máscara e quando chego a casa tenho de desinfetar tudo com álcool. Saio de dois em dois dias para fazer umas compras, vou trabalhando e estudando em casa, não posso fazer rigorosamente nada”, explicou o treinador português, que é visto por médicos regularmente. “Controlam a febre a todas as pessoas”, sublinhou Tiago Reis. “Estão encerrados todos os restaurantes, atrações turísticas, escolas e tudo o que sejam atividades em grupo são proibidas”, referiu ainda, adiantando que “o regresso às aulas foi adiado para o início do mês de março, até ver…”.

Apesar de em Portugal todos os seis casos suspeitos de coronavírus não terem sido confirmados, Tiago Reis acredita que, na zona onde reside, os casos podem vir a aumentar. “O prolongamento das férias terminou segunda-feira, para muitas das empresas e departamentos do Estado, como tal acredito que os casos possam aumentar consideravelmente nestes próximos dias”, revelou o treinador, pai de dois flhos, com quem já viveu durante um ano e meio na China. Atualmente, não tem grande ocupação, uma vez que nem o clube no qual é técnico pode frequentar. “No meu clube estamos parados à espera de iniciar, vamos fazendo umas coisas online”, revelou.

Esperança na China Não é em todas as cidades chinesas que o coronavírus tem vindo a ser cada vez mais alarmante. Ao i, André Vitorino, outro português a viver na China, mas neste caso em Guangzhou – próximo de Macau e Hong Kong –, adiantou que “a situação está a melhorar”, apesar de contar com a presença de médicos duas vezes por dia em sua casa para lhe medirem a febre. “As informações que temos visto em Portugal não têm sido tão verídicas quanto aquilo que vivemos aqui. Os infetados continuam a subir, mas neste momento a média é inferior. Já há zonas da nossa cidade sem qualquer caso por dia, o que é muito bom. Os novos casos estão a diminuir”, sublinhou André Vitorino, técnico numa academia de futebol para crianças, em Guangzhou, onde vive com a mulher, professora de inglês. “Decidimos ficar pela cidade a aguardar para ver o que se passava. Tomámos essa decisão também porque sentimos alguma segurança do Governo chinês, que tem feito tudo para controlar este vírus”, disse, explicando que, ao contrário do que acontece em muitas cidades da China, “os supermercados estão a funcionar a todo o gás”. “A cidade também já se transformou. Já parece a mesma. As pessoas que vivem aqui já voltaram à cidade e algumas estão de quarentena para depois voltarem ao trabalho. Algumas pessoas já começaram a trabalhar na segunda-feira, mas nós, como temos atividades que são derivadas da escola, dependemos sempre da escola. Eles vão tentar pôr o país em movimento e depois, sim, arrancar nas escolas. É um método que usam para salvaguardar as crianças”, concluiu o treinador português, que não dramatiza e avança que tanto ele como a mulher deverão regressar ao trabalho em inícios de março. “O que se fala aqui é iniciarmos o nosso trabalho nas escolas a 3 de março, mas até lá algo pode mudar e nós estamos a acompanhar a situação”, rematou.

Ano Novo chinês Qualquer altura do ano é má para enfrentar uma epidemia como o coronavírus, mas para os chineses chegou em muito má altura. Celebrava-se o Ano Novo Chinês, que ocorre oficialmente a 25 de janeiro, e há milhões de pessoas que viajam na China durante este período para as comemorações.

Existe um feriado lunar celebrado este ano a 24 de janeiro e nessa data há comboios, autocarros e aviões com lotação esgotada, muitas vezes para se matar saudades das famílias. “Infelizmente isto aconteceu numa altura especial para os chineses, que é o Ano Novo Chinês, uma espécie de Natal e Ano Novo em Portugal, mas vai passar. Ainda não se conhece bem o comportamento deste vírus, por isso é que há algum alarme a nível mundial, em particular na China”, justificou André Vitorino, que acredita que o principal “medo” está no período de incubação do vírus. “O grande perigo é o período de incubação, daquelas pessoas em que os sintomas ainda não se manifestaram mas o vírus já está presente no organismo. É esse o medo a nível mundial”, diz.

O que é certo é que o número de mortos já ultrapassa os mil e há pelo menos 42 mil casos confirmados só na China. Esta semana, houve mais dois casos suspeitos de coronavírus em Portugal, um dos quais de uma chinesa e o outro de um brasileiro, ambos residentes em Portugal, mas os testes realizados deram negativo. Esta terça-feira a OMS anunciou que decidiu chamar COVID-19 à doença causada pelo novo vírus, acrónimo de coronavírus. Não quis que ficasse associada a nenhuma geografia e a nenhum grupo de pessoas, para evitar o estigma.