Irlanda. Vitória “histórica” do Sinn Fein pode pôr fim ao bipartidarismo

Irlanda. Vitória “histórica” do Sinn Fein pode pôr fim ao bipartidarismo


Nacionalistas destronam 90 anos de bipartidarismo na Irlanda. Preveem–se negociações longas e difíceis para a formação de um Governo.


As eleições do último domingo na Irlanda podem ter trazido o fim do legado de 90 anos de bipartidarismo, em que o Fianna Fáil e o Fine Gael, ambos de centro-direita, foram partilhando o trono da política irlandesa entre si. Ainda com alguns lugares por distribuir no Dáil Éireann (câmara baixa irlandesa), o Sinn Fein declarou vitória e vai tentar formar Governo. 

O partido nacionalista, antigo braço político do Exército Republicano Irlandês (IRA na sigla inglesa), obteve 24% dos votos de primeira preferência nas urnas – o número de lugares garantidos até agora pelo partido de centro-esquerda (37) já constitui um recorde: o Dáil Éireann é composto por 160 deputados. Seguem-se o Fianna Fáil (22%) e o Fine Gael (21%), do atual taoiseach (primeiro-ministro) Leo Varadkar. 

Dado o sistema eleitoral na Irlanda ser de voto por ordem preferencial, o Fine Gael poderá alcançar um maior número de parlamentares do que o Fianna Fáil, apesar de o partido de Governo ter menos votos de “primeira preferência”.

A vitória do Sinn Fein está a ser descrita pelos seus apoiantes como um momento “histórico” que pode provocar um “sismo” no sistema político e partidário do país. “Isto não é uma coisa transitória – é apenas o começo”, celebrou a líder da formação nacionalista, Mary Lou McDonald, em declarações aos repórteres no domingo. 

A vitória do Sinn Fein é surpreendente não só por poder significar o destronar de nove décadas de domínio dos dois partidos de centro-direita como por ser alcançada numa altura em que se prevê que a Irlanda tenha um dos maiores crescimentos económicos da União Europeia nos próximos anos.

Mas, segundo várias análises, os nacionalistas foram capazes de capitalizar o descontentamento dos irlandeses com os serviços públicos e pela ausência de políticas de distribuição de riqueza. Entre várias coisas, o descontentamento reside na falta de habitação social; preço das rendas para habitação a valores galopantes e consequente crescimento do número de pessoas sem-abrigo; e serviços públicos de saúde disfuncionais. 

Embora prefira formar Governo sem o Fianna Fáil e o Fine Gael, que durante a campanha fizeram de tudo para marginalizar os nacionalistas, McDonald disse esta segunda-feira à estação pública irlandesa RTE que queria sentar-se à mesa das negociações com os líderes dos outros dois partidos mais votados porque “é isso que os adultos fazem”. 

As negociações para formação de um Governo podem demorar meses e um cenário de nova ida às urnas não pode ser descartado. Desde a década de 1980 que a Irlanda é governada por coligações ou por um Executivo minoritário. Após terem saído os resultaods, no domingo, o líder do Fianna Fáil suavizou a sua posição perante os nacionalistas. Micheál Martin, dando uma volta de 180 graus na sua atitude durante a campanha eleitoral, deu sinais de abertura para negociar com o Sinn Fein. 

Já o ainda primeiro-ministro e líder do Fine Gael, Varadkar, pôs de lado uma coligação com os nacionalistas, citando a sua ligação com o IRA e as suas políticas de esquerda como um obstáculo e defendendo uma aliança centrista com o Fianna Fáil.