Uma desconfiança profunda tomou conta dos londrinos. “Que silêncio é este?”, perguntavam alguns, estranhando que os alemães tivessem, de súbito, interrompido uma série de bombardeamentos que provocaram feridas abertas na cidade. Os estrategas não tinham dúvidas, por seu lado: era a bonança que antecedia a tempestade. Hitler, o canalha nazi, e o seu amigo barrigudo, Hermann Göring, o chefe da Luftwaffe, economizavam recursos para um ataque em larga escala. Era preciso estar mais atento do que nunca. Os caças britânicos erguiam-se, vigilantes, nos céus e patrulhavam a Mancha até à costa de França em busca de um sinal que permitisse perceber o que estaria para vir. A Royal Air Force preparava-se, por seu lado, para desferir o seu golpe. Havia que descobrir os lugares onde a ofensiva crescia, venenosa, como se congeminada no ovo da serpente. E depois destruir!
“A orientação de um ataque direto às nossas ilhas parece impor-se aos comandos alemães”, afirmava o major Oliver Stewart. “Se adotarem esta alternativa, é possível prever alguma coisa em relação aos métodos que usarão. Um ataque geral afigura-se essencial na esperança de fechar por completo as defesas britânicas sobre a área o mais extensa possível”. Não, não iriam apanhar os ingleses distraídos.
Inquietação O Ministério da Aeronáutica do Governo da Grã-Bretanha emitiu um comunicado: “Durante a noite passada foram lançadas bombas sobre a região da Cornualha, mas os prejuízos materiais e pessoais foram muito poucos. Além desta, não se registou qualquer outra atividade da arma aérea inimiga”. Lá está: o silêncio. O terrível silêncio a que os londrinos não estavam já habituados. O silêncio que prometia algo ainda mais terrível do que os bombardeamentos continuados. Que vinha aí para estilhaçar esse silêncio? Ah! Os ingleses sabiam que a violência é como uma droga. E agora parecia que lhes faltava a dose habitual.
Seis noites sem que os Messerschmitts sobrevoassem as margens do Tamisa. Não mais guerra-relâmpago, a Blitzkrieg. Nuvens negras acumulavam-se no céu, prometendo tempestades. Talvez fossem os trovões as próximas explosões a abalar Londres.
Ordem para que as barcaças saíssem para o mar. Em frente a cada porto suscetível de ser vítima de um ataque nazi esquadrinhavam-se as águas, espiolhava-se o céu. Atenção redobrada, afiada, os nervos esticados como cordas de violino, um pressentimento de algo terrível que se aproxima, avalanche destruidora de gente alimentada pelo ódio e pela ânsia do sangue. Não há bombas alemãs caindo sobre o Embankment, sobre Battersea ou Covent Garden. Os alemães estão singularmente calados. É preciso vigiar a noite.