PSD: as dores do parto


Instalou-se uma cultura de não respeito por quem foi eleito e não reconhecimento da sua legitimidade. Ao mínimo tremor sucedem-se os candidatos a candidatos e organizam-se assaltos ao poder.


Quantas vezes terá Rui Rio de ganhar as eleições para presidente do PSD para ser reconhecida a sua legitimidade de exercer o mandato sem estar distraído com as eminentes convulsões internas que teimam em não acalmar?

Ganhou as eleições diretas com uma diferença de 2300 votos para o seu concorrente mais direto e principal responsável pela agitação interna a que se tem assistido nos últimos dois anos no PSD. Foram 49,44% de votantes que reiteraram a confiança que tinham no atual líder do partido, apesar dos resultados fracos que se registaram nas eleições legislativas. Talvez porque estes militantes reconheçam que a Rui Rio não foi dada uma verdadeira oportunidade de se concentrar numa estratégia política de desmascarar o Partido Socialista e as suas âncoras, a união de interesses a que Paulo Portas apelidou de “geringonça”. Recorde-se que o pior resultado do PSD registou-se nas autárquicas de 2017; as eleições legislativas foram a confirmação de uma tendência que já tinha tido o seu início.

Dos 41 mil militantes inscritos para votar, exerceram o seu direito ao voto 31 206 militantes, com a seguinte distribuição: Miguel Pinto Luz teve 2878 votos, concentrados em Lisboa (já foi presidente da Distrital de Lisboa) e em Setúbal (tinha em Bruno Vitorino um dos seus braços-direitos, que trabalhou bastante para este resultado); Luís Montenegro foi a escolha de 12 767 militantes, insatisfeitos com a liderança e escolhas do líder do PSD e que viram no antigo líder parlamentar de Passos Coelho uma oportunidade de mudança; e 15 301 votaram em Rui Rio. Faltaram uns escassos 345 votos para que o “homem do Norte” passasse à primeira volta: os tais 0,56%.

A segunda volta, inédita neste partido, irá decorrer uma semana depois da primeira, limitando o tempo para grandes ações de campanha que possam captar o voto dos que se abstiveram, dos que votaram em Pinto Luz ou até mesmo dos que, tendo capacidade de voto, não foram às urnas. O debate televisivo já foi posto de parte e, se o resultado fosse semelhante ao do primeiro, então, para não sermos sujeitos a mais achincalhamento da classe política, foi a melhor opção.

A pluralidade das candidaturas é uma marca distinta do PSD, sinal de discussão de ideias, de vitalidade interna, ao contrário dos que vaticinam o definhamento do maior partido da oposição ao elaborarem análises comparativas com o que se passa com outros partidos políticos com dimensão idêntica em países como Espanha, Grécia ou Itália. Já na altura dos congressos eletivos, em que se votava e elegia o presidente do partido, a animação das várias candidaturas permitia que se discutissem ideias programáticas reformistas e que até se recentrassem as temáticas de intervenção do partido na sociedade civil. O PSD continua a beneficiar desta característica muito positiva e enriquecedora. O mais complicado tem sido a gestão dos mandatos. Instalou-se uma cultura de não respeito por quem foi eleito e um não reconhecimento da sua legitimidade para concluir o mandato da sua função. Ao mínimo tremor sucedem-se os candidatos a candidatos e organizam-se assaltos ao poder, que tanta energia desviam da maior responsabilidade que este partido tem na sociedade portuguesa: fiscalizar o Governo socialista nas suas políticas e apresentar alternativas credíveis aos portugueses, para que estes possam escolher o seu futuro confiando nos que foram eleitos para os representar e decidir em seu nome.

As próximas eleições serão autárquicas. Este será o desafio que deverá mobilizar todos os militantes e que deverá estar no horizonte de quem for eleito no próximo sábado para tratar deste processo, tão relevante para a implementação local de partidos como o PSD. A desvalorização da importância das eleições autárquicas a favor das eleições legislativas constitui um perigo para a representação do PSD, seja quanto ao número de câmaras e de juntas de freguesia, seja quanto ao número de mandatos de vereadores e de deputados municipais e nas assembleias de freguesia. O PSD beneficia da capacidade de poder apresentar candidatos em todas as freguesias do país, conservando o seu contacto privilegiado com as populações e continuando a ser uma voz ativa na defesa dos interesses dos portugueses e das suas povoações. Nem todos os partidos têm esta faculdade, que não tem sido explorada e potenciada pelo partido e pelos seus líderes com a relevância que se impõe.

Rui Rio deverá compreender esta realidade e necessidade melhor que muitos outros militantes, já que esteve 12 anos à frente da Câmara Municipal do Porto, sendo-lhe reconhecido o mérito para ser reconduzido por duas vezes nas mesmas funções pelos eleitores portuenses. A experiência autárquica que adquiriu poderá ser uma mais-valia no processo eleitoral que se avizinha e que tem casos muito complexos para resolver segundo os métodos mais tradicionais, que poderão não ser suficientes para se alcançar um resultado positivo. Urge conhecimento sobre a realidade autárquica e sobre as suas idiossincrasias que permita encontrar soluções refletidas, sem partos espontâneos e prematuros que condicionem a atuação futura do PSD nas autarquias.

Não tem sido um caminho facilitado para o PSD nem tão-pouco para Rui Rio mas, ainda assim, estou confiante que o dia seguinte às eleições ponha fim a esta instabilidade e à liderança de quem já ganhou inequivocamente várias eleições desde que começou a vida associativa e demonstrou responsabilidade e competência nas suas decisões.

 

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