Condutores jovens estão mais vezes envolvidos em acidentes em contramão

Condutores jovens estão mais vezes envolvidos em acidentes em contramão


Dados da ANSR revelam que nos últimos cinco anos, 27% dos condutores envolvidos neste tipo de acidentes tinham entre 18 e 29 anos e 15,6% tinham mais de 65.


As pessoas com idades compreendidas entre os 25 e os 29 anos são as que registam um maior número de ocorrências de incidentes de circulação em contramão, seguidas das que têm entre 21 e 24 anos. Os dados são da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) e mostram que, ao contrário do que se costuma pensar, não são os condutores mais velhos que têm mais acidentes em contramão.

Na semana passada, dados da Associação Portuguesa das Sociedades Concessionárias de Autoestradas ou Pontes com Portagens (APCAP) – que gere uma rede de estradas que agrega 24 concessionárias e subconcessionárias, num total de cerca de 3580 quilómetros de autoestradas nacionais – revelaram que em 2019 registaram-se um total de 126 casos de carros a circular nas autoestradas em contramão. Relativamente a estes números, é necessário ter em conta que uma ocorrência não implica necessariamente um acidente e, por sua vez, vítimas mortais e/ou feridos.

Apesar de explicar não existir um perfil concreto desenhado, Rui Manteigas, secretário-geral da APCAP afirmava que “geralmente” este tipo de ocorrências “verifica-se em pessoas idosas, que se enganam ou estão mal habituadas a este tipo de velocidade e de estradas” e que por isso era necessário uma alteração na forma como as cartas de condução são renovadas aquando da chegada aos 65 anos. O secretário-geral da APCAP sugeria que se obrigasse esta população mais velha “a frequentar uma ação de formação onde no fundo renovassem e reciclassem os seus conhecimentos sobre as estradas”, por forma a estarem a par das novas regras a serem cumpridas.

Segundo os dados da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), no ano passado registaram-se um total de 184 acidentes em contramão com vítimas. Desses, resultaram sete vítimas mortais, 41 feridos graves e 265 feridos leves, entre os condutores dos veículos que iam em contramão e terceiros. No total, nos últimos cinco anos, 38 pessoas morreram devido a acidentes em contramão.

A ANSR faz ainda uma distinção por idades das vítimas neste tipo de incidentes e aí é que surge o inesperado. De acordo com a informação disponibilizada ao i pela ANSR, a grande maioria dos condutores envolvidos neste tipo de acidentes centra-se entre os 18 e os 49 anos, com um total de 110 vítimas no ano passado. Por outro lado, a população com mais de 65 anos – a considerada idosa e usualmente ligada a este tipo de acidentes – representa apenas cerca de 16,3% das vítimas de acidentes em contramão no ano passado, o correspondente a 30 acidentes.

Quanto à faixa etária que mais se destaca neste dados, os condutores com idades entre os 25 e os 29 anos são quem se destaca, com 23 vítimas. Contudo, se alargarmos um pouco a idade analisada, verificamos que a faixa etária dos 18 aos 29 anos, os “jovens adultos” por assim dizer, registou 56 dessas 184 vítimas no ano passado. Nos últimos cinco anos, 27% dos condutores neste tipo de acidentes tinham entre 18 e 29 anos e 15,6% tinham mais de 65. Estes números vêm assim contrariar de certa forma a ideia inicial que a população mais idosa era aquela que estava diretamente mais ligada a este tipo de ocorrências.

De acordo com os dados do Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), em Portugal existem mais de 6,5 milhões de condutores registados, sendo que desses 179 526 têm mais de 80 anos. Recorde-se que a partir dos 60 anos de idade, a renovação da carta de condução com atestado médico passa a ser obrigatória.

A autoridade responsável pela prevenção e a segurança nas estradas portuguesas refere ainda que a grande maioria (118) das vítimas deste tipo de acidente no ano passado se verificou em arruamentos, surgindo as estradas nacionais (36) em segundo lugar.

Ao i, José Miguel Trigoso, presidente da Direção da Prevenção Rodoviária Portuguesa (PRP), explica que este tipo de acidentes em contramão incluem “dois casos totalmente distintos a ter em atenção”, nomeadamente aqueles em que existe uma separação física de sentidos de tráfego, ou seja, autoestradas, e as chamadas estradas “normais”. Nos primeiros, a grande maioria das ocorrências está ligada à população mais velha, enquanto nos segundos são as faixas etárias mais novas quem se destaca.

Quanto ao motivo de ser a população mais jovem quem se destaca neste tipo de incidentes relacionados com contramão, José Miguel Trigoso não tem dúvidas: a velocidade. “Normalmente decorre de pessoas que vêm em excesso de velocidade e perdem o controlo, ou que fazem uma curva fora de mão, ou fazem mal uma ultrapassagem”. E ao problema da velocidade, junta-se o facto de que quanto maior esta é, maior a gravidade dos ferimentos nesses incidentes.

“A velocidade é um dos grandes problemas em termos de segurança rodoviária. Enquanto, por exemplo, o álcool e a distração causada pelo telemóvel são questões onde a maioria da população portuguesa já assume como importante responsável da sinistralidade, relativamente à velocidade ainda não há um assumir global de que o seu excesso é uma causa complicada da sinistralidade, nomeadamente nas faixas etárias mais baixas. Os homens e as faixas etárias mais jovens, de uma forma geral, desvalorizam muito o efeito da velocidade”, afirma.

Como forma de contrariar estes números, o representante da PRP assume que há ainda muito a fazer no que toca à sensibilização e ao controlo, “nomeadamente nos locais onde isso for mais frequente”, diz. “É também necessário melhor formação para as pessoas perceberem quais as velocidades adequadas em cada local onde andam”, acrescenta.

José Miguel Trigoso deixa ainda críticas ao desenho e organização das estradas portuguesas. “Num local onde a velocidade adequada seja de 40 km/hora, por exemplo, as vias devem ter um aspeto físico e um tipo de pavimento que levem a que as pessoas pratiquem esse tipo de velocidade e não outra. Não posso ter uma via numa vivência urbana com uma rua de largura quase de autoestrada. Com isso convidamos as pessoas a andar a uma velocidade completamente desajustada para o local onde estão”, conclui.