No Portugal dos últimos cem anos, só um homem conseguiu pegar em contas públicas deficitárias, endireitá-las e cumprir um orçamento com superavit. Chamava-se António de Oliveira Salazar e, graças essa proeza, ficou conhecido como “o mago das Finanças”.
À custa de uma mistura de contenção, avareza e sacrifícios (leia-se aumento da carga fiscal), o então ministro das Finanças pôs ordem num setor que se encontrava quase continuamente de pantanas desde pelo menos os tempos do Rei D. Carlos.
Isto foi em 1929. Precisamente noventa anos depois, o ministro das Finanças Mário Centeno apresenta um orçamento que prevê um excedente de 0,2% (qualquer coisa como 500 milhões de euros). E que, tal como o do seu longínquo antecessor, assenta essencialmente num aumento da receita fiscal.
Se há margem para isso (os tais 500 milhões de euros), por que não se aumenta o financiamento do ensino ou da saúde?, perguntam uns. Por que não se aumentam mais as pensões?, perguntam outros. Por que só sobem 0,3% os salários da função pública?, perguntam outros ainda. Por que não se reduzem os impostos? A decisão de aumentar a carga fiscal é realmente discutível, num país que já penaliza tanto os contribuintes – e são os contribuintes que vão pagar o excedente, como o próprio Centeno reconheceu.
Mas o Governo assume aqui uma opção que, sendo discutível, faz sentido: reduzir substancialmente a dívida pública. Portugal, segundo o FMI, é um dos dez países mais endividados do planeta. O pagamento de juros da dívida consome todos os anos o equivalente ao orçamento de um grande ministério, como o da Saúde. Mais do que voltar a aumentar salários, reduzir esse fardo deve constituir um desígnio nacional.
Reconheçamo-lo: somos um país com forte tendência para a irresponsabilidade e para o improviso. E por isso é muito melhor ter nas Finanças alguém como Centeno do que um qualquer vendedor de ilusões.