A integridade do Ministério Público e dos seus procuradores


A integridade, como armadura interior e arma exterior face às pressões indevidas, é a condição fundamental do exercício da magistratura.


Participei, recentemente, num congresso de uma associação de procuradores de um país estrangeiro, cujo nome não quero, propositadamente, revelar.

Versava tal congresso sobre os mecanismos de proteção interna da autonomia do Ministério Público (MP).

Uma das questões ali abordadas era a das condições para resistir às pressões – deveria dizer: orientações indevidas? – que os procuradores sempre sofrem quando têm de lidar com casos sensíveis.

Tudo me fez lembrar, portanto, a discussão que, ultimamente, se tem procurado desenvolver no nosso país em torno de aventadas ordens ilegais no seio do nosso MP.

Não conheço, nessa matéria, sistema mais equilibrado do que o nosso: impõe que todas as ordens dirigidas aos processos devam ser dadas por escrito e obriga quem recebe ordens ilegais – portanto, apenas as escritas, pois as outras não reúnem condições para serem consideradas como tais –  a não as acatar, sob pena de procedimento disciplinar concorrente com o que deve incidir sobre quem as deu.

O problema, ao menos como é insinuado, será, pois, o da existência de alegadas ordens não escritas: as tais que, em rigor, o não são.

Ora, é aqui que se cruza a importância do congresso a que assisti com a polémica nacional.

Ali se discutiu, com a contribuição de filósofos, sociólogos, professores de direito, representantes de ONG defensoras dos direitos humanos e, naturalmente, procuradores, uma ideia primordial no âmbito desta mesma questão: a integridade dos procuradores.

Não há, nem pode haver, sistema que dispense essa qualidade, que, mesmo não podendo ser legalmente definida, deve constituir, todavia, uma pedra angular na condição e comportamento de cada magistrado.

A integridade, como armadura interior e arma exterior face às pressões indevidas, é a condição fundamental do exercício da magistratura e, designadamente, da magistratura do MP, que, sendo hierarquizada, exige, naturalmente, um grau de inteireza maior da parte de cada um dos procuradores.

Resistir a possíveis pressões – mesmo que na forma de ordens ilegais escritas – não é tão difícil no nosso país como naquele onde tal congresso decorreu.

Qualquer procurador pode e deve mesmo, por imposição legal, não acatar ordens ilegais, provenham elas de que escalão hierárquico provierem.

Sendo tais ordens obrigatoriamente escritas, mais fácil é, ainda, identificar o seu vício e fundamentar a recusa.

Das outras, das sugestões – que alguns poderão entender como ordens ilegais – não pode rezar a história, pois, em rigor, como ordens não devem ser consideradas.

A resistência a tais «ordens» depende, pois, somente, da integridade do magistrado.

O que, portanto, se deve discutir, como fizeram, em condições muito mais adversas, os organizadores daquele congresso, é a integridade dos procuradores, pois só essa qualidade humana, cívica e profissional os pode armar contra «ordens» que, sem existirem à luz da lei, sempre podem acontecer além dela, mesmo quando tais «ordens», em rigor, possam – devam – ser consideradas irrelevantes.

E, meus amigos, contra estas «ordens» – se alguém pretender que o sejam – só a integridade pessoal do magistrado pode efetivamente valer.

Dizer, portanto, que existem ordens ilegais, exige, também, de quem o denuncia, que explicite se foram ou não acatadas.

É que uma ilegalidade revela a outra – a do que aceitou a ordem – revelando ambas, assim, a falta de integridade de todos os que nessa trama se viram envolvidos.

Uma suspeição generalizada de tal tipo pode, pois, colocar em causa a integridade não só dos elementos que ela explicitamente visa, como, muito mais seriamente, a integridade da instituição onde tais condutas acontecem como normais.

Sejamos, pois, todos íntegros e – separando o trigo do joio – assumamos as nossas obrigações legais de magistrados no que à defesa da integridade do MP se refere.

É a integridade de cada um de nós que faz, afinal, a integridade da magistratura a que pertencemos.  


A integridade do Ministério Público e dos seus procuradores


A integridade, como armadura interior e arma exterior face às pressões indevidas, é a condição fundamental do exercício da magistratura.


Participei, recentemente, num congresso de uma associação de procuradores de um país estrangeiro, cujo nome não quero, propositadamente, revelar.

Versava tal congresso sobre os mecanismos de proteção interna da autonomia do Ministério Público (MP).

Uma das questões ali abordadas era a das condições para resistir às pressões – deveria dizer: orientações indevidas? – que os procuradores sempre sofrem quando têm de lidar com casos sensíveis.

Tudo me fez lembrar, portanto, a discussão que, ultimamente, se tem procurado desenvolver no nosso país em torno de aventadas ordens ilegais no seio do nosso MP.

Não conheço, nessa matéria, sistema mais equilibrado do que o nosso: impõe que todas as ordens dirigidas aos processos devam ser dadas por escrito e obriga quem recebe ordens ilegais – portanto, apenas as escritas, pois as outras não reúnem condições para serem consideradas como tais –  a não as acatar, sob pena de procedimento disciplinar concorrente com o que deve incidir sobre quem as deu.

O problema, ao menos como é insinuado, será, pois, o da existência de alegadas ordens não escritas: as tais que, em rigor, o não são.

Ora, é aqui que se cruza a importância do congresso a que assisti com a polémica nacional.

Ali se discutiu, com a contribuição de filósofos, sociólogos, professores de direito, representantes de ONG defensoras dos direitos humanos e, naturalmente, procuradores, uma ideia primordial no âmbito desta mesma questão: a integridade dos procuradores.

Não há, nem pode haver, sistema que dispense essa qualidade, que, mesmo não podendo ser legalmente definida, deve constituir, todavia, uma pedra angular na condição e comportamento de cada magistrado.

A integridade, como armadura interior e arma exterior face às pressões indevidas, é a condição fundamental do exercício da magistratura e, designadamente, da magistratura do MP, que, sendo hierarquizada, exige, naturalmente, um grau de inteireza maior da parte de cada um dos procuradores.

Resistir a possíveis pressões – mesmo que na forma de ordens ilegais escritas – não é tão difícil no nosso país como naquele onde tal congresso decorreu.

Qualquer procurador pode e deve mesmo, por imposição legal, não acatar ordens ilegais, provenham elas de que escalão hierárquico provierem.

Sendo tais ordens obrigatoriamente escritas, mais fácil é, ainda, identificar o seu vício e fundamentar a recusa.

Das outras, das sugestões – que alguns poderão entender como ordens ilegais – não pode rezar a história, pois, em rigor, como ordens não devem ser consideradas.

A resistência a tais «ordens» depende, pois, somente, da integridade do magistrado.

O que, portanto, se deve discutir, como fizeram, em condições muito mais adversas, os organizadores daquele congresso, é a integridade dos procuradores, pois só essa qualidade humana, cívica e profissional os pode armar contra «ordens» que, sem existirem à luz da lei, sempre podem acontecer além dela, mesmo quando tais «ordens», em rigor, possam – devam – ser consideradas irrelevantes.

E, meus amigos, contra estas «ordens» – se alguém pretender que o sejam – só a integridade pessoal do magistrado pode efetivamente valer.

Dizer, portanto, que existem ordens ilegais, exige, também, de quem o denuncia, que explicite se foram ou não acatadas.

É que uma ilegalidade revela a outra – a do que aceitou a ordem – revelando ambas, assim, a falta de integridade de todos os que nessa trama se viram envolvidos.

Uma suspeição generalizada de tal tipo pode, pois, colocar em causa a integridade não só dos elementos que ela explicitamente visa, como, muito mais seriamente, a integridade da instituição onde tais condutas acontecem como normais.

Sejamos, pois, todos íntegros e – separando o trigo do joio – assumamos as nossas obrigações legais de magistrados no que à defesa da integridade do MP se refere.

É a integridade de cada um de nós que faz, afinal, a integridade da magistratura a que pertencemos.