Como era o setor funerário há oito anos?

Como era o setor funerário há oito anos?


Comissões ilegais a funcionários dos hospitais e a coveiros. O retrato de um país que pouco avançou.


Quase uma década depois, muitos anos após a chegada de novas empresas que prometiam um setor funerário mais profissional, pouco ou nada mudou. Em 2019 como no passado, as comissões ilegais a funcionários hospitalares mantêm-se, as funerárias que arranjam médicos para passar certificados de óbito também continuam no mercado e os corpos guardados em garagens continuam a ser uma realidade. Em 2011, uma grande investigação do Diário de Notícias colocou a nu todos estes problemas e hoje, mais de oito anos depois, o i revela que o cenário pouco ou nada mudou. Mas como era então esse negócio da morte em 2011?

O preço médio das comissões ilegais pagas pelas agências funerárias aos funcionários das morgues dos hospitais públicos para levantar um corpo era de 30 euros. E apesar de a prática não ser legal, dado que estes funcionários recebiam o seu salário, havia casos em que a entrega de dinheiro era registada. Segundo aquela investigação, um desses casos era o hospital de Bragança, onde era hábito, até esse ano, passar um recibo do pagamento da funerária com a inscrição “serviço de urgência”. Após ser confrontada, a unidade hospitalar dizia que esse prática estava instituída há muitos anos, mas que a então administração tinha aprovado um regulamento da casa mortuária onde não se referia qualquer cobrança às funerárias. Adiantava ainda já ter determinado o fim de tal procedimento.

Na altura, fontes ligadas ao setor funerário explicavam que a prática era generalizada e os preços iam muitas vezes até aos 50 euros por corpo. Na prática, estes funcionários recebiam uma comissão para fazer o trabalho para o qual haviam sido contratados e recebiam o seu salário.

Mas esta não era a única situação irregular detetada naquele ano. Outra era a disponibilização por parte de algumas agências de serviços médicos subcontratados para passagem de certificados de óbito, que podiam custar à família do morto até 150 euros. O DN publicava o exemplo de uma fatura em que a agência inscrevia da seguinte forma esta despesa na fatura final: “Emolumentos com médico assistente para passagem do certificado de óbito”. Na altura, os proprietários das funerárias que agiam desse modo explicavam que isso acontecia sobretudo ao fim de semana, quando os médicos de família não podiam passar esse documento.

Mas o serviço não é regular nem era na altura, uma vez que um certificado de óbito não tem custos, como, aliás, confirmou ao jornal uma dos médicos que na época cobravam uma comissão para o fazer – tal como os coveiros, acusados na altura de cobrar, em diversas situações, dez euros no momento do funeral.

Mas o lado negro do negócio da morte não se ficava por aí, com denúncias de que havia agências a deixar corpos durante toda a noite em garagens. Na altura, a Associação de Agentes Funerários de Portugal denunciou a situação, justificando que isso era uma forma de as agências mais pequenas competirem com os grandes grupos, que têm infraestruturas próprias para o efeito. “Isso acontece quando há uma morte à noite num domicílio”, explicavam.

Um pequeno empresário da região de Lisboa, que não quis ser identificado, descrevia assim o que se passava no setor: “Neste mundo não há ninguém que possa dizer que nunca fez uma ‘candonga’. Porque há médicos, enfermeiros, bombeiros e até polícia que nos arranjam serviços por troca, como os funcionários da morgue”.