Praticamente um ano depois de ter feito o último jogo na prova, ainda ao comando do Manchester United, José Mourinho vai voltar a sentir o ambiente de um encontro de Liga dos Campeões. E, curiosamente, diante de outra equipa treinada por um português – no caso, o Olympiacos de Pedro Martins, onde jogam ainda José Sá, Rúben Semedo e Daniel Podence.
Uma vitória em Londres garante automaticamente o apuramento dos spurs para os oitavos-de-final, depois de uma campanha que até começou perra para os vice-campeões europeus em título: empate (2-2) em Atenas, precisamente diante do adversário desta noite, e um impensável desaire caseiro contra o Bayern de Munique (2-7!). Seguiram-se, porém, duas goleadas ao Estrela Vermelha (5-0 em Inglaterra e 0-4 na Sérvia) que devolveram o Tottenham ao trilho dos oitavos, agora bem mais ao alcance – o empate até pode bastar, se o Estrela Vermelha não vencer em Belgrado o Bayern, já apurado.
Para Mourinho, a única novidade aqui será mesmo o facto de se poder apurar na fase de grupos da Champions… ao primeiro jogo na prova. De resto, nada de novo para aquele que é o quarto treinador com mais presenças em jogos no formato atual da prova (apenas atrás de Alex Ferguson, Arsène Wenger e Carlo Ancelotti), a qual já venceu por duas ocasiões (2003/04 com o FC Porto e 2009/10 no Inter de Milão).
Esta será a 17.ª participação de Mourinho na prova, num registo quase imaculado: apenas por duas vezes falhou o apuramento para a fase a eliminar, e ambas em contextos muito especiais – em 2001/02, sucedeu a Octávio Machado no FC Porto já à terceira jornada, após um empate e uma derrota e ainda com dois jogos com o Real Madrid pela frente; e em 2007/08, foi despedido do Chelsea logo após a primeira ronda. Houve ainda mais duas ocasiões em que acabou por não jogar a fase a eliminar: em 2015/16, no Chelsea, e na época passada, já no Manchester United, sendo afastado do comando técnico no hiato entre a fase de grupos e os jogos dos oitavos.
nervos? o que é isso? Para já, reina a confiança no homem que um dia se autointitulou Special One – e que haveria por confirmar esse epíteto com os troféus conquistados no comando técnico do Chelsea (um dos grandes rivais… do Tottenham). A estreia, apesar dos calafrios na fase final, foi positiva (esteve a vencer no dérbi do norte de Londres em casa do West Ham por 3-0, com o encontro a terminar com um apertado 3-2), até porque os spurs não venciam fora de casa há dez meses. O triunfo deixou o conjunto londrino mais desafogado na Premier League – é décimo, a dois pontos dos lugares europeus e nove dos que garantem o acesso à Champions –, pelo que o chip muda agora para a prova milionária, onde o Tottenham tem responsabilidades, depois da épica campanha da temporada passada que só terminou com o desaire na final, diante do Liverpool (0-2).
Por agora, o foco direto é o apuramento para os oitavos-de-final, e Mourinho garante estar preparado para enfrentar dificuldades. “Nunca joguei com o Olympiacos, mas já joguei com boas equipas gregas, como o Panathinaikos. Fizemos o nosso trabalho de casa. Respeito o Olympiacos como equipa e mais do que falar num jogador – e seria agradável para eles se falasse nos jogadores portugueses –, foco-me na equipa. Em Atenas não foi um jogo fácil, não espero um jogo fácil, mas queremos jogar bem. Fizemos isso durante 45 minutos com o West Ham, espero que amanhã possamos prolongar esse tempo. Quero tentar ter um bom resultado e que nos qualifiquemos. Vamos tentar ganhar e jogar bom futebol, futebol ofensivo, como fizemos no sábado. É isso que vamos tentar, vamos ver se o Olympiacos nos deixa fazer isso”, frisou o treinador português.
Ansiedade por chegar ao jogo, garante Mourinho, é coisa que já não lhe acontece desde há algum tempo. “Não estou nervoso, nunca estou nervoso, sinto só o desejo de que o jogo fosse esta noite e não amanhã. Já tenho demasiados jogos na carreira para me sentir nervoso, não há borboletas na barriga. Digo sempre que no meu primeiro jogo como treinador principal perdi e nunca imaginei que viesse a ter tanto sucesso na minha carreira”, realçou, completando a ideia: “Nas duas épocas em que venci o triplete, com o FC Porto e o Inter, comecei com um empate. Queremos ser fortes, ganhar jogos, o nosso estádio é o melhor do mundo. Não quero dizer que são os melhores adeptos do mundo, porque senão dizem que é porque quero que os adeptos do Tottenham me adorem já, mas temos grandes adeptos”.
Será sempre impossível dissociar o historial que Mourinho tem na Liga dos Campeões da atualidade, e por isso mesmo os jornalistas presentes na conferência de imprensa de antevisão ao encontro desta noite quiseram saber se o técnico nascido há 56 anos em Setúbal acredita em conquistar a prova ao comando do Tottenham. A resposta foi conclusiva… q.b. “Adoro a competição tanto quanto toda a gente no futebol. É algo que toda a gente sonha conquistar. Temos dois jogos para nos qualificarmos e temos de nos focar nestes jogos primeiro. Dêem-me tempo para desenvolver as minhas ideias e não teremos problema em defrontar qualquer equipa na Europa. Não temos medo de ninguém”, sentenciou.
gregos com fé Do outro lado, já se disse, estará uma espécie de armada lusa que ainda acalenta uma réstia de esperança em chegar aos oitavos-de-final – ou, no limite, terminar no terceiro lugar do grupo para transitar para a Liga Europa. O único ponto conquistado pelo Olympiacos nesta edição da prova foi precisamente no jogo da primeira volta com o Tottenham e um eventual triunfo em Londres poderia devolver o gigante de Atenas à luta, até porque na última ronda recebe o Estrela Vermelha e os spurs terão de defrontar o Bayern em Munique.
“Sempre soubemos que ia ser muito difícil para nós esta época na Liga dos Campeões, porque estamos num dos grupos mais difíceis. Mas mesmo assim queremos lutar e tentar ir à Liga Europa. Também é importante mostrar bom futebol e dar uma boa imagem de nós próprios. Sabemos que vai ser difícil acabar em terceiro lugar, mas ainda é possível e vamos lutar por isso. Vimos a Londres para lutar pela nossa posição”, explicou Pedro Martins, o timoneiro do clube grego, em declarações ao jornal britânico Daily Telegraph.
Na mesma ocasião, o antigo técnico de Marítimo, Rio Ave ou Vitória de Guimarães, entre outros, reservou rasgados elogios para o seu adversário desta noite, que elege como fulcral para o crescimento dos treinadores portugueses. “Mourinho mudou a nossa mentalidade e metodologia quando estava no FC Porto. Veio do Barcelona e mostrou-nos um jogo diferente, uma forma diferente de vermos o jogo. Antes, a nossa metodologia tinha a ver com treino e futebol, e ele ensinou-nos a apostar tudo no futebol. Assim, mesmo quando a equipa está a treinar os jogadores estão a pensar em como o podem usar para se tornarem melhores futebolistas. Ele mudou isto”, salientou Pedro Martins, que chegou a representar a seleção nacional quando atuava no meio-campo do Sporting, na década de 90 do século passado.