Fogo-de-vista ou uma verdadeira intenção de iniciar um processo de coesão territorial? PSD e CDS não têm dúvidas: por muito bom que seja este primeiro passo, a decisão de deslocar três secretarias de Estado não parece ser mais do que uma manobra simbólica, com pouca substância, que por si só não faz a descentralização.
“Isto é andorinha que não faz a primavera. Em princípio, não é mau, mas é preciso ter cuidado e dar consistência e substância a esta deslocação de secretarias de Estado para o interior do país, sob pena de a transformar num exercício folclórico. Eu acho que enquanto esta transferência não tiver peso institucional a sério, não passa disso mesmo: um exercício folclórico”, diz ao i Adão Silva, vice-presidente da bancada parlamentar do PSD.
Os sociais-democratas defendem que, para que haja de facto uma mudança consistente, é necessário que se assegure também a transferência dos serviços ligados às secretarias de Estado e aos ministérios. “Esta transferência deve ser acompanhada da mudança das respetivas direções-gerais, dos respetivos institutos, por forma que haja verdadeiramente uma transferência de poder para junto dos cidadãos e uma descentralização ao mais alto nível do Estado para junto das populações. Tal como se anuncia, é um bom primeiro passo, mas é um passo débil e até equívoco, se não tiver uma substância, que é dada pela máquina operativa dos ministérios. Se assim não for, fica apenas um símbolo, um emblema, e não há nada pior do que emblemas e símbolos destituídos de substância”, explica Adão Silva.
Para inglês ver? Esta opinião é partilhada pelo CDS-PP, que vê esta medida como apenas mais uma proposta que em nada irá mudar a forma como se governa. “O CDS tem sido muito crítico em relação ao processo de descentralização feito pelo Governo. Temos dito muitas vezes que este é mais um processo para inglês ver. A mudança de secretarias de Estado é também uma daquelas medidas feitas para mudar alguma coisa para que tudo fique na mesma”, diz ao i Cecília Meireles, líder do grupo parlamentar.
“Mudar as secretarias de Estado de sítio não resolve de todo os problemas de centralismo. Porque a decisão continua bem centrada no sítio onde está”, acrescenta a deputada, lembrando que este Governo bateu o recorde no que diz respeito ao número de ministérios e secretarias de Estado: “A descentralização implica ter melhor Estado, não é para termos mais Estado. Este processo passa por pegar num Estado que já existe, tirá-lo de Lisboa e pô-lo noutros sítios”.
Cecília Meireles aproveitou ainda para lembrar o caso da mudança da Autoridade Nacional do Medicamento: “Como nesta matéria de medidas simbólicas já tivemos a experiência do Infarmed e da mudança para o Porto, sobre a qual, tanto quanto sei, não há ainda uma decisão final, eu fico à espera de ver quando é que o Governo dirá, afinal, que competências vão ser descentralizadas para as autarquias e que serviços do Estado central serão encerrados para que essas competências passem a ser exercidas por quem está mais próximo das populações, e não propriamente em função de medidas mais ou menos simbólicas”. Recorde-se que o Governo anunciou em setembro a suspensão da deslocalização do Infarmed para o Porto, no seguimento da criação de uma comissão na Assembleia da República para avaliar questões da descentralização de serviços públicos.