O problema de sermos um país pequeno passa também por termos a grande maioria dos nossos políticos centralizados nas grandes cidades, especialmente, e obviamente, em Lisboa. Dir-me-ão que o uma grande parte dos mesmos é oriundo das mais variadas partes do país, o que é verdade, no entanto, permitam-me retorquir que a grande maioria vive pelo menos desde da faculdade na capital. O que vai dar ao mesmo: alguém que com 40 anos e que vive há 22 anos na mesma cidade há muito que perdeu as suas raízes. Quer queira, quer não.
Aqui na capital, de onde vos escrevo e onde vivo precisamente desde que vim para a faculdade, existe uma tendência natural de ignorarmos e esquecermos o mundo rural. Aqui na capital há muito que o sushi é uma moda, mas na terra dos meus pais ainda não há um restaurante japonês. Aqui na capital os cinemas já passaram de moda, na terra dos meus pais já não há um cinema aberto muito antes deles saírem de moda.
Aqui na capital há muito que a ecologia é uma (boa) moda, na terra dos meus pais ainda não há poluição suficiente para que valha mesmo a pena preocuparmo-nos muito com o ambiente. Aqui na capital reivindicamos mais espaços verdes e menos carros, na terra dos meus pais ainda se luta para que existam estradas condignas para que quem vive em zonas verdes consiga chegar em segurança a casa. Aqui na capital há gente que no fim de um documentário no Netflix deixa de comer carne, na terra dos meus pais ainda há muita gente a criar gado para que a sua geração e dos seus filhos seja a primeira a poder alimentar-se condignamente com carne.
Todos vivemos no mesmo país, todos somos iguais, mas a verdade é que também todos vivemos em realidades absolutamente diferentes. A caça que para alguns lisboetas é uma barbaridade, noutras zonas do país é absolutamente vital para controlar pragas de animais selvagens como os javalis. A pesca que para muitas pessoas da cidade é algo sem sentido, é para muitas outras pessoas não só um dos únicos hobbies a que têm acesso como também uma das melhores oportunidades de conseguirem ter uma refeição especial em família. As corridas de touros que o povo dito urbanizado olha tantas vezes com ignorância e desdém, é em muitas zonas de Portugal a mais importante forma de expressão cultural e perpetuação das raízes populares.
Mas voltemos ao problema. A urbanização da classe política e a irresistível tentação de se tornarem rapidamente cosmopolitas e moderninhos, é uma grave ameaça à estabilidade do nosso sistema político e partidário. Hoje quem vive fora dos grandes centros urbanos sente-se cada vez mais abandonado pelos políticos. Mesmo por aqueles que até foram eleitos pelos seus círculos eleitorais. Esta ruptura entre os políticos e eleitores é sem dúvida um campo fértil para todos aqueles que se posicionam fora do sistema. Os resultados já são visíveis eleitoralmente e serão cada vez mais.
Ainda vamos chegar ao dia em que os partidos vão parar para pensar na forma ridícula como tentaram impor a todo o território os costumes que (passe o pleonasmo) apenas são costumes dos grandes centros urbanos. Mas nessa altura talvez já seja tarde de mais. Fica o aviso.