Várias foram as derrotas nas últimas legislativas. O aumento da abstenção é uma grande derrota bem demonstrativa do muito fraco apelo que o atual sistema político exerce sobre a sociedade; o fraco resultado de Pedro Santana Lopes mostrou, de forma bem esclarecedora, que os grandes partidos têm, independentemente das lideranças, um resultado base; o CDS mais uma vez se esvaziou; o PCP manteve a rota descendente; o PSD obteve o seu resultado base, manifestamente insuficiente para ganhar eleições, e como não sabe nem tem capacidade de construir uma maioria parlamentar com os outros partidos (necessitaria sempre do Bloco e do PCP), não tem disponível a hipótese que o PS utilizou em 2015 para governar; por fim, e apesar de ter vencido as eleições, o PS, que não fazia nem faz tenções de partilhar a governação com ninguém, não obteve a tão ambicionada maioria absoluta. Este facto é bem elucidativo da forma como o atual primeiro-ministro utilizou a solução governativa anterior unicamente ao serviço de uma estratégia pessoal de sobrevivência política. Houve uns quantos vencedores. Venceram os que cantam como sereias em discursos apelativos, vazios de conteúdo para a resolução dos aspetos críticos que condicionam o desenvolvimento de Portugal e que em instância específica se prendem com o excessivo endividamento, a ausência de uma estratégia de sustentabilidade económica e a crise demográfica; por outro lado, em termos sistémicos há desafios críticos relativamente aos quais Portugal necessita atuar e que dizem fundamentalmente respeito à estabilidade e futuro da Europa comunitária, à preservação da qualidade ambiental e climática, à gestão dos fluxos migratórios e às relações este/oeste. No final perdem os portugueses que irão, uma vez mais, conviver com um Governo sem gabarito, vazio de ambição e estratégia. De relevante temos, nos próximos tempos, a resolução da crise interna do PSD que, independentemente do resultado de janeiro, se avizinha dura e longa. Como o melhor da política em Portugal tem estado no fabuloso trabalho e exemplo que algumas autarquias têm dado, é importante começar a pensar em propostas para as autárquicas que enquadrem lideranças credíveis e projetos que contemplem, ao nível do território, contributos sólidos para a resolução dos desafios que a atualidade enfrenta. Do Estado central contamos basicamente com uma profunda negligência em matérias primordiais para o desenvolvimento e sustentabilidades socioeconómicas. Estamos mal entregues e não se vislumbram grandes alterações. É, no mínimo, muito aborrecido.
Gestor e professor do ISCTE-IUL
Subscritor do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”