A singularidade deste partido e a sua postura irreverente arrisca-se a ficar na História não pela eleição, mas por criar a necessidade de realização de obras extraordinárias na Assembleia – ao que parece, o Chega terá direito a uma porta dedicada.
O incómodo generalizado que a eleição do deputado do Chega causou em toda a classe política parece continuar e, neste caso, cair no ridículo. Em bom rigor, esse incómodo não é generalizado. Não em toda a classe política pois, na verdade, António Costa foi o único que ignorou por completo as tentativas dos jornalistas de hipervalorizarem a eleição de André Ventura… é a democracia.
O Chega entra no hemiciclo, em parte, por mérito próprio, fruto das suas ideias e propostas muito particulares e bastante cirúrgicas, mas que tiveram aceitação. Por outro lado, e para uma parte da população, pela postura populista e pela falta de resposta dos partidos do arco da governação aos efetivos problemas das sociedades modernas. Para mim, é a democracia funcionar, em que todos podem expressar livremente as suas opiniões e, como resultado disso mesmo, uma fatia da população está representada nesta legislatura.
Portas e cadeiras da Assembleia à parte, e independentemente da configuração da mesma, a ideia que transparece é que o desnorte do CDS, que viu o seu grupo parlamentar reduzido em 13 deputados, alastra descontroladamente.
A falta de liderança resvala na mesquinha dança das cadeiras e dos lugares. Das duas, uma: ou André Ventura tem um problema de incontinência que justifica o incómodo expresso pelo CDS e que fundamenta a quezília da atribuição do seu lugar no hemiciclo, ou o CDS está apavorado com a possibilidade de o Chega morder os seus calcanhares – dou de barato.
Nunca entendi bem os alinhamentos administrativos e de interesse corporativo que nos momentos mais singulares unem diferentes cores políticas no Parlamento. Neste caso concreto, a problemática de onde se senta o Chega (numa analogia caricata de onde está o Wally) contou com a simpatia do Partido Ecologista Os Verdes (PEV) e a intervenção do próprio presidente da Assembleia.
É incompreensível que um tema destes seja notícia, que dê espaço a uma comunicação televisiva por parte do CDS e que obrigue à abertura de uma porta dedicada para possibilitar a circulação de um deputado de forma a não incomodar outros cinco.
Por esta ordem de ideias, teríamos de realizar nova intervenção para o deputado da Iniciativa Liberal e, desta feita, algo mais elaborado. É que João Cotrim está num enclave entre um deputado do PSD e três do CDS e, assim sendo, qual será a melhor solução? Criar um túnel de acesso ou um guincho para o elevar do seu lugar?
O Livre, para já, está fora desta polémica: teve mais sorte, saiu-lhe uma coxia. Contudo, outro problema se levanta, ou melhor, o PEV levantou. É que o deputado José Correia defendeu que "qualquer solução encontrada para a distribuição de lugares deve garantir o acesso à primeira fila de todos os grupos parlamentares". E isto, sim, parece-me relevante por uma simples razão: igualdade de direitos.
Faz toda a diferença intervir numa primeira, numa segunda ou numa terceira fila. E, neste caso, nem o Chega, nem o Livre e nem a Iniciativa Liberal são mais, ou menos, que os restantes partidos.
Seja qual for a solução encontrada, Chega, Iniciativa Liberal e Livre já estão a causar confusão no sempre equilibrado Parlamento e a ideia que transparece é que esta é uma guerra de pequeninos em que, por força do número de deputados, o CDS se aprontou a envolver.
Se de início estava curioso sobre como iria funcionar a próxima legislatura, agora estou convicto de que será uma animação e, estou certo, esta aparentemente inocente dança das cadeiras, com ou sem back door, é o início de um processo que terá impacto nas próximas eleições. É que esta tentativa de esconder os incómodos deputados destes três novos partidos só demonstra que, para alguns, eles são um verdadeiro pedregulho no sapato.