Uma viagem ao absurdo (e nada minimalista) mundo de Wasted Rita

Uma viagem ao absurdo (e nada minimalista) mundo de Wasted Rita


A Underdogs inaugurou hoje, em Lisboa, And now for something completely different: a show that features at least one female artist. A mais recente exposição da artista mostra o absurdo mundo em que vivemos.


“Ainda há pessoas que acham o meu trabalho minimalista”, diz Wasted Rita, nome artístico de Rita Gomes, sobre a reação que por vezes recebe em relação às suas obras. “Se visitarem a galeria, depressa vão perceber que o meu trabalho evoluiu para além disso. Quando virem a cama gigante, quero ver se ainda acham o meu trabalho minimalista”.

Wasted Rita ganhou proeminência no mundo artístico pela utilização de text-based art, estilo pós-moderno de ilustrações em que apenas figuram frases escritas. Nestes trabalhos partilha comentários, “pseudopoesia”, como gosta de lhe chamar, com pensamentos embebidos em ironia e sarcasmo sobre o que se passa à sua volta ou na sua cabeça.

Cada vez mais um nome seguro no panorama tanto nacional como internacional – em 2015 foi convidada por Banksy a expor o seu trabalho em Dismaland, parque temático concebido pelo artista cuja identidade é desconhecida e uma das suas maiores exposições, e já este ano, uma das suas ilustrações teve uma aparição especial no videoclipe da música Gun Control de Madonna (que já visitou uma das suas exposições) –, aos 31 anos, Wasted Rita apresenta a sua quarta exposição a solo na Galeria Underdogs (em 2015 e 2017 expôs no espaço da galeria, em Lisboa, e, em 2016, no Porto, a sua terra natal, numa exposição pop-up montada numa loja).

A exposição tem o título And now for something completely different: a show that features at least one female artist (traduzível para algo como “e, agora, algo complemente diferente: um espetáculo que apresenta pelo menos uma artista mulher”).

Questionada pelo i sobre se esta era uma referência aos Monty Python (a frase foi inúmeras vezes citada por John Cleese entre sketches e situações ridículas), a artista confessou nunca ter visto nenhum trabalho dos britânicos – uma resposta que surpreende, dado o estilo de humor absurdo de ambos. Se eles criaram um sketch de um homem que tenta devolver um papagaio morto à loja onde acabou de o comprar, a artista criou nesta sua nova exposição uma ala que, para ser visitada, obriga a atravessar uma cortina de metal que forma a frase “FUCK MY LIFE” (assim mesmo, em maiúsculas garrafais e amarelas). Do lado de lá da cortina encontramos um quadro com a frase “being ofensive is cool but have you tried driving off a cliff?”, outro que apenas aglomera as palavras “pessimism nihilism escapism” (com um golfinho cor-de-rosa) ou ainda um em que ilustra um “today’s fuckboi tomorrow’s Bolsonaro” com um chapéu da Nike.

O titulo da exposição não é uma referencia geek, mas sim, como explica Wasted Rita, uma “provocação, não só à galeria em que, representando vários artistas, apenas duas são do sexo feminino, como ao mundo em geral pela falta de oportunidades que oferece às mulheres, muito menos às mulheres negras”. E reforça que há aqui uma crítica mais abstrata: “Queria que o título não tivesse nada a ver com as peças. Claro que há peças que criticam uma sociedade patriarcal ou a falta de mulheres em museus ou galerias, mas a crítica é muito mais abrangente”.

A inspiração para este novo conjunto de trabalhos surge de observações e reflexões da ilustradora. “A exposição é baseada em populismos, coisas muito típicas de Portugal, mas que se podem aplicar ao resto do mundo”, referenciando, entre outras coisas, o “surreal” Programa da Cristina, as ruas com guarda-chuvas ou programas de televisão que transmitem blackfaces em horário nobre de domingo. “Nesta exposição queria criar instalações em que fosse obrigatória uma interação completamente desnecessária com a peça, gerando situações que, tal como todas estas coisas que acontecem no mundo, são para mim absurdas”.

Uma delas atira os visitantes para fora da sua zona de conforto, ao obrigá-los a deitarem-se numa cama para poderem observar vários quadros que estão suspensos. Num deles lê-se “reality is a so-so place and there is no good reason to log out”. Wasted Rita pode até achar. Mas em And now for something completely different: a show that features at least one female artist há razões de sobra para fazer “log out”, sair do quentinho de casa para a visitar e refletir sobre as situações absurdas que inundam o mundo de Wasted Rita. Talvez assim possamos olhar para o bright side of life.

* Texto editado por Cláudia Sobral

 

Underdogs, Rua Fernando Palha,

Armazém 56, Lisboa. Terça a sábado,

das 12h00 às 19h00. Até 16 de novembro