Moçambique vota em clima tenso de troca de acusações

Moçambique vota em clima tenso de troca de acusações


Mais de 12 milhões de eleitores moçambicanos vão hoje às urnas para eleger o novo Presidente da República, o novo parlamento e, pela primeira vez, os governadores provinciais. Campanha ficou marcada por dezenas de mortes, ataques a infraestruturas e tragédia após comício de Filipe Nyusi num campo de futebol.


As IV eleições gerais e as III eleições provinciais moçambicanas acontecem sob uma atmosfera de tensão política provocada por atos de violência ocorridos durante a campanha eleitoral. A desconfiança de fraude é outra constante, com a oposição a apelar ao controlo popular da contagem dos votos, de um lado; e a Frelimo, partido no poder, e o Ministério do Interior, por outro lado, a exigirem que a população acompanhe o apuramento dos resultados eleitorais a partir de casa.

Sob a tese de pretenderem combater a “mega fraude orquestrada pela Frelimo”, seis partidos políticos da oposição criaram uma frente única para, à escala nacional, controlar o processo de votação e denunciar qualquer foco de violência ou ilícito eleitoral. A frente, que reúne a Renamo, MDM, PODEMOS, Nova Democracia, AMUSE e Partido Ecologista, pretende que “a denúncia [de fraude] de um seja de todos, de modo a garantir que todas as atas e editais manipulados não sejam assinados por nenhuma das partes”.

Em conferência de imprensa, no sábado, em Maputo, Quitéria Guirengane, porta-voz da referida frente, denunciou “a mega fraude orquestrada pela Frelimo com o apoio do Secretariado Técnico de Administração eleitoral e a empresa privada CC que pela calada da noite tem estado a introduzir urnas e material de voto em Moçambique”.

A esta preocupação, junta-se o facto de mais de 3 mil observadores nacionais de um total de 7 mil não terem sido credenciados para fiscalizarem as eleições, segundo a Sala da Paz, uma plataforma da sociedade civil que observa o processo eleitoral.

Por sua vez, o Ministério do Interior afirma que não vai tolerar a presença nas assembleias de votos de eleitores que já tenham votado. Em comunicado, este órgão refere que agentes da polícia moçambicana foram destacados para várias frentes, visando prevenir e repelir quaisquer atos ilegais que possam perturbar o processo de votação. “É proibida, nos termos da lei, a permanência de eleitores que já tenham votado, nas assembleias de voto. A PRM [Polícia da República de Moçambique] irá intervir, sempre que for necessário, recorrendo a todas as formas lícitas e proporcionais, legalmente estabelecidas, para rechaçar quaisquer actos ilícitos, protagonizados por quem quer que seja, que possam descredibilizar o processo de votação”, lê-se no comunicado divulgado esta segunda-feira.

Entendido como uma resposta à campanha “votou, controlou” ou “votou, ficou” dos partidos da oposição para o controlo popular do processo de votação, o comunicado não intimidou os internautas que continuaram a difundir a campanha e a alimentar as redes sociais com mensagens incentivando os eleitores a permanecerem nas assembleias de voto depois de exercerem o direito de escolher os futuros dirigentes políticos do país.

Durante todo o dia de ontem, na página oficial do Facebook de Ossufo Momade, candidato da Renamo ao cargo de Presidente da República, foram publicados textos apelando ao controlo do voto. “Meus caros, eles estão [desesperados] porque dissemos que iremos controlar o nosso voto, ninguém deve recuar… Se na verdade as eleições são justas e transparentes, então não há motivos para alarme, ninguém quer perturbar a ordem pública”, lê-se num dos textos no Facebook do Presidente da Renamo que apelam ao controlo do voto.

Campanha manchada por mortes A campanha eleitoral foi marcada por actos de violência e luto, nomeadamente a morte de 35 pessoas – entre elas o assassínio de Anastácio Matavel, membro da Sala da Paz, mais de 250 feridos e destruição de perto de duas dezenas de infraestrutras com destaque para o incêndio à casa da mãe de Manuel Manuel de Araújo, cabeça de lista da Renamo na província da Zambézia e atual edil de Quelimane.

A época de “namoro” ao eleitorado foi ainda marcado pela tragédia de Nampula, onde 10 pessoas perderam a vida e mais de 80 ficaram feridos quando pretendiam deixar o campo de futebol onde minutos antes Filipe Nyusi realizara um comício.

Apesar de todos estes episódios violência, o Secretariado de Administração Eleitoral fez um balanço positivo da campanha. Reconhecendo ter havido ilícitos eleitorais, o porta-voz do Secretariado de Administração Eleitoral, lembrou que o papel dos órgãos eleitorais não é mais do que o de um aconselhador, e que os julgamentos e condenações são da competência dos tribunais.

Mesas de voto não abrem em quatro distritos de Cabo Delgado Mais de 5 mil eleitores recenseados nas zonas costeiras de Cabo Delgado não poderão exercer o direito de voto na sequência da não abertura de 40 mesas de voto.

A decisão resulta dos ataques armados protagonizados por insurgentes até aqui não identificados nos distritos de Palma, Mocímboa da Praia, Macomia e Nangade, desde outubro de 2017.

* Jornalista do Sol do Índico