“Mentiram-nos. Deram-nos falsas esperanças. Disseram-nos que devíamos estar ansiosos pelo futuro. E o mais triste é que a maior parte das crianças não têm noção do destino que as aguarda”, disse, em abril, Greta Thunberg, a menina sueca que se tornou um símbolo da luta pelo ambiente. O que vai acontecer ao nosso planeta? Devemos preparar-nos para um cenário apocalíptico? Fazer futurologia nunca é a solução, mas vários estudos científicos começam a revelar o que se adivinha.
No início do mês foi revelado um relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC na sigla em inglês) das Nações Unidas sobre os efeitos das alterações climáticas nos oceanos e na criosfera. As quedas acentuadas no stock de peixe, o crescimento exponencial na quantidade e intensidade das tempestades e a existência de centenas de milhões de pessoas desalojadas por causa da subida do nível do mar são alguns dos cenários que estão em cima da mesa.
O documento diz que, em 2050, grandes cidades que se localizem a uma baixa altitude e ilhas vão enfrentar anualmente “eventos extremos no que diz respeito à subida do nível do mar”. O relatório acrescenta que este cenário deverá ocorrer mesmo que sejam cumpridas as medidas mais drásticas em relação à diminuição da emissão de gases.
A situação torna-se mais grave ainda 50 anos depois: em 2100, “os danos provocados por cheias anuais deverão ser duas ou três vezes maiores”, alertam os especialistas. E mesmo que o homem consiga diminuir dois graus na temperatura média do planeta, o nível do mar subirá de tal forma que mais de 250 milhões de pessoas ficarão desalojadas.
Outro dos problemas é a acidificação e deterioração dos oceanos. Os ecossistemas marinhos têm um papel vital no armazenamento de carbono, mais eficiente até do que as florestas. Ora, com a degradação dos mesmos, são libertadas para a atmosfera ou para os oceanos grandes quantidades de dióxido de carbono – segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN na sigla inglesa), estima-se que sejam libertadas entre 0,15 e 2,02 mil milhões de toneladas de CO2 por ano, o que representa 19% das emissões globais de carbono por desflorestação.
“Os impactos do aquecimento e da acidificação dos oceanos em espécies e ecossistemas costeiros e marinhos já são observáveis. Por exemplo, a quantidade atual de CO2 na atmosfera já é demasiado alta para os recifes de coral prosperarem, colocando em risco a provisão de alimentos, a proteção contra cheias e outros benefícios fornecidos por este ecossistema”, refere a IUCN no seu site, frisando que fenómenos como este terão tendência a aumentar. Aliás, o instituto sublinha que estes problemas poderão colocar em causa “a segurança física, económica e alimentar” das comunidades costeiras, que representam 40% da população mundial.
Mais fogos Outro dos principais problemas é o aumento dos incêndios florestais. Com o aumento da temperatura, a probabilidade de existirem mais fogos e de maior intensidade também cresce, pois as temperaturas mais altas provocam “mais evaporação da humidade do solo, o que faz com que os solos fiquem mais secos e a vegetação mais inflamável”, explica o Environmental Defense Fund, uma organização norte-americana sem fins lucrativos.
“Com o aumento de secas e de ondas de calor, bem como das emissões de gases de efeito de estufa, é expetável que ocorram mais fogos florestais nos anos que se avizinham e que a época dos incêndios dure cada vez mais tempo”, acrescenta.
Menos animais e plantas E com o aumento dos incêndios e das secas, por um lado, e das tempestades e do nível médio dos oceanos, por outro, surge novo problema: o desaparecimento de várias espécies. A perda de habitats, a falta de alimento, as mudanças de temperatura, o aparecimento de espécies invasoras, a poluição e a pegada humana são aspetos que estão intimamente ligados às alterações climáticas e que têm um impacto severo na sobrevivência dos animais e das plantas.
De acordo com a red list feita pela IUCN, existem atualmente mais de 28 mil espécies em vias de extinção, o que representa 27% das espécies conhecidas. Animais como a ararinha-azul e o puma-norte- -americano-do-leste foram dados como extintos em 2018. O rinoceronte-branco também, mas a tecnologia existente hoje em dia permitiu aos cientistas criarem dois embriões desta espécie, noticiou este mês a cadeia televisiva Al Jazira.
E este não foi o único animal que o homem ajudou a salvar: segundo a IUCN, o gorila-das-montanhas e o rinoceronte-negro são dois exemplos de espécies que, graças ao esforço das comunidades, diminuíram o seu nível de risco de extinção.
No entanto, apesar dos esforços, o futuro não parece ser nada risonho: o Center for Biological Diversity, uma organização norte-americana sem fins lucrativos, prevê que a Terra “está agora a atravessar a sexta extinção em massa de plantas e animais – é a sexta onda de extinções nos últimos 500 milhões de anos”, um fenómeno que continuará a aumentar nos próximos anos.
Mas nem todas as espécies têm os dias contados. Um artigo da BBC mostra que algumas espécies têm fortes hipóteses de sobreviver ao cenário mais negro provocado pelas alterações climáticas. São exemplo disso as plantas resistentes ao calor e à seca – como as que se encontram nas zonas de deserto – ou aquelas cujas sementes se espalham através do vento, da corrente dos oceanos ou até do transporte animal – como as acácias e os coqueiros. Além disso, animais como as baratas, que sobrevivem há milhões de anos, são capazes de se adaptarem às situações mais difíceis.
Mais doenças E, claro, o ser humano também sofre com todos estes problemas. Questões como a desertificação de certas zonas, a poluição do ar e a falta de meios de subsistência – água potável, terrenos de cultivo, etc. – acabam por ter um impacto na saúde do homem que, a um ritmo cada vez mais acelerado, tem de se habituar às alterações no planeta.
De acordo com um relatório do IPCC, o aumento das ondas de calor poderá fazer crescer o número de casos de doenças vetoriais, como a malária e o dengue, que irão espalhar-se para outras áreas geográficas onde é pouco comum detetarem-se estas doenças.
Segundo um artigo publicado na Harvard Business Review, na semana passada, casos de doenças crónicas, como a asma, também deverão aumentar. Os especialistas acreditam que o número de pessoas com problemas psiquiátricos, como a depressão, também deverá crescer.
E mesmo sem contar com estes efeitos na saúde dos seres humanos, o cenário continua a ser negro: como irá o homem viver sem água, sem animais à sua volta, sem solos para plantar e sem terra para habitar?