De como o Diabo denunciou os contra-revolucionários


Sempre atento, Mefistófeles, mesmo em tempos de crise energética, acode à chamada de mais uma líder política em dificuldades.


Este Agosto não está fácil para quem prega a revolução contra o poder, ainda pior nos casos em que se fazem as malas em direcção ao poder. Olhando descoroçoada para a conferência de imprensa permanente protagonizada por estes dias pelos três Estados em conflito (motoristas-Antram-Governo), Catarina Martins não resiste a um desabafo:

Catarina – Isto está bonito está, a CGTP a fazer acordos com o patronato abençoados pelo Governo. Voltámos às corporações. É o Diabo!

Diabo – Chamaste, Catarina?

C – Caramba, que rapidez. Bem me parecia que andavas por perto e estavas metido nisto.

D – Não tenho nada a ver com os traidores de classe que se revelam na primeira oportunidade. Limitei-me a responder à tua chamada. Já que cá estou, não me queres ajudar a compor o elenco do próximo Governo? Anda tudo muito distraído com as idas às bombas de gasolina e não tarda nada é preciso montar o xxii constitucional.

C – Tens razão. Mas o Bloco não vai para o Governo para ajudar a reacção. Não somos o Podemos. No Governo, só com o controlo das pastas chave.

D – Também me parecia. Soube agora da última remodelação governamental feita na Venezuela pelo teu camarada Maduro. Passou a haver um Ministério da Agricultura Urbana. O que achas, não queres vir a ser a ministra responsável pela reforma agrária na Damaia?

C – Nem pensar. Temos de ter o Ministério das Finanças.

D – E quem é que tens pensado para tão nobre tarefa?

C – O Louçã não pensa noutra coisa. E como já está no conselho consultivo do Banco de Portugal, já tem os números de telefone que fazem falta. Tenho de ver se ainda é favor da saída do euro.

D – Parece-me bem. E que mais queres?

C – Há que reconquistar a soberania. Temos de garantir o Ministério dos Negócios Estrangeiros para fazer o PortExit.

D – Esse PortExit é o que vai para ministro?

C – Não estás a perceber nada. É preciso ameaçar com o PortExit – a saída de Portugal da União Europeia – para que Bruxelas deixe de ser o covil da ditadura burguesa. E se não nos derem ouvidos vamo-nos embora.

D – É uma boa ideia, o método tem dado boas provas no caso do Reino Unido. E quem será o ministro?

C – O Luís Fazenda. Irá dizer aos eurocratas sempre a mesma coisa e em português, não há qualquer perigo de fraquejar nas negociações.

D – Mais algum?

C – Claro: temos de mandar na Defesa, é imprescindível retomar o controlo político das forças armadas. Acabar com a profissionalização e os perigos do pretorianismo. E abandonaremos a NATO antes do Natal: há que combater o imperialismo e fomentar o desarmamento e a dissolução dos blocos político-militares. Vão as Mortáguas em horário de 35 horas vezes duas.

D – Queres ressuscitar o serviço militar obrigatório?

C – Sim, mas só para os desempregados. Assim não precisamos de ocupar o Trabalho e a Segurança Social: para o que por lá se faz, podem continuar nas mãos do PS.

D – Já são três ministérios…

C – Precisamos pelo menos de quatro. Queremos a Administração Interna, há muito a fazer para termos umas forças policiais e de segurança progressistas. E é preciso acabar com o controlo de pessoas e mercadorias nas fronteiras, são práticas retrógradas que dificultam a circulação das ideias progressistas e fomentam a manipulação do lumpenproletariado. Vai o Rosas, depois de uma sessão de autocrítica.

D – E já sabes com que partido vais para o Governo?

C – Com o PS, claro.

D – Não sei que te diga. Tenho falado com o António Costa e não me parece nada que esteja para aí virado.

C – Reaccionário!

Escreve à sexta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990