A TAP está mesmo em guerra com as redes sociais. Depois de ter emitido um comunicado a pedir aos seus colaboradores que tivessem cuidado com a forma como se expressavam na Internet em relação aos problemas que estão a acontecer nos A330-neo, o i sabe que, depois de reuniões com departamentos da companhia aérea, houve quem apagasse os testemunhos publicados nas redes sociais e passasse a ter mais cuidado com o que escrevia nestas plataformas.
Na última edição, o semanário SOL revelou o testemunho de uma hospedeira que se sentiu mal num destes aviões novos, durante um voo de Lisboa para Toronto. No texto, partilhado através das redes sociais, a jovem revela que começou a entrar em pânico ao sentir dificuldades em respirar: “Ontem fiquei sem conseguir respirar no crew rest [local onde a tripulação descansa], o que me levou a ter um ataque de pânico a bordo que, felizmente, eu acabei por conseguir controla”.
A funcionária da TAP disse que sentiu “náuseas, tonturas, sensação de desmaio, respiração muito dificultada, como se o ar estivesse cheio de grão e não houvesse ar limpo para eu respirar”. “Tive muitas dificuldades em subir as escadas do crew rest. Estava sozinha, fui a última a sair – por favor saiam sempre acompanhados, nunca vão para o crew rest sozinhos, nem fiquem lá sozinhos. Isto trata-se de segundos! Não estava a conseguir destrancar a porta do crew rest (provavelmente por estar desnorteada e fraca) e mais uns segundos poderia ter caído ali e estaria sozinha”, alertou.
“[Durante o voo] Pedi para me administrarem oxigénio e açúcar. Estabilizei ao fim de algum tempo (não tenho noção de quanto), mas até hoje de manhã [no dia seguinte] sentia-me bastante exausta, confusa, apática e com alguma dificuldade em respirar, apesar de estar controlado (respirava e ainda respiro ‘às prestações’ como se o ar não passasse bem nas minhas vias respiratórias)”, escreveu a hospedeira de bordo.
No final do seu testemunho, a jovem frisou que o “importante é a passagem de informação sem medos, é a partilha das nossas experiências, principalmente as que prejudicam a nossa saúde, que é o bem mais valioso que temos. Reportem sempre! Façam análises por fora! Façam-se ouvir! Não somos ratos de laboratório!”.
O segundo texto Mas esta partilha “sem medos” deu lugar a um texto de esclarecimento, no qual a mesma funcionária se retratou. Este texto, a que o i teve acesso, foi publicado depois de a hospedeira ter sido, como a própria descreve, chamada por um departamento da TAP para falar sobre o que tinha escrito nas redes sociais.
“Após reunião com o departamento de segurança de voo, venho por este meio informar-vos que o incidente do qual fiz parte no passado dia 2, no CS-TUB, deveu-se a uma falha técnica, que poderia ter acontecido em qualquer outro avião, fosse ele neo ou não. Como todos nós sabemos, nestas questões existem sempre vários fatores que contribuem para o incidente, este caso não é exceção a esse facto, porém, o fator base é o mencionado acima. Sim, aconteceu num avião neo, facto inegável, e sim existe de facto um problema com estes aviões, algo que é inegável também e que está a ser estudado (vi para crer)”, escreve a hospedeira da TAP no segundo texto.
A funcionária da companhia aérea garante que tudo o que descreveu na publicação anterior é verdade. “[O post serviu] para além de me aliviar através da partilha com os meus pares, para vos informar do que se passou de forma a que no caso de acontecer algo igual ou semelhante, seja num avião neo ou não, consigam estar mais conscientes e alerta do que eu estive. Nada mais”.
Nesta publicação, a hospedeira da TAP diz que, “para que não hajam confusões futuras”, decidiu apagar o primeiro post, terminando o texto com o mesmo alerta: “Reportem tudo, façam-se ouvir junto dos vários departamentos (é o que tenho tentado fazer desde este incidente e tenho conseguido) para esclarecerem, dentro do que é possível, esta problemática dos aviões neo, e principalmente tenham cuidado com a vossa saúde, não desvalorizem nenhum sintoma”.
O i contactou o SNPVAC para obter um comentário em relação a este assunto, mas, até ao fecho desta edição, não obteve resposta.
Nota interna A TAP tem tido especial atenção ao que os seus colaboradores publicam nas redes sociais: depois de o semanário SOL ter noticiado que os pilotos da companhia aérea estavam a aterrar com máscaras colocadas, a transportadora emitiu um comunicado interno no qual apela ao pessoal de voo para não publicar nas redes sociais o que se passa dentro dos aviões.
“A notícia do Jornal SOL da passada sexta-feira [deve ler-se sábado], edição 675 de 3 de agosto de 2019, veio expor alguns perigos que decorrem da utilização das redes sociais, dos riscos que se assumem pela disseminação de informação sensível, da responsabilidade que a todos deve assistir aquando da sua utilização e da forma como a informação pode ser descontextualizada”, refere a nota, divulgada pelo mesmo jornal.
“O Regulamento das Operações de Voo (ROV) define claramente alguns princípios a observar no particular da captação e utilização de imagens, a saber, ‘No entanto, não é permitido a captação de imagens de tripulantes ou passageiros, salvo com expressa autorização dos envolvidos. Neste contexto, durante o PSV e quanto ao serviço da empresa, os tripulantes não se devem envolver neste tipo de atividades lúdicas e de lazer, exceto em situações de caráter extraordinário e devidamente justificadas. Devem ainda abster-se de publicar ou partilhar publicamente fotografias ou filmagens que possam de alguma forma afetar a imagem ou credibilidade da TAP Air Portugal ou dos seus colaboradores. Na dúvida, deve ser obtida a necessária autorização junto das Chefias diretas’”, refere a nota, que data de 7 de agosto.
Mistério dos enjoos continua A verdade é que, apesar de tudo isto, o problema dos enjoos continua e ninguém sabe explicar porquê. Desde fevereiro que foram detetados dezenas de casos, mas a sua origem permanece desconhecida. Perante esta situação, o Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) já tinha dito ao i que iria começar a fazer os seus testes médicos para apurar o que se estava a passar.
“Resolvemos fazer por nós – e temos autorização da TAP – os testes. Temos uma entidade certificada, que tem tudo para que seja possível realizar análises ao sangue e urina e depois uma oximetria [exame que serve para medir a saturação do oxigénio do sangue], para tentar perceber o que é que se passa. Alguns exames vão ser feitos em agosto e outros em setembro”, disse na altura Luciana Passo, presidente do SNPVAC.