Silly season (I). A política à vela


“Quando se navega sem destino, nenhum vento é favorável”, Séneca


Estamos no verão, a silly season, e proponho uma viagem por mar. E essa viagem pode ser mesmo uma metáfora da vida.

Uns escolhem o barco a motor, traçam o rumo certo e por aí vão, sem grandes desvios.

Outros preferem a vela. Definem também um destino, mas aceitam a aventura das mudanças do vento e vão acertando o rumo ao sabor dos elementos.

E depois há aqueles que, não tendo um destino final, navegam ao sabor das ondas e atracam em cada porto que consideram seguro.

Uma boa parte da nossa classe política parece dedicar-se a esta última forma de viajar.

Vem isto a propósito do caricato caso das golas antifumo, distribuídas à população pela Autoridade de Proteção Civil no âmbito do programa Aldeia Segura, Pessoas Seguras, que são feitas de material inflamável e não têm qualquer eficácia no que respeita à inalação de fumo, uma vez que não têm tratamento anticarbonização.

Pois bem. O caso foi denunciado pela comunicação social e mereceu, de imediato, do ministro da Administração Interna, uma crítica áspera. Tratava-se, segundo ele, de uma notícia “irresponsável e alarmista”.

Visivelmente irritado, o ministro apontou mesmo para a bola-de-vento do microfone de um jornalista, dizendo que também era inflamável.

Os responsáveis da Proteção Civil, que compraram e distribuíram o kit onde se encontravam as tais golas, tentaram, sem sucesso, navegar à bolina, meteram os pés pelas mãos, querendo justificar o injustificável. Segundo eles, os equipamentos não passam de um “estímulo à implementação local dos programas” e não são um “equipamento de proteção individual”.

Depois soube-se que a empresa selecionada para vender os kits tinha sido criada em finais de 2017, dois meses após a criação do programa Aldeia Segura, dedicava-se a turismo da natureza e pertencia ao marido de uma autarca ligada ao PS.

Quanto ao preço, as golas terão custado o dobro do praticado no mercado.

Com tanta trapalhada, o ministro decide agora mandar abrir um “inquérito urgente”.

E segue-se também um dos grandes desportos nacionais, o passa-culpas. O secretário de Estado da Proteção Civil já veio a terreiro dizer que a responsabilidade não é dele, mas da Proteção Civil que ele próprio tutela. (O adjunto demitiu-se segunda-feira.)

O que dizer de tudo isto?

Voltando ao início desta crónica, aí temos a política à vela, ao sabor do vento das notícias. Primeiro, os jornalistas são “irresponsáveis e alarmistas”, depois abre-se um “inquérito urgente” por causa de um acontecimento revelado exatamente pelos mesmos jornalistas “irresponsáveis e alarmistas”.

Quem é então “irresponsável” e mais “inflamável” do que as golas da polémica?

Não resisto a reproduzir uma piada que o jornalista Márcio Candoso escreveu recentemente.

“Sabem como é que o Governo está a colaborar no combate aos incêndios? Sacudindo a água do capote!”

Jornalista