Os supermercados podem ficar vazios – carne, peixe, legumes e fruta serão os produtos essenciais que podem faltar logo nas primeiras 24 horas – e a corrida aos postos de combustíveis é um cenário que está perto de voltar a acontecer. E nem a indústria têxtil ou de construção civil vão escapar. O alerta é dado pelo Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM) e pelo Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) relativamente à greve agendada para o próximo dia 12 de agosto.
As negociações com a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM) não têm sido pacíficas e parece que desta vez os motoristas perderam a paciência com o impasse da celebração de um acordo coletivo de trabalho favorável às duas partes. Pararam as negociações e vai arrancar a greve. O pré-aviso já foi entregue e, a dois meses das eleições legislativas, a paralisação vai afetar mais serviços do que em abril deste ano.
Ao i, Anacleto Rodrigues, presidente do Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM), garantiu que, “uma vez que são dois sindicatos a convocar a greve, será abrangida toda a tipologia de transportes e todos os tipos de mercadorias podem ser afetadas, desde o abastecimento aos supermercados, bens, serviços, até ao abastecimento à indústria”.
O Governo acredita que a greve não vai avançar e disse esperar que se encontrem soluções antes do dia 12 de agosto. Mas a verdade é que as negociações foram interrompidas e, a começar, a greve não tem fim previsto. Ou seja, a paralisação só termina quando houver acordo de ambas as partes. Questionado sobre a possibilidade de acontecer o mesmo que aconteceu em abril – terminar a greve com a promessa de iniciar negociações com os patrões e depois não haver acordo –, Anacleto confirmou que para a greve terminar não basta a palavra da ATRAM. “A greve só será desconvocada depois de haver acordos já firmados para que não haja possibilidade de depois voltarem atrás naquilo que assinaram”, explica o presidente do SIMM.
Quanto às previsões de adesão à greve, os sindicatos garantem também que, “pelas reações, a adesão vai ser grande logo nas primeiras horas”.
“Estamos a apelar ao bom senso” A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição, APED, confessa estar preocupada com a possível greve mas frisa que não se pode “alarmar os cidadãos nesta fase”.
Ao i, Gonçalo Lobo Xavier, diretor-geral da APED, garante que estão “apreensivos” mas, nesta fase, estão “a trabalhar com o Governo e com a ANTRAM e a apelar ao bom senso”. “Se esta greve for para a frente vai ter um grande impacto na economia do país”, garante. Apesar de assumir que esta greve terá impacto para todo o país, Gonçalo Lobo Xavier, defende que o setor que representa sofrerá um grande impacto. “Como temos uma característica muito específica na distribuição alimentar e no retalho especializado, naturalmente que somos bastante impactados”, disse.
Ainda assim, reforça a ideia: “A APED está a trabalhar com o Governo e com a ANTRAM no sentido de os sensibilizar para a necessidade de, pelo menos, tentar por um lado que a greve não avance e por outro que haja o cumprimento de todo o enquadramento legislativo para a greve com serviços mínimos”.
O responsável assume que estão ainda a trabalhar no sentido de sensibilizar para o “impacto negativo” desta situação, “não apenas na distribuição mas na vida dos cidadãos, sobretudo numa altura de férias, onde há o turismo. Para a imagem do país isto seria um risco”.
Do ponto de vista da prevenção, o diretor-geral da APED garantiu ao i que está a ser estudada a logística, “mas ainda é extemporâneo falar deste tipo de ações nesta fase”, que considera prematura. No entanto, assume que “é evidente que qualquer perturbação do normal funcionamento da logística tem consequências”. Nesse sentido, a associação garante estar empenhada em que a greve não vá para a frente, uma vez que “os stocks são finitos”. “Estamos num braço de ferro que vai prejudicar o país e que vai ter consequências se for para a frente”, adianta.
Gonçalo Lobo Antunes reconheceu ainda ter noção da gravidade da greve também pelo facto de os sindicatos terem assumido que “a indústria vai sofrer grandes perdas e grandes exportadoras como a Autoeuropa correm o risco de parar a laboração”.
Mas, neste caso, a Autoeuropa parece ter tudo sob controlo. “Já na altura tínhamos e ainda temos um plano de contingência que desenvolvemos para fazer face a esta situação”, garantiu ao i João Delgado, diretor de comunicação da Autoeuropa. “Esperamos que não seja posto em marcha – seria sinal de que a greve não tinha ido para a frente – mas o nosso plano de contingência permite mitigar o efeito da possível greve”, garantiu. Questionado sobre este plano, João Delgado garante que “tem essencialmente a ver com a garantia de que existem os abastecimentos necessários para que a operação não seja afetada”.
Serviços mínimos garantidos pelo pré-aviso Os dois sindicatos que convocaram a greve reúnem hoje de manhã com a ANTRAM na Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT) para chegar a acordo sobre os serviços mínimos que serão assegurados durante a próxima greve. De acordo com o documento do pré-aviso de greve a que o i teve acesso, a proposta das duas estruturas sindicais é de serviços mínimos de 25% na distribuição de combustíveis a nível nacional, sendo que o abastecimento a hospitais, centros de saúde, “estabelecimentos prisionais, bases aéreas, serviços de proteção civil, bombeiros, forças de segurança e unidades autónomas de gaseificação” está assegurado a 100%.
“Naquilo que são os serviços impreteríveis, avançámos logo com 100% dos trabalhadores. Agora, na outra parte dos combustíveis, garantimos um abastecimento de 25%, ou seja, se saíam 100 camiões por dia, agora só vão sair 25, mas são 25% para todos o país, ao contrário do que aconteceu na greve de abril, em que foram decretados pelo Governo serviços mínimos de 40%, mas só para Lisboa e Porto”, explicou Anacleto Rodrigues.
De notar que a greve acontece em pleno mês de agosto, altura em que a maioria das famílias está de férias e se desloca entre o norte e o sul do território. O objetivo não é, diz o SIMM, “afetar as férias das pessoas”, mas numa altura em que as viagens de carro se multiplicam, a corrida aos combustíveis vai ser maior.
Antram quer 70% de serviços mínimos Durante a tarde de ontem, foi avançado pelo Expresso que a proposta apresentada hoje pela ANTRAM aos sindicatos é de garantir serviços mínimos de 70%. Sobre esta possibilidade, Pedro Pardal Henriques, advogado do Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas, foi bem claro: “Se isso se verificar, obviamente não iremos aceitar”, diz ao i. O advogado do sindicato adiantou ainda que espera que “o Governo mostre claramente aos portugueses que não é conivente com essa barbaridade. Caso assim seja, estará a transmitir ao país que é um Governo aliado às empresas, e que não se preocupa com os verdadeiros problemas dos trabalhadores, fechando os olhos para as ilegalidades que se pratica neste setor”.