Começou no tempo em que muitos dos filmes ainda eram a preto-e-branco, no tempo do auge do cinema italiano e do glamour de Hollywood. Acompanhou os avanços e recuos da sétima arte, sempre com um pé dentro de cena, até decidir afastar-se das luzes da ribalta para aproveitar a reforma no aconchego do lar. Mas, como se costuma dizer, velhos são os trapos. Por isso, Sophia Loren decidiu voltar ao plateau e mostrar que, dez anos depois da sua última representação, a idade é apenas um número.
Segundo a revista Variety, Loren, de 84 anos, regressa à tela através de um trabalho realizado pelo seu filho, Edoardo Ponti. Será um remake do filme Madame Rosa – A Vida à Sua Frente (1977), uma adaptação do romance francês de 1975 La Vie devant soi, de Romain Gary.
Sophia Loren irá dar vida a Rosa, uma sobrevivente do Holocausto que deixou as ruas de Paris, onde se prostituía para ganhar a vida, e começou a tomar conta de crianças pobres. Uma delas é o argelino Momo, com quem Rosa cria uma relação especial. O filme, que na altura tinha como atriz principal a francesa Simone Signoret e como realizador o israelita Moshé Mizrahi, venceu em 1978 o Óscar para Melhor Filme Estrangeiro.
Agora, Ponti quer dar uma nova visão a esta história – segundo a revista Variety, esta adaptação será muito diferente da que chegou aos cinemas na década de 70, com o filme a ser contado do ponto de vista de Momo, e não de Rosa. A história passa-se no sul de Itália e terá várias camadas diferentes: a primeira diz respeito à relação entre o adolescente e a idosa que o acolhe; a segunda foca-se no conceito de “uma família moderna”; e a terceira no lado mais político do enredo, presente “em todas as cenas” do filme, contou o realizador à publicação norte-americana. “Nós focamo-nos nas personagens e nas emoções… Cabe ao público interpretar as questões políticas por trás da história”, acrescentou.
Uma coisa é certa: Sophia Loren já está a trabalhar e a preparar o regresso ao grande ecrã. A mesma publicação revela que as filmagens estão a decorrer em Itália e que Loren tem trabalhado dez horas por dia.
“Agora permito-me expressar certas coisas em frente às câmaras de uma forma que o público vai achar surpreendente”, disse a atriz italiana à Variety. Loren, considerada um dos ícones vivos da sétima arte, disse ainda que o filho só se contenta com nada menos do que a melhor das interpretações: “Ele conhece-me muito bem. Conhece todos os detalhes da minha cara, do meu coração, da minha alma. Ele só avança para a cena seguinte quando eu revelar a minha verdade mais pura”.
Esta é a terceira vez que Ponti dirige a mãe: “Aos 84, ela está a dar tudo para que este seja um filme profundo e desafiante, tanto a nível emocional como físico. É espantoso ver a energia e a paixão que coloca em cada cena”.
Madame Rosa – A Vida à Sua Frente, que é produzido pela empresa italiana Paloma e conta com o apoio de investidores norte-americanos, tem data de estreia prevista para março de 2020.
A Marilyn Monroe italiana
Sofia Villani Scicolone nasceu em Roma a 20 de setembro de 1934, mas passou a infância em Pozzuoli, perto de Nápoles, em casa da avó. Durante a ii Guerra Mundial, a zona onde viviam – em condições muito precárias – foi alvo de vários bombardeamentos. Durante um dos ataques, Sofia foi atingida por estilhaços enquanto fugia para um abrigo. Quando a guerra acabou, a avó de Sofia abriu uma taberna em sua casa, onde vendia licor de cereja. Romilda, mãe de Sofia, mostrava os dotes de professora de piano e animava as noites com músicas populares da altura. Sofia recolhia os pratos e copos, enquanto a irmã, Maria, acompanhava a mãe com algumas cantorias. Foi naquele pequeno espaço que Sophia começou a dar nas vistas e a mostrar alguma queda para as artes.
Aos 16 anos, dona de uma beleza inconfundível, Sofia participou no concurso Miss Itália. Não ganhou, mas foi uma das finalistas. Logo a seguir ao concurso decidiu inscrever-se em aulas de teatro e, em 1951, é escolhida para entrar no filme Quo Vadis. Tinha apenas 17 anos. No mesmo ano apareceu no filme Era lui… Si! Si!, em que dava vida a uma odalisca. Nas duas produções foi apresentada nos créditos finais como Sofia Lazzaro.
O seu primeiro papel como protagonista surgiu em 1953, no filme Aida. É nessa altura que adota o nome Sophia Loren, um nome mais fácil de pronunciar para quem não era italiano. Aida foi muito elogiado pela crítica, mas o seu salto para o estrelato só surgiu no ano seguinte, com o filme O Ouro de Nápoles, realizado pelo conceituado Vittorio De Sica.
Tinha apenas 20 anos e já era uma figura conhecida em toda a Itália. Mas ambicionava ir mais longe. O sonho tornou-se realidade em 1958, quando assina um contrato de cinco anos com a Paramount Pictures. Um dos filmes mais conhecidos que fez nessa altura foi Duas Mulheres (1961), de Vittorio De Sica. A interpretação rendeu-lhe 22 prémios internacionais, incluindo o de Melhor Atriz no Festival de Cannes e nos Óscares – Loren tornou-se a primeira atriz a conseguir este prémio com um filme falado noutra língua que não o inglês.
Durante a década de 60, altura em que era conhecida como a Marilyn Monroe italiana, Sophia Loren foi uma das atrizes mais populares e caras do mundo – chegou a receber um milhão de dólares para integrar o elenco do filme A Queda do Império Romano. Somaram-se inúmeros filmes até ao séc. xxi, altura em que começou a abrandar. A sua última aparição foi no filme Nove (2009), com Daniel Day-Lewis, Marion Cotillard, Penélope Cruz, Kate Hudson e Nicole Kidman.
Loren mostrou sempre determinação não só na sua vida profissional, mas também na pessoal. Tinha apenas 15 anos quando casou com o produtor Carlo Ponti, que na altura tinha 37. Foi o amor da sua vida – viveram juntos até à morte de Carlo, em 2007. Desde essa altura que a vida mediática foi ficando para trás, protegendo-se a atriz nas suas casa de Genebra, Roma e Nápoles. Com o apoio dos filhos – além de Edoardo, a atriz também é mãe de Carlo –, Sophia regressou às luzes da ribalta e prepara-se agora para fazer aquela que será, diz, uma das atuações mais genuínas da sua carreira.