Não sei se é por causa das águias (cada um tem a sua), mas Benfica e Estados Unidos dão-se bem. Desde 1957 até aos dias que correm, as coisas passam-se como na velhinha anedota das voltas que o cão dá antes de se deitar: volta e meia há uma visita. Agora, eis outra.
Por todo o lado do grande país da América do Norte andou o Benfica nas suas digressões: de Nova Iorque (“the city that never sleeps”, como cantava o “Old Blue Eyes” de Hoboken) a Fall River, Massachusetts; de Los Angeles, El Pueblo de Nuestra Señora la Reina de los Ángeles del Río de Porciúncula, a São Francisco da Golden Gate e dos elétricos a lembrar Lisboa; de Boston e New Bedford e Foxborough, pejadas de portugueses, a Hartford, no Connecticut; de San José, cidade gémea do Funchal, a Providence e Pawtucket, Rhode Island; de Newark (do Ironbound) à minúscula e suburbana Secaucus, terra das cobras.
Em agosto de 1957, a águia vermelha voou pela primeira vez para os States.
Nenhum resultado poderia ser mais redondo: 10-0. Como nos filmes! O adversário, pomposo, denominou-se seleção da Nova Inglaterra. Pois bem, Nova Inglaterra não é um estado, é uma região que inclui os estados do Connecticut, Maine, Massachusetts, New Hampshire, Rhode Island e Vermont. Enfim, tanto estado e tão pouco futebol, admiraram-se os portugueses nesse primeiro confronto.
A coisa foi de tal modo redonda e arredondada que, acabando aos dez, também mudou aos cinco como nas peladinhas de escola da saudosa infância: isto é, 5-0 ao intervalo.
Leia-se a crónica da época: “Os Americanos teimam em não levar a sério o desporto que na América do Sul e na Europa mais apaixona as multidões. É possível que as periódicas visitas de equipas de reconhecida categoria – e o Benfica é uma delas – contribuam para que, embora lentamente, venham a fazer com que se interessem a fundo pela prática do futebol. Será então, se assim suceder, um caso sério…”
Os norte-americanos já tinham tido a oportunidade de ver entre eles o famoso Vasco da Gama, do Brasil, e algumas das mais conhecidas equipas inglesas, mas um conjunto lusitano era inédito.
Os encarnados disputavam em Fall River e Nova Iorque os dois encontros derradeiros de uma digressão de mais de um mês (de 4 de julho a 12 de agosto) que os levara ao Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Santos e São Paulo. Composto por amadores, muitos deles da grande comunidade portuguesa da região, o adversário do Benfica foi imolado como um cordeiro em Domingo de Páscoa. Mais de 15 mil espetadores puderam testemunhar e aplaudir a classe de Coluna, os remates de José Águas e as fintas de Salvador e de Palmeiro.
Abria-se uma nova porta para as viagens do Benfica, que eram muitas e seriam cada vez mais, alicerçadas nos êxitos europeus dos anos 60. Em Fall River assinalava-se o 76.o encontro benfiquista fora do território português. Depois da presença em África e na América do Sul, inaugurava-se um novo continente. O regresso só se daria nove anos mais tarde, em agosto de 1966.
Antes do regresso a Lisboa, no voo da Pan-Am, mais uma vitória: 7-2 sobre a seleção da Liga Norte Americana, em Nova Iorque. Depois voltava o campeonato. Férias? Levava-as o vento…