Em defesa do capitalismo


O capitalismo per se não vai resolver a desigualdade. Nunca haverá um sistema que o faça. Como todos os outros, o capitalismo tende a despojar aqueles que estão no estrato mais baixo.


Os extremos andam a disfarçar as suas origens ideológicas genocidas e totalitárias através da defesa de causas cujos regimes que defendem não teriam qualquer tipo de pudor em enviar para o gulag mais próximo. À esquerda, onde é que se viu Estaline ou Trotsky a defender os homossexuais, os negros ou os ciganos? Ninguém é mais prolífico nesta adaptação do marxismo-leninismo que o BE que, por sinal, dedicou uma semana bem passada a substituir a palavra “classe” por “minoria” ao longo de todo o Manifesto do Partido Comunista.

Todos os dias somos bombardeados com brocardos como “o capitalismo transforma toda a gente em números”, “o capitalismo é a opressão dos trabalhadores”, ou “o capitalismo é a escravatura do séc. xxi”. Tudo isto, claro, escrito no Twitter com um iPhone. Vamos, por isso, desmontar as patranhas argumentativas dos extremistas. É esse o dever de partidos liberais como o Aliança.

1. Hierarquia No Crédit Suisse Global Wealth Report 2018 encontrei a seguinte estatística: 50% da população mundial com menores rendimentos detém apenas 1% de toda a riqueza, enquanto os 10% mais ricos detêm 85%. Contudo, dizer que isto é culpa do capitalismo é escamotear a essência do problema: é que esta é a tendência de toda e qualquer atividade produtiva. Isto decorre do chamado Princípio de Pareto.

Há vários exemplos disto em todo e qualquer universo estatístico. O mais famoso é o caso que diz que “80% das receitas vêm de 20% dos clientes”. Para tornar isto mais digerível, vamos usar uma variante: a Lei de Price. Ela diz-nos que a raiz quadrada do número de agentes a desenvolver determinada atividade produz metade dos resultados. Por exemplo, numa equipa de futebol, em média três jogadores (a raiz quadrada arredondada de 11) fazem 50% dos desarmes – esses jogadores são, invariavelmente, todos defesas. Este tipo de ocorrência precede a existência do capitalismo em milhões de anos e pode ser visto na arte, na música, na biologia, na massa das estrelas e até nas visualizações do YouTube.

Todas as hierarquias tendem a despojar os menos aptos, ou então não seriam hierarquias. No reino animal, os lobos têm alfas e betas. Também na acumulação de riqueza isso se verifica, não por vantagem biológica, mas muitas vezes por vantagem hereditária: é mais fácil fazer 1M€ tendo 20M€ herdados do que tendo zero. Isso é um problema e a solução para ele não é óbvia. Contudo, essa desigualdade não é uma crítica que possa ser atribuída exclusivamente ao capitalismo, mas a toda e qualquer estrutura hierárquica incluindo, imagine-se, ao reino animal ou ao comunismo que, em crueldade, não são assim tão distintos. O capitalismo não é melhor que os outros sistemas por reduzir a desigualdade. Ele é melhor por ser o único que, a par da desigualdade, simultaneamente produz riqueza. Todos os outros (fascismo, nazismo, comunismo, feudalismo) só produzem desigualdade.

2. Lucro é crime do lucro Marx e os seus minions não têm qualquer tipo de pudor em identificar o lucro como um roubo. Para se ter lucro é necessário trazer alguma utilidade à sociedade em geral ou, pelo menos, em particular, ou então por definição o negócio fale. Não há nada mais justo: os capitalistas competem entre si para conseguirem produzir um produto melhor que o seu competidor de modo a maximizar o seu retorno no investimento.

O lucro é o prémio por fornecer de forma eficiente e eficaz um bem ou um serviço procurado. Se “criminalizarmos” a busca do lucro, qual o incentivo para desenvolver qualquer tipo de atividade? Os glosadores do capitalismo olham para os capitalistas como um cartoon dos anos 20, i.e., repousando os pés na secretária enquanto fumam um charuto. Na realidade, isto está muito mais próximo de Chávez, Fidel e Maduro que de um gestor empresarial. Esse é, invariavelmente, um completo workaholic. Já os capitalistas (acionistas) não são, nem têm de ser recompensados pelo seu trabalho, mas sim pelo risco! E qual é o risco? É perderem parte ou todo o dinheiro que investiram. Como o risco é maior, o retorno tem de ser mais elevado.

3. Produção de bens e serviços Não há nem houve até hoje qualquer outra forma de organização social que tenha produzido tanto bens e serviços em excesso para tão vasto número de pessoas como o capitalismo. E não, não sou só eu que o digo: Marx e Engels também.

Até à Revolução Industrial, a história da humanidade não era de opressão, como hoje nos tentam vender, ou, a ser, não era dos ricos sobre os pobres, ou dos homens sobre as mulheres. Atenção: com isto não digo que não houve opressão. Sempre houve e sempre haverá. O que eu digo é que a opressão não é o fio condutor da História. E, a ser, a maior opressão que sempre atormentou o homem foi a da natureza. Pestes, terramotos, falta de alimentação, saneamento e habitação, a lista continua.

Nos UN Millennium Development Goals ficou definido que um dos goals era reduzir a pobreza mundial (definida como ganhar menos que $1,25/dia) em 50% no período entre 1990 e 2015. Isto foi conseguido em 2012. Os cínicos dirão que a barra estava baixa, mas o mesmo acontece para as curvas de $3,60 e $7,20/dia. O que isto quer dizer é que os ricos estão a ficar mais ricos, mas os pobres também estão a ficar mais ricos. A desigualdade entre o mais rico e o mais pobre é irrelevante. O que é relevante é: será que o mais pobre está a ficar mais rico? O património do mais abonado é inócuo nesta discussão. Não é ele que tem a competência de colmatar a disparidade. Essa competência é do Estado.

Resumidamente, o capitalismo per se não vai resolver a desigualdade. Nunca haverá um sistema que o faça. Como todos os outros, o capitalismo tende a despojar aqueles que estão no estrato mais baixo. A solução para esse problema não é fácil nem óbvia – os regimes comunistas nunca resolveram essa diferença, pelo contrário, exponenciaram-na. Porém, o problema não pode ser considerado culpa do capitalismo. É muito mais pernicioso do que isso. Enquanto houver diferenças entre quaisquer agentes de quaisquer sociedades haverá desigualdades, porque é impossível construir um sistema burocrático que promova igualdade de resultados de todos os agentes. Não só é impossível como não é desejável porque, nesse dia, deixará de haver mérito. O nosso objetivo máximo deve ser a igualdade de oportunidades – é aí que o Estado entra para munir os cronicamente despojados dos instrumentos para ascenderem na vida e saírem da sua condição. O capitalismo é, sim, o método mais eficiente até hoje encontrado de erradicar a pobreza, a fome e a doença, porque gera riqueza para o Estado apoiar, através dos impostos recebidos, as necessidades dos mais carenciados. Desde que dentro da legalidade, ao deixarmos que cada um persiga egoisticamente os seus próprios objetivos estamos a melhorar a vida de todos, e quem ainda não percebeu isso, então não sabe mesmo nada de História.

Analista de mercados, membro do gabinete de estudos do Aliança 

Em defesa do capitalismo


O capitalismo per se não vai resolver a desigualdade. Nunca haverá um sistema que o faça. Como todos os outros, o capitalismo tende a despojar aqueles que estão no estrato mais baixo.


Os extremos andam a disfarçar as suas origens ideológicas genocidas e totalitárias através da defesa de causas cujos regimes que defendem não teriam qualquer tipo de pudor em enviar para o gulag mais próximo. À esquerda, onde é que se viu Estaline ou Trotsky a defender os homossexuais, os negros ou os ciganos? Ninguém é mais prolífico nesta adaptação do marxismo-leninismo que o BE que, por sinal, dedicou uma semana bem passada a substituir a palavra “classe” por “minoria” ao longo de todo o Manifesto do Partido Comunista.

Todos os dias somos bombardeados com brocardos como “o capitalismo transforma toda a gente em números”, “o capitalismo é a opressão dos trabalhadores”, ou “o capitalismo é a escravatura do séc. xxi”. Tudo isto, claro, escrito no Twitter com um iPhone. Vamos, por isso, desmontar as patranhas argumentativas dos extremistas. É esse o dever de partidos liberais como o Aliança.

1. Hierarquia No Crédit Suisse Global Wealth Report 2018 encontrei a seguinte estatística: 50% da população mundial com menores rendimentos detém apenas 1% de toda a riqueza, enquanto os 10% mais ricos detêm 85%. Contudo, dizer que isto é culpa do capitalismo é escamotear a essência do problema: é que esta é a tendência de toda e qualquer atividade produtiva. Isto decorre do chamado Princípio de Pareto.

Há vários exemplos disto em todo e qualquer universo estatístico. O mais famoso é o caso que diz que “80% das receitas vêm de 20% dos clientes”. Para tornar isto mais digerível, vamos usar uma variante: a Lei de Price. Ela diz-nos que a raiz quadrada do número de agentes a desenvolver determinada atividade produz metade dos resultados. Por exemplo, numa equipa de futebol, em média três jogadores (a raiz quadrada arredondada de 11) fazem 50% dos desarmes – esses jogadores são, invariavelmente, todos defesas. Este tipo de ocorrência precede a existência do capitalismo em milhões de anos e pode ser visto na arte, na música, na biologia, na massa das estrelas e até nas visualizações do YouTube.

Todas as hierarquias tendem a despojar os menos aptos, ou então não seriam hierarquias. No reino animal, os lobos têm alfas e betas. Também na acumulação de riqueza isso se verifica, não por vantagem biológica, mas muitas vezes por vantagem hereditária: é mais fácil fazer 1M€ tendo 20M€ herdados do que tendo zero. Isso é um problema e a solução para ele não é óbvia. Contudo, essa desigualdade não é uma crítica que possa ser atribuída exclusivamente ao capitalismo, mas a toda e qualquer estrutura hierárquica incluindo, imagine-se, ao reino animal ou ao comunismo que, em crueldade, não são assim tão distintos. O capitalismo não é melhor que os outros sistemas por reduzir a desigualdade. Ele é melhor por ser o único que, a par da desigualdade, simultaneamente produz riqueza. Todos os outros (fascismo, nazismo, comunismo, feudalismo) só produzem desigualdade.

2. Lucro é crime do lucro Marx e os seus minions não têm qualquer tipo de pudor em identificar o lucro como um roubo. Para se ter lucro é necessário trazer alguma utilidade à sociedade em geral ou, pelo menos, em particular, ou então por definição o negócio fale. Não há nada mais justo: os capitalistas competem entre si para conseguirem produzir um produto melhor que o seu competidor de modo a maximizar o seu retorno no investimento.

O lucro é o prémio por fornecer de forma eficiente e eficaz um bem ou um serviço procurado. Se “criminalizarmos” a busca do lucro, qual o incentivo para desenvolver qualquer tipo de atividade? Os glosadores do capitalismo olham para os capitalistas como um cartoon dos anos 20, i.e., repousando os pés na secretária enquanto fumam um charuto. Na realidade, isto está muito mais próximo de Chávez, Fidel e Maduro que de um gestor empresarial. Esse é, invariavelmente, um completo workaholic. Já os capitalistas (acionistas) não são, nem têm de ser recompensados pelo seu trabalho, mas sim pelo risco! E qual é o risco? É perderem parte ou todo o dinheiro que investiram. Como o risco é maior, o retorno tem de ser mais elevado.

3. Produção de bens e serviços Não há nem houve até hoje qualquer outra forma de organização social que tenha produzido tanto bens e serviços em excesso para tão vasto número de pessoas como o capitalismo. E não, não sou só eu que o digo: Marx e Engels também.

Até à Revolução Industrial, a história da humanidade não era de opressão, como hoje nos tentam vender, ou, a ser, não era dos ricos sobre os pobres, ou dos homens sobre as mulheres. Atenção: com isto não digo que não houve opressão. Sempre houve e sempre haverá. O que eu digo é que a opressão não é o fio condutor da História. E, a ser, a maior opressão que sempre atormentou o homem foi a da natureza. Pestes, terramotos, falta de alimentação, saneamento e habitação, a lista continua.

Nos UN Millennium Development Goals ficou definido que um dos goals era reduzir a pobreza mundial (definida como ganhar menos que $1,25/dia) em 50% no período entre 1990 e 2015. Isto foi conseguido em 2012. Os cínicos dirão que a barra estava baixa, mas o mesmo acontece para as curvas de $3,60 e $7,20/dia. O que isto quer dizer é que os ricos estão a ficar mais ricos, mas os pobres também estão a ficar mais ricos. A desigualdade entre o mais rico e o mais pobre é irrelevante. O que é relevante é: será que o mais pobre está a ficar mais rico? O património do mais abonado é inócuo nesta discussão. Não é ele que tem a competência de colmatar a disparidade. Essa competência é do Estado.

Resumidamente, o capitalismo per se não vai resolver a desigualdade. Nunca haverá um sistema que o faça. Como todos os outros, o capitalismo tende a despojar aqueles que estão no estrato mais baixo. A solução para esse problema não é fácil nem óbvia – os regimes comunistas nunca resolveram essa diferença, pelo contrário, exponenciaram-na. Porém, o problema não pode ser considerado culpa do capitalismo. É muito mais pernicioso do que isso. Enquanto houver diferenças entre quaisquer agentes de quaisquer sociedades haverá desigualdades, porque é impossível construir um sistema burocrático que promova igualdade de resultados de todos os agentes. Não só é impossível como não é desejável porque, nesse dia, deixará de haver mérito. O nosso objetivo máximo deve ser a igualdade de oportunidades – é aí que o Estado entra para munir os cronicamente despojados dos instrumentos para ascenderem na vida e saírem da sua condição. O capitalismo é, sim, o método mais eficiente até hoje encontrado de erradicar a pobreza, a fome e a doença, porque gera riqueza para o Estado apoiar, através dos impostos recebidos, as necessidades dos mais carenciados. Desde que dentro da legalidade, ao deixarmos que cada um persiga egoisticamente os seus próprios objetivos estamos a melhorar a vida de todos, e quem ainda não percebeu isso, então não sabe mesmo nada de História.

Analista de mercados, membro do gabinete de estudos do Aliança