Trumplomacia


A indiferença e a falta de respeito para com representantes de Estados soberanos são apenas fruto da sua incapacidade de ocupar o cargo de Presidente da maior potência do mundo.


Os média e, sobretudo, a classe humorista dos EUA regozijam-se com a inesgotável fonte de matéria produzida por Trump e seus pares.

Os episódios repetem-se a um ritmo alucinante e só pecam por excesso. À medida que nos aproximamos das eleições parecem ganhar um efeito multiplicador absurdo e que demonstra uma coisa: desorientação.

Trump não tem tido mãos a medir e, a cada dia que passa, a sua megalomania, arrogância, falta de educação e alienação crescem desmesuradamente.

Os episódios do filho, da filha ou do genro, assim como o muro e os incessantes ataques que desfere no Twitter, são peanuts comparados com o que fez agora com o embaixador do Reino Unido em Washington e com a (ainda) primeira-ministra britânica.

A indiferença e a falta de respeito para com representantes de Estados soberanos e instituições são apenas fruto da sua incapacidade de ocupar o cargo de Presidente da maior potência do mundo. Mas quem estudou relações internacionais arrisca-se a ver inscrita nos manuais de diplomacia uma nova corrente – a trumplomacia.

Trump é um homem deslocado da realidade e totalmente impreparado para liderar a diplomacia de uma potência como os EUA.

E o que está na base deste episódio? As confissões legítimas e, perdoem-me, totalmente acertadas de Kim Darroch, embaixador britânico nos Estados Unidos. Limitou-se, num quadro restrito e totalmente legítimo, a informar Londres da sua perceção sobre a administração Trump.

Descreveu o Presidente e a sua administração como “ineptos” e “excecionalmente disfuncionais”. Fê-lo em documentos diplomáticos que, para não variar, vieram a público e foram revelados este domingo pela imprensa.

E alegadamente, de acordo com o Guardian, acrescentou: “Nós realmente não acreditamos que esta administração se torne substancialmente mais normal, menos disfuncional, menos imprevisível, menos facciosa, menos desastrada e inepta diplomaticamente”.

Kim Darroch que, sublinhe-se, é um dos diplomatas britânicos mais experientes, ocupou o cargo em Washington em janeiro de 2016, tendo oportunidade de acompanhar de perto o fim da administração Obama e quase três anos de administração Trump. Parece-me aceitável que conclua, como alegadamente concluiu, que a Presidência de Trump podia “terminar em desgraça”, descrevendo o Presidente como “inseguro” e “incompetente”.

Confirmou o que transparece, que “as lutas internas e o caos” dentro da Casa Branca são “em grande parte verdadeiros”, embora se defenda insistentemente a teoria de “notícias falsas”.

Num dos documentos mais recentes, o embaixador britânico nos EUA opina sobre aquilo que é a sua área de intervenção – a política externa.

Sem rodeios, classifica a política externa de Trump com o Irão de “incoerente” e “caótica”, assim como questionou ainda a veracidade das declarações de Donald Trump que tinha ordenado um ataque ao Irão, mas que o cancelara porque iria matar 150 iranianos.

Não vejo qualquer incoerência nas apreciações de Darroch e, se juntarmos mais alguns episódios a que assistimos em torno das iniciativas diplomáticas de Trump, a única conclusão possível é que são totalmente assertivas.

Vivemos um período de grande instabilidade e de incerteza, agravadas pelas inúmeras frentes abertas pela Casa Branca. Da China ao México, do Irão ao Reino Unido, Trump gere a sua agenda diplomática como se estivesse no reality show The Apprentice.

Põe e dispõe da sua posição para desconsiderar, insultar e decidir sobre os destinos do planeta como se de um programa de entretenimento se tratasse.

Estamos a pouco mais de um ano da 59.a eleição do Presidente dos EUA e as minhas esperanças são que, até lá, não aconteça nenhum episódio de consequências catastróficas e que o eleitorado americano se consciencialize da necessidade de mudança.

 

Escreve à quinta-feira