Depois de eliminar o Uruguai e de se qualificar para as meias-finais da Copa América, indo agora lutar com o Chile por um lugar na final do Maracanã, na próxima quinta-feira, o Peru ganhou o direito de se transformar na coqueluche de uma competição na qual conquistou dois terceiros lugares consecutivos, em 2011 e 2015, somando dois títulos em 1939 e 1975.
É precisamente do período entre 1970 e 1975 que os adeptos peruanos mais se orgulham quando falam da sua seleção. A presença no Mundial do México marcou um dos momentos extraordinários do futebol do país graças ao empate (2-2) conseguido em La Bombonera, em Buenos Aires, no dia 31 de agosto de 1969, que qualificou os peruanos e deixou a Argentina de fora da fase final. Houve quem não quisesse ver mais longe do que a ponta do nariz: apenas um momento sem regresso. Pelo contrário: seria o início de cinco anos dourados para o país do ouro inca de Atahualpa que caiu sob o aço de Toledo das espadas dos espanhóis, que vinham decididos a conquistar o sol.
Treinados pelo brasileiro Didi, campeão do Mundo em 1958, que vestiu a camisola do Real Madrid, os peruanos iniciaram o Mundial mexicano de coração nas mãos por via do tremendo terramoto que arrasou grande parte do norte do país. A minutos da estreia frente à Bulgária, Didi entrou no balneário com um punhado de terra na mão: “Esta é a terra da vossa pátria, beijem-na e respeitem-na!” A mensagem mexeu de tal ordem com os jogadores que estes recuperaram de uma desvantagem de 0-2 para uma vitória por 3-2. O mundo aprendia a soletrar os nomes de Roberto Chale, de Chumpitaz, de Teofilo Cubillas, de Sotil, de Gallardo.
O seu futebol era ofensivo e imaginativo. Três-zero a Marrocos e o apuramento para a fase eliminatória no bolso. Nunca tal tinha acontecido. Depois, a Alemanha Ocidental de Müller e Beckenbauer (1-3), e o incomparável Brasil de Pelé e Tostão, Jairzinho, Rivelino, Gerson, Carlos Alberto, Clodoaldo e tutti quanti (2-4) foram fortes demais para um conjunto ao qual faltava o calo da experiência.
Mais glória
A glória não acabava aí, nos estádios ferventes de um México que ainda hoje se orgulha de ter sido palco do campeonato do Mundo mais espetacular de todos os tempos. O Peru contribuíra fortemente para tal com o seu estilo elegante e sem medos.
Falhado o Mundial de 1974, o novo técnico, Marcos Calderón, recrutou outras estrelas e refrescou o conjunto. Era a vez de Díaz, Oblitas, Meléndez, Sartor e Soria. Os participantes na Copa América de 1975 tinham sido divididos em três grupos de três equipas. Os três primeiros qualificavam-se para as meias-finais, nas quais já havia um lugar reservado: para o Uruguai, vencedor da edição anterior. Jogos casa e fora.
O Peru começou fora: empate em Santiago (1-1) face ao Chile, vitória na Bolívia (1-0). No Nacional de Lima, duas vitórias remataram a faena peruana: 3-1 sobre a Bolívia; 3-1 sobre o Chile, mais um jogo de raiva como são sempre os embates entre estes dois vizinhos com muitas contas para ajustar ao longo da História.
A primeira mão da meia-final foi no Mineirão. O Brasil já não era mais o de Pelé e Tostão. Faltava-lhe arte e talento. Mas isso não tira o valor da vitória peruana por 3-1, a primeira conseguida em território brasileiro. O Brasil podia ter perdido samba, mas não deixava de ser Brasil. Venceu em Lima por 2-0. O critério de desempate era sorteio: um pote escuro com duas bolas lá dentro. A menininha escolhida tirou a bolinha que tinha um P, de Peru.
Adversário na final: Colômbia. Primeiro jogo: Bogotá. 0-1 lá, 2-0 em Lima. Novo critério: desempate em Caracas, Venezuela. Um Peru selvagem, terrível, avassalador. Cubillas falhou um penálti na madrugada do jogo. Mas isso não alterou a alma peruana. Sotil, aos 25 minutos, fez o 1-0. Ninguém o imaginava sequer, mas foi o golo decisivo. Trinta e seis anos depois, nova vitória na Copa América, as únicas duas até hoje. Tudo começara lá no México, cinco anos antes. Nas ruas de Lima, La Fea, o povo gritava: “Peru campeón! Peru campeón!” Gargantas enrouqueciam de alegria.