Aproximamo-nos de mais uma época estival e, com ela, a apetência para ler alguns livros na calma das férias. Temas como a arquitetura e o urbanismo não colhem a preferência dos leitores, especialmente por dois motivos: quando são ricos em conteúdo são quase sempre muito técnicos e inacessíveis; quando são acessíveis (especialmente monografias, que contêm fotografias das obras de arquitetos famosos) apresentam grandes dimensões e não são muito portáteis.
Neste artigo gostaria de sugerir vários livros que não só são ricos em conteúdo como apresentam uma leitura acessível para qualquer leitor leigo que se interesse por esse vasto tema que é a cidade. Começaria por Lewis Mumford e o seu A Cidade na História (Martins Fontes), provavelmente o mais importante livro sobre urbanismo e história da cidade pela sua abordagem erudita e holística. Aqui, a cidade não é analisada meramente como um amontoado de arquiteturas, mas como aquilo que verdadeiramente é: uma construção humana, alicerçada em todos os aspectos materiais e imateriais que constituem a sua essência, nomeadamente religião, economia, arte, filosofia, política, estética, etc. De seguida, dois livros que, aparentemente antagónicos, são contributos positivos e essenciais para reflectir acerca de duas formas de ver e projectar arquitectura: a moderna e a clássica. O primeiro livro é de Bruno Zevi que, como o próprio nome indica, faz a apologia de A Linguagem Moderna da Arquitectura (Edições 70 ou Dom Quixote). Quem faz os abjetos edifícios caixotes que tanto povoam o panorama atual deveria revisitar este livro e perceber que se podem fazer obras modernas de qualidade aplicando os princípios aqui descritos (o edifício-sede da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, é bem o exemplo disso). O segundo livro é de Léon Krier, Arquitectura: Escolha ou Fatalidade (Estar Editora); Krier é o típico autor classicista, tradicionalista e conservador. Numa sociedade embriagada pelos constantes desejos de novidade e glorificação da impermanência, muitas das contribuições intemporais aqui vertidas serão vistas como lições retrógradas ou desatualizadas; no entanto, um olhar atento verá que as críticas e análises são lógicas e acutilantes, ajudando a perceber como determinados projetos pretensiosamente vanguardistas (e aqui sugiro como paradigma desse pretensiosismo a Casa da Música, no Porto) não são mais do que típicos casos de fetichismo exibicionista em que o rei vai nu. Seguem-se dois livros de paisagismo – qualquer um deles fundamental para perceber como é essencial a harmonia entre campo e cidade, edificação e paisagem: de Gonçalo Ribeiro Telles e Francisco Caldeira Cabral temos A Árvore em Portugal (Assírio e Alvim), um livro que não trata apenas de árvores mas, no dizer dos autores, de uma “visão integradora da paisagem, também cultural e já ecológica”. Fundamentos da Arquitectura Paisagista (Instituto de Conservação da Natureza) é outra obra igualmente imprescindível de Caldeira Cabral. Finalmente, estando a atualidade a ser marcada por tantos casos de corrupção em autarquias, não poderia deixar de sugerir a minha pequena contribuição para esta matéria, nomeadamente um Manual de Crimes Urbanísticos (Guerra e Paz Editores). Só o tema daria azo a uma enciclopédia; no entanto, tentei poupar o leitor a tamanho enfado com um livro pequeno e ilustrado. E como não deve haver crime sem castigo, sugiro como ponto de paragem final para esta viagem literária Crime e Castigo, de Fiodor Dostoievski. Boas leituras.
Mestre em Ordenamento
do Território e Planeamento Ambiental
Escreve quinzenalmente