Primeiro foram os turistas que se esparramaram a apanhar sol em qualquer canto da capital, depois a moda foi pegando e basta passear por Lisboa para perceber como muitos jardins estão com mais vida. Com mais famílias e amigos, novos e menos novos, que aproveitam não só os parques infantis mas os relvados para os piqueniques de festa ou simples programas de fim de semana. Já percebemos que a natureza nos faz bem e agora há menos pruridos em estender as mantas e descalçar os sapatos na relva no meio da cidade – ajuda também haver cada vez mais zonas delimitadas para os cães poderem brincar e mais civismo com as necessidades, que dantes facilmente dariam azo a pisadelas menos agradáveis.
O vereador José Sá Fernandes anunciou esta semana mais 120 hectares de espaços verdes em Lisboa até 2021, depois de a capital ter ganho 230 hectares nos últimos dez anos. “350 hectares novos de áreas verdes numa cidade consolidada significa que há sempre um espaço verde a 300 metros de qualquer cidadão”, disse à TSF, a propósito de uma investigação da Universidade de Coimbra que concluiu que bairros mais recentes, com mais zonas verdes e menos carros, têm menos crianças obesas.
Dificilmente o espaço fará tudo, mas não há dúvida de que bairros cuidados e zonas de lazer são incentivos para sair de casa, para recear menos a insegurança, para ter gosto em andar a pé na nossa zona. Diz-se que os miúdos o fazem pouco e é engraçado como é um impulso natural: “Temos de ir de carro?”, pergunta-me muitas vezes a minha filha de três anos. Muitas vezes temos, outras vezes até tinha pensado que sim, mas mudo os planos.
Em boa hora se começou a repensar a cidade, o que por cá está longe de ser um exclusivo de Lisboa, onde os números fazem sempre mais vista. E parece haver outra vantagem além da preocupação com a atividade física e o ambiente: criar espaços de envolvimento comunitário e de identidade coletiva que combatam a despersonalização dos dormitórios em que as cidades se foram deixando fechar durante algum tempo.
Tenho a sorte de ter um grande jardim perto de casa, na zona antiga de Queluz – a Linha de Sintra tem jardins bonitos que vale a pena descobrir, e menos congestionados que os mais populares de Lisboa, que normalmente surgem nos roteiros e onde só falta haver senha para guardar vez na relva ou nas mesas. Este jardim junto ao palácio recebe cada vez mais iniciativas: percebeu-se que pode ser ponto de convívio local e intergeracional, e que as pessoas querem sair de casa, dos shoppings, e apanhar ar, mas também envolverem-se em atividades e apoiar as iniciativas locais.
Há umas semanas deixámo-nos ficar toda uma tarde numa espécie de festival desportivo organizado pelo Clube Atlético de Queluz: “12 horas a saltar”. Com demonstrações de ginástica e dança, o ponto forte eram demonstrações de rope skipping, uma modalidade que tem estado a crescer entre as gerações mais novas.
É o velhinho saltar à corda, mas levado para todo um outro nível em que fazem mortais, espargatas e flexões enquanto a corda dá a volta, entre outras acrobacias. Se não saíssem do pavilhão para a rua, muitos de nós não faríamos ideia de que tínhamos, perto de casa, alguns dos miúdos mais entusiastas do país. Também nos deixavam experimentar, mas não levo grande jeito na corda. Fiquei rendida a outra modalidade que tem estado a ganhar adeptos nos nossos parques e que naquele dia nos convidavam a tentar: slackline. Une-se uma fita a duas árvores e tenta-se encontrar o equilíbrio para ir de um lado ao outro em cima da faixa esticada, pé ante pé, o que às primeiras tentativas se revela ainda mais difícil do que parece. Aos poucos evoluiu-se, uma boa metáfora para a vontade de voltar às coisas mais simples.
Jornalista
Escreve à sexta-feira