Será que os outros 10 650 funcionários da TAP são incompetentes?


Se houve tantas perdas, como é possível alguém ser premiado pelo seu desempenho? 


A história dos prémios da TAP atribuídos a 180 funcionários é quase inverosímil, atendendo a que se passa numa empresa onde o Estado tem a maioria do capital, já que a empresa teve prejuízos de 118 milhões de euros no ano passado. Se houve tantas perdas, como é possível alguém ser premiado pelo seu desempenho? Quererá a administração dizer que todos os outros funcionários, quase 10 650, é que foram responsáveis pelos prejuízos e que os 180 empregados contemplados foram os únicos que se salvaram do descalabro?

Não creio que esta seja a melhor forma de motivar equipas e de criar justiça salarial. Mas se o Estado não tem nenhum acionista com mais poder, como foi possível não saber da famosa lista publicada pelo i de ontem? Outros jornais também falaram do mal-estar que os prémios – dois de 110 mil euros para Abílio Martins e Elton D’Souza – estavam a causar na empresa, mas, com a divulgação da lista, tudo se tornou mais cristalino. O CEO da TAP deu uma explicação ainda mais bizarra: que a empresa tem uma despesa anual com salários de 700 milhões de euros e que, portanto, 1,17 milhões de prémios é uma gota nos encargos. Extraordinário, mas já agora, e porque o Estado está metido ao barulho – logo, todos nós –, qual a razão para não ter explicado o critério da atribuição dos subsídios? E o Estado? Será que, se a notícia não tivesse sido tornada pública, o Governo teria feito alguma coisa, ou continuaria a assobiar para o lado para não incomodar o acionista privado?

Sou completamente a favor dos prémios nas empresas privadas e até públicas: os melhores funcionários devem ser compensados pelo seu empenho e profissionalismo. Não há aqui nada de miserabilista nem tão-pouco de inveja. Mas uma empresa que teve tantos prejuízos, por que carga de água é que decide pagar, com o dinheiro de todos nós, prémios a 180 iluminados, alguns dos quais, é certo, de apenas mil euros? A parte dos prémios que diz respeito ao Estado bem podia ter sido empregue nos funcionários da CP e dos transportes fluviais. Talvez todos tivéssemos um verão menos caótico.