A operação stop da GNR com a Autoridade Tributária têm marcado a atualidade dos últimos dias, mas este tipo de ações existe já há cerca de oito anos. Em junho de 2012, o i revelou que a PSP estava desde o final de 2011 a levar a cabo diversas ações com o Fisco nas estradas nacionais com o objetivo de recuperar impostos em dívida, quer através do pagamento em dinheiro ou da apreensão de bens como os automóveis.
A medida partiu do então ministro das Finanças Vítor Gaspar – que já tinha enquadramento legal deixado pelo anterior Executivo – e a parceria foi rapidamente montada entre a Direção-Geral de Impostos e as forças de segurança, havendo, tal como agora, a possibilidade de os inspetores tributários poderem apreender viaturas e bens de devedores nas estradas.
Contactada em 2012 pelo i, fonte oficial da PSP confirmou mesmo a realização destas operações Stop a nível nacional: “Apesar desta aproximação às Finanças ser de facto uma realidade recente, a PSP já está habituada a estas operações conjuntas com outras entidades, como é o caso da ASAE.”
E a PSP adiantava: “A lei permite a apreensão de bens, nomeadamente de veículos automóveis, nos casos em que os proprietários tenham dívidas, ou em que por exemplo não tenham seguro em dia. É-lhes dado um tempo para pagarem de forma voluntária, mas caso não o respeitem perdem o bem a favor do Estado”.
A mesma força de segurança explicava que não havia exceções para a realização destas operações em território nacional: “Este tipo de ações conjuntas, quer seja com elementos da ASAE, quer seja em articulação com elementos das Finanças, pode ter lugar em qualquer ponto do território nacional, incluindo a Região Autónoma da Madeira e a Região Autónoma dos Açores.” A concluir, a PSP recordava que independentemente das operações conjuntas com o Fisco, “a própria PSP já [tinha] há algum tempo uma base de dados que permite verificar quais os automóveis que circulam de forma irregular, ou seja, sem imposto único de circulação em dia”.
Na altura, o Ministério das Finanças, tutelado por Vítor Gaspar, preferiu não responder a nenhuma das questões colocadas pelo i.
PSP e GNR em silêncio. Centeno fala em ações ‘Infelizes’
Questionadas ontem sobre o número de ações de fiscalização envolvendo inspetores tributários feitas desde 2012, nem a PSP nem a GNR responderam até à hora de fecho desta edição. O i questionava ainda qual o balanço feito até então destas ações conjuntas, bem como se depois de toda esta mediatização a colaboração deixou de ser possível.
Após ter sido tornada pública uma operação Stop da GNR na última terça feira em Valongo, onde estavam elementos da Autoridade Tributária, com vista a verificar a situação tributária de cada condutor, o Governo já veio afirmar que estas ações são para acabar. Em entrevista à SIC, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais disse que a ordem foi dada mal teve conhecimento da operação. Confirmou apenas que este mês já tinha havido cinco ações idênticas na zona do Porto. O caso tem estado a ser tratado como se de uma novidade se tratasse, mas vai muito além do Executivo de António Costa, uma vez que foi criado no tempo de Passos Coelho. Mas a porta foi aberta na legislatura anterior.
Depois da polémica, o ministro das Finanças já veio também deixar a garantia que este tipo de operações é para acabar: “A decisão foi tomada localmente e tem um enquadramento local. Foi tomada a decisão de suspender, não haver mais medidas daquela natureza. E foi aberto um inquérito para se perceber se todos os direitos de todos os contribuintes foram preservados”.
Em Matosinhos, Mário Centeno falou ainda nos malefícios desta medida: “É preciso tornar muito claro que, na relação entre a Autoridade Tributária e os contribuintes, é preciso confiança, proximidade e estabelecer elos de ligação para que todos nos possamos orgulhar de ser uma sociedade que cumpre as suas obrigações”. Falando em desproporção, o governante concluiu que mandar elementos da AT para as estradas “não foi uma decisão feliz”. O ministério das Finanças já tinha deixado claro que as orientações na AT são para uma atuação proporcional, lembrando que existem “mecanismos de penhora eletrónica” para quem não cumpre os seus deveres tributários.
A ação que despertou o país para estas operações Stop
Entre as 8h e as 13h da última terça-feira, a GNR juntamente com diversos elementos da Autoridade Tributária (AT) estiveram na A41 em Alfena, Valongo para fiscalizar condutores que tivessem dívidas às Finanças. No total, estiveram envolvidos na “Ação sobre Rodas” 20 elementos das finanças e 10 da GNR.
Tal como o i noticiou na edição de ontem, são vários os especialistas que criticam este tipo de operações Stop. “Chamo a isto cobrança em flagrante delito. É uma figura jurídica que não existe. Neste caso houve abuso de poder porque porque o Estado está a cobrar dívidas aos contribuintes através da pressão, monopolizando os procedimentos processuais que a lei impõe”, disse o jurista Dantas Rodrigues, alertando para o facto de terem sido violadas normas da Constituição.
Nuno Barroso, presidente da Associação dos Profissionais da Inspeção Tributária (APIT), também diz estar preocupado: “Se tudo aconteceu como está a ser revelado na comunicação social, julgo que podemos estar perante uma violação das garantias de defesa dos contribuintes. Em algumas situações, os contribuintes podem solicitar a dispensa da penhora ou esta pode nem sequer se aplicar [em determinadas situações]. Eu não sei se essas garantias foram tidas em contas. Foi uma ação que nos surpreendeu a todos e estamos a tentar perceber o que realmente aconteceu”.
Paulo Ralha, presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, afirma que este tipo de ações “expõe os trabalhadores da AT ao ridículo”.