Crónica sobre os dias de terror fiscal e as eleições


Estes são os dias do fim da austeridade prometida pelos ditadores dos 16% que, aproveitando a impavidez de quem não se indigna nem reage a esta violência fascistóide, já prometem ganhar as próximas eleições.


No nosso país, de tempos a tempos acontece entre nós a ressaca de umas quaisquer eleições, como foi agora o caso do Parlamento Europeu, em que os analistas de serviço ao regime fazem as suas análises sobre os vencedores e os vencidos dessa noite usando aquelas muito costumadas extrapolações, sempre devidamente orientadas para conseguirem concluir os resultados que bem entendem e a dar a ideia de que há uma lógica política que se pode inferir dos mesmos das suas aparentes vitórias e derrotas dos partidos de serviço.

No entanto, há outras possíveis leituras dos resultados quando vistos de forma mais objectiva.

São várias e extrapolam apenas a ideia da preguiça as razões pelas quais as pessoas que venceram as eleições por esmagadoríssima margem não foram as que foram votar, mas sim as que não compareceram à chamada da eleição.

Com efeito, o quadro político e o deserto de ideias que se instalou na nossa política, aliados às alianças parlamentares que desvirtuam o sentido de voto saído das urnas, ou o rigor orçamental aplicado pelas extremas-esquerdas, a versão a um tempo pride e outro Mário Nogueira da política do CDS ou o percurso errático do inenarrável Rio são o último incentivo ao voto para qualquer alma que seja propensa a graus mínimos de indolência e autoestima.

Entre costumados crentes ou apenas resignados restaram-nos, pois, nestas eleições, pouco mais de 30% de eleitores a decidir pelos 100% que podiam tê-lo feito.

É verdade que, ao fim e ao cabo, apenas os votos expressos definem as eleições, mas alguma profundidade de análise permite pô-las em perspectiva e ter outras leituras e, eventualmente, darmos aos de-savindos com a democracia uma razão para acharem que o voto deles faz a diferença.

Percamos um pouco de tempo, depois dos discursos mais ou menos inflamados das vitórias poucochinhas, a relativizar e extrapolar os resultados individuais das eleições no universo dos portugueses.

Em 2014, nas eleições europeias, o PS teve 31,46% dos votos expressos e um total de 1 033 158 votos; nestas eleições de 2019, o PS teve 1 108 328, que equivaleram a 33,38%, tendo subido cerca de 75 mil votos.

No entanto, esta putativa espantosa vitória vale em termos absolutos, no universo de todos os eleitores recenseados, pouco mais de 10%.

Se fizermos as contas também, ao CDS e ao PSD, do número de votos conseguidos em 2014, em coligação, para a soma dos dois a concorrerem em separado em 2019, o número é de 909 932 para 932 330, o que nos dá um aumento de cerca de 20 mil votos.

Tal equivaleria, concorrendo em coligação, a quase 9% do universo de todos os votos possíveis.

A mesma fórmula dá-nos, com ainda mais proximidade, a representatividade absoluta dos partidos mais militantes, como BE e CDU, que valem, respectivamente, pouco mais que 3% e 2% desse universo, e o PAN 1,6%.

A esta reflexão, uma outra, de que não são comparáveis as eleições europeias e as legislativas que aí vêm.

Mas os números são absolutamente elucidativos de que quem optou por não votar tem o poder de alterar profundamente o cenário do poder, onde, se dependêssemos destes resultados, o Governo e seus apoiantes reúnem o esmagador consenso de 16% do universo total dos eleitores portugueses.

É preciso e urgente que nos mentalizemos desta força, deste poder e desta necessidade.

As notícias de ontem davam-nos conta de que a Administração Tributária passou a usar as forças militares armadas e munidas do sistema informático das finanças para fazer operações stop destinadas à cobrança aos cidadãos, parados à força e sob a autoridade das polícias em plena via pública, para aí serem coagidos e violentados no seu direito de livre circulação e na sua fazenda, sob a ameaça da penhora imediata dos seus meios de transporte, caso não pagassem voluntariamente as suas dívidas fiscais.

Estes são os dias do fim da austeridade prometida pelos ditadores dos 16% que, aproveitando a impavidez de quem não se indigna nem reage a esta violência fascistóide, já prometem ganhar as próximas eleições.

Quem tem amor à liberdade e à fazenda já não pode ficar mais em casa nas próximas eleições.

 

Advogado na norma8advogados

pf@norma8.pt

Escreve à quinta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990