Eis que chega a primeira final europeia de 2019. Não a mais esperada, bem entendido; essa, compreensivelmente, é a da Liga dos Campeões e será disputada apenas dentro de três dias. Não: falamos da sua irmã mais nova, que tantas vezes dá ares de mais desajeitada e desleixada, o que a deixa invariavelmente a consolar-se com os restos da mana mais esbelta e produzida.
No jogo que decidirá então o vencedor da Liga Europa, estarão em confronto duas equipas inglesas – até nisto, uma tentativa de imitação barata da Champions. Mais: serão duas equipas de Londres, numa eterna rivalidade alimentada pela vizinhança centenária. Rivalidade em tudo… menos numa coisa: as críticas à escolha da UEFA para o local onde se realizará a final.
Pois é: desde que se qualificaram para o encontro decisivo, Chelsea e Arsenal têm estado unidos na exposição dos vários problemas que advêm do facto de a partida se efetuar em Baku, Azerbaijão. Começou logo com os bilhetes: foram disponibilizados pela UEFA apenas seis mil para cada um dos clubes – isto, num estádio com capacidade para 70 mil espetadores. A justificação do organismo que regula o futebol europeu foi “dificuldades logísticas”. Traduzindo por miúdos: o aeroporto da capital azeri não terá capacidade para receber mais adeptos num tão escasso período de tempo.
Entretanto, tanto os gunners como os blues acabaram por devolver praticamente metade dos ingressos, justificando-se com as parcas ligações aéreas para Baku – situada a quase 5500 quilómetros de Londres – e também com os preços elevados praticados pelas unidades hoteleiras da cidade.
Como se não bastasse, há ainda as questões da segurança: o próprio governo britânico lembrou que existia risco de ataques terroristas no Azerbaijão durante esta semana da partida e que os adeptos deviam ter consciência disso. E depois, claro, é incontornável o caso de Mkhitaryan, uma das figuras do Arsenal e que ficou de fora da partida unicamente… por ser originário da Arménia, país há décadas em guerra com o Azerbaijão pelo enclave de Nagorno-Karabakh, um pequeno território nas montanhas do Cáucaso que, de acordo com o Direito Internacional, pertence ao Azerbaijão, mas cuja maioria da população é arménia.
Temendo pela segurança do jogador – que é mesmo o capitão da seleção da Arménia –, o Arsenal optou por não o incluir na comitiva. A Associação de Futebol do Azerbaijão e a própria UEFA ainda reagiram, garantindo que Mkhitaryan estaria completamente seguro no país, mas os gunners não concordaram e o médio ficou mesmo em Londres.
UEFA despreocupada Apesar de todas as reticências, ainda houve alguns milhares de ingleses a realizar nos últimos dias a tão complicada viagem para Baku. A julgar pelo que se vai lendo diariamente pelas redes sociais, todavia, a maior parte deles estarão já bastante arrependidos da aventura.
“Reservei o nosso apartamento em Baku há meses e por isso consegui alugá-lo por ‘uma pechincha’. Agora tenho uma mensagem do dono a dizer que o apartamento já não está disponível e a pedir-me para cancelar para que ele possa alugá-lo por um preço mais elevado”, escrevia anteontem um adepto, corroborado por outras mensagens de teor semelhante, como esta: “Recebi um email esta manhã do hotel a informar que a minha reserva foi cancelada 2 dias antes do jogo. Procurei a hashtag no Twitter e apercebi-me da quantidade de pessoas que reclamavam do mesmo problema com outros hotéis. Isto é antiético e pouco profissional”.
Até mesmo jornalistas, como Luke Edwards, do Daily Telegraph, ou Sam Dean, do Telegraph, têm partilhado as suas queixas. Além dos problemas com os hotéis, também a realidade nos meios de transporte se apresenta muito diferente do esperado. “A primeira pessoa a quem perguntei disse-me que a viagem [de táxi] custaria 100 manates [52 euros], o segundo disse-me 40 [21], o terceiro concordou com 25 [13]. A equipa do aeroporto tinha-me dito que custaria cerca de 15 manates [oito euros]”, revelou Sam Dean. Recorde-se que o próprio Jürgen Klopp, treinador do Liverpool, teceu recentemente duras críticas à localização da final, classificando a decisão da UEFA de “irresponsável”: “Os tipos que decidem estas coisas… não sei o que têm na cabeça ou o que é que tomam ao pequeno-almoço”.
A verdade é que, para a UEFA, tudo parece correr sobre rodas. “Grande parte dos bilhetes já foram vendidos a adeptos locais e confiamos que os que sobram serão também vendidos, a procura é grande”, disse o organismo há poucos dias, demonstrando pouca preocupação sobre o facto de o Estádio Olímpico, numa final entre dois clubes ingleses, poder vir a estar composto na sua larga maioria… por azeris.
A localização do encontro foi decidida em setembro de 2017, três semanas depois de rebentar um escândalo de lavagem de dinheiro envolvendo subornos a políticos, jornalistas e ativistas. O objetivo era tentar limpar a imagem do Azerbaijão no exterior, fazendo passar a ideia de que o regime de Ilham Aliyev não é autoritário. Curiosamente, depois desse escândalo sucederam-se as entregas de organização de grandes competições ao país, como um Grande Prémio da Fórmula 1 nesse ano de 2017 e ainda a realização de quatro jogos do Euro 2020. Também curiosamente, a UEFA foi patrocinada durante vários anos pela SOCAR, a Companhia Estatal de Petróleo… do Azerbaijão.
Benfica torce pelo Chelsea Mas voltemos a outros jogos de poder: os de dentro do campo. Em termos de histórico europeu, o Chelsea cresceu exponencialmente nas últimas duas décadas, surgindo agora bem destacado em relação ao Arsenal: quatro títulos dos blues (Liga dos Campeões em 2011/12, a Taça das Taças em 70/71 e 97/98 e esta mesma Liga Europa em 2012/13, às custas do Benfica) contra apenas um dos gunners (a Taça das Taças, em 93/94). Há ainda outro dado a favor do Chelsea: é que o Arsenal perdeu sempre que se encontrou com equipas inglesas nas competições europeias – inclusive frente ao Chelsea, em 2004, nos quartos-de-final da Liga dos Campeões.
Do seu lado, o Arsenal (que na fase de grupos defrontou o Sporting, vencendo por 1-0 em Alvalade e empatando a zero em Londres) tem o treinador, Unai Emery, autêntico papa-Liga Europa: soma três, conquistadas de forma consecutiva ao comando do Sevilha – uma das quais frente ao Benfica, em 2013/14. Os gunners procuram ainda vencer a competição para garantir um lugar na Liga dos Campeões da próxima época, algo que o Chelsea já conseguiu via Premier League.
Há também enorme interesse de um clube… português nestas contas: o Benfica. Neste caso, as águias torcem pelo Chelsea na partida que arranca às 20h00 desta noite: é que só com esse cenário podem ainda aspirar a chegar ao pote 2 do sorteio da fase de grupos da Liga dos Campeões. Os blues entrariam assim no pote 1, deixando livre um posto no 2 – ainda assim, o Benfica precisará também que FC Porto ou Ajax caiam nas pré-eliminatórias. Caso seja o Arsenal a vencer a prova, os gunners entram no pote 1 e o Chelsea vai para o 2: se assim for, os encarnados só chegam ao pote 2 se tanto o FC Porto como o Ajax forem eliminados na pré-qualificação. Já agora, refira-se que os dragões têm garantido um lugar no pote 2 caso consigam ultrapassar as duas rondas de qualificação.