Mektoub My Love: Intermezzo. O meu querido verão de Abdellatiff Kechiche

Mektoub My Love: Intermezzo. O meu querido verão de Abdellatiff Kechiche


O segundo volume da saga prometida pelo tunisino Abdellatif Kechiche (Mektoub, My Love: Canto Primeiro foi mostrado pela primeira vez no festival de Veneza edição de 2017) chegou a Cannes rodeado de algum secretismo.


Kechiche regressa a Cannes com o seu cinema teimoso e determinadamente erótico. Polémico? Pois sim, fecha-nos numa discoteca durante três horas, com meninas a dançar, muito twerk, e ainda uma cena de sexo oral explícita a uma delas durante 12 minutos. Assim vai o verão do cineasta franco-tunisino. E ainda vamos no ‘intervalo’.

Tal como sucedeu com o filme de Quentin Tarantino, também Mektoub, My Love: Intermezzo, o segundo volume da saga prometida pelo tunisino Abdellatif Kechiche (Mektoub, My Love: Canto Primeiro foi mostrado pela primeira vez no festival de Veneza edição de 2017) chegou a Cannes rodeado de algum secretismo. Não só por terem sido os dois últimos filmes a completar a Seção Competitiva para a Palma de Ouro, ambos já vencedores também (Tarantino com Pulp Fiction, em 1994, Kechiche em 2013, com A Vida de Adèle) mas também por serem filmes pessoalíssimos e, de certa forma, parcos em informação prévia ao festival. As notas de produção de Mektoub reduzem-se a uma frase: “Aproxima-se o fim do Verão, Amin e os seus amigos conhecem Marie, uma jovem parisiense”.

Esta é então a oportunidade para retomarmos contacto com o cinema profundamente naturalista e sensual do realizador determinado a celebrar o corpo feminino em todo o seu potencial. O cinema sobre este grupo de amigos que celebra a liberdade das relações amorosas, os engates de praia e, de um modo geral, a aventura da vida uma forma intensa e despreocupada pode não ser para todos, mas não deixa de ser absolutamente cativante. Nesse sentido, Intermezzo é já um dos eventos de Cannes dete ano.

O filme abre com o rosto de Charlotte (Alexia Chardard) a ser fotografado por Amin (Shain Boumedine), mas o plano é também de Kechiche que completa com um traveling da câmara a deslizar pelo seu corpo até se fixar nas suas nádegas. Como diria Godard, os traveling são coisa de 'moral'. Pois bem, isso não poderia ter um significado maior neste caso. Seja a favor ou não. Mas essa é também a provocação que Kechiche deseja assumir.

Por aqui começará então parte das críticas ao seu cinema de “bunda”, mas que teremos de acrescentar também a sua tremenda coragem para fazer “o seu” cinema. Desta vez, numa espécie de revanche, fixando este Intermezzo numa autêntica ‘tour de force’ que sublinha precisamente essas polémicas opções estéticas, levando-as muito, mas muito mais longe nestas cerca de 3h30 de filme (e não as prometidas 4h) – talvez uma decisão de última hora para ficar pronto a tempo para Cannes.

Ainda bem que o filme está em Cannes. Quanto mais não seja – e isto vale o que vale – porque implica o motivo mais picante do festival. Ou seja, aqueles 12 minutos (alguém jura a pés juntos que cronometrou) da realista, explícita e tão empenhada cena de sexo oral que um dos jovens faz a uma rapariga do seu grupo na cada de banho da discoteca onde decorre a monumental sequência de mais de três horas. Seguramente algo digno de um Andy Warhol – a duração, não o sexo oral! – nos seus melhores dias. Deixamos de lado a felação, certamente aquilo de que mais se vai falar, para abordar o filme em si. E convém não esquecer que se trata do Intermezzo, que é como quem diz, o Intervalo.

Voltamos então a Sète, à região no sul de França, perto de Montpellier (apetece mesmo lá ir passar férias e procurar estas pessoas). Sempre em 1994 (olá Pulp Fiction!) E ao sol da praia, às nádegas das meninas que serão filmadas de uma forma bastante intensiva. Por certo também a motivar algum desconforto pela insistência. Esse espaço de praia, que parece já prolongar uma conversa que vem detrás com um grupo de amigos que conhecemos do filme anterior, Mektoub, Meu Amor: Canto Primeiro, lançado no festival de Veneza em 2017, e que irá prolongar-se no próximo andamento (de novo em Veneza?).

Depois da introdução no sol e dos corpos bronzeados, é a sedução de Marie (Marie Bernard) e a sua rápida integração no grupo que acompanhará tal longuíssima sequência da discoteca com tecno, sedução e muito 'twerk' à mistura. Só que no final, percebemos que estamos apenas no tal ‘intermezzo’, no tal intervalo, pois fica tudo em suspense. Os problemas apenas florados aqui: uma gravidez ou aborto quase nas vésperas do casamento com outro homem, entre várias outras decisões pessoais e amorosas. Não faz mal, a ação deste meu querido verão regressa dentro de momentos. É o 'mekroub', o destino.