São raras, diria mesmo inexistentes, as crónicas em que escrevo sobre mim. Sobre o que fiz ou o que vou fazer. São sobretudo opinativas e expressam, muitas vezes, a minha visão e leitura sobre diversos acontecimentos. É para isto que serve uma coluna de opinião.
Contudo, hoje quebro essa regra e abro uma exceção, senão a única.
Terminei a semana passada, mais concretamente dia 15 de maio, um ciclo de dez anos de dedicação a um projeto profissional que, na verdade, agarrei como se fosse pessoal. Não por apropriação material do mesmo, mas por paixão e uma inabalável crença na causa pública.
Foram anos de esforço e sacrifícios, sobretudo pessoais. Meses de ausência familiar, com todas as implicações negativas que isso acarreta. Memórias que não se apagam e marcaram uma década de aventuras e desventuras. Momentos perdidos e que não se recuperam nem voltam atrás. No crescimento das minhas filhas, no envelhecimento dos pais, amigos e familiares.
De todos os sacrifícios, há dois que não esquecerei nunca e que me marcaram para sempre: a ausência no quinto aniversário da minha filha mais nova que, até hoje, não se esqueceu e faz questão de mo relembrar e, menos traumatizante mas, ainda assim, assinalável, o nascimento do meu sobrinho.
Mesmo com todos estes aspetos menos positivos e a impossibilidade de reviver momentos únicos, tenho uma convicção profunda de que nada foi em vão e que, ainda assim, valeu a pena.
Porque valeu a pena?
Valeu a pena porque, nos últimos dez anos, contribuí para aproximar uma comunidade que tende a esquecer-se de que, unida, é mais forte.
Porque foi possível deixar um legado e uma base sólida para que o setor das comunicações na CPLP cresça e se torne uma referência a nível mundial.
Porque Portugal pode beneficiar, sem imposições, sem necessidade de protagonismo, sem se sobrepor ou prejudicar os seus pares, das ferramentas que foram criadas.
Em concreto, neste período como secretário da Associação de Reguladores de Comunicações e Telecomunicações da CPLP, orgulho-me de ter contribuído, positivamente, para o desenvolvimento deste setor.
Por ter promovido reuniões de ministros das Comunicações que estavam em suspenso há mais de 12 anos. Por ter secretariado as mesmas ao longo dos últimos três anos e ter assegurado uma convergência harmoniosa entre todos os Estados-membros da CPLP que, objetivamente, conduziu à aprovação de uma Agenda Digital para a CPLP – um documento único que aproxima quatro regiões distantes do globo.
Por ter ajudado a implementar um centro de formação que proporcionou a milhares de pessoas planos de formação e capacitação adequados às reais necessidades das mesmas, a preços acessíveis.
Por ter apoiado e contribuído para o desenvolvimento de estudos sobre serviço universal, comércio eletrónico, portos inteligentes ou roaming na CPLP.
Por ter levado a internet de banda larga onde ela não existia e ver o sorriso rasgado de uma criança ao navegar na internet.
E é por tudo isto, mais todo o esforço e empenho colocado em cada missão, em cada discussão e em cada projeto, que posso afirmar que valeu a pena.
Valeram a pena as imensas horas de voo, as noites mal dormidas e longe da família ou as picadas de jipe rumo a lugares recônditos.
E acima de tudo, antes de qualquer realização material e dos projetos implementados, valeu a pena pelos amigos criados. Grandes e bons amigos, que ficam para sempre.
Chegou a altura de virar a página e seguir em frente em busca de mais emoções, novos desafios e novos amigos, para que mais à frente possa voltar a afirmar sem equívocos, que sim – valeu a pena.
Escreve à quinta-feira