FC Porto-Sporting. No Campo do Arnado, até os guardas republicanos saltaram de alegria

FC Porto-Sporting. No Campo do Arnado, até os guardas republicanos saltaram de alegria


Ainda se chamava Campeonato de Portugal em 1937. A última final com esse nome entre FC Porto e Sporting foi jogada em Coimbra e venceram os azuis-e-brancos. A seguinte só teria lugar 40 anos depois!


Ora bem, cá estamos nós à beirinha de mais uma final da Taça de Portugal, com a habitual romaria de gente ao Vale do Jamor, cervejas e febras de porco incluídas, talvez até uma ou outra sardinha, que já é época delas.

Poucos jogos, na verdade, têm uma aura de festa deste calibre, venha quem vier, e desta vez até mete gente grande, Sporting e FC Porto, com os seus milhares e milhares de seguidores indefetíveis, que pedem a São Pedro que faça sol e chuva não para que a tarde de sábado seja ainda mais gloriosa, sobretudo para os que dela saírem vencedores.

Desde que, a partir da época de 1938-39, a Taça de Portugal passou a ter esta designação, por decisão do congresso da FPF, não foram muitas as vezes que leões e dragões se viram frente a frente. Mas a história começa mais atrás, em 1921-22, naquele que tinha o nome de Campeonato de Portugal. E aí, em cheio! Logo na primeira edição, o FC Porto bateu o Sporting por 3-1, após prolongamento. Infelizmente, a prova ficou manchada por uma incompreensível falta de respeito por todo o futebol português ao ser disputada em apenas uma partida, entre o campeão do Porto e o de Lisboa. Figura como um momento pouco digno de desportivismo, mas o passado não se reescreve.

Nas 17 finais do designado Campeonato de Portugal, FC Porto e Sporting encontraram-se depois na de 1924-25 (FC Porto, 2 – Sporting, 1) e na de 1936-37 (FC Porto, 3 – Sporting, 2). Vejam bem como as coisas são: vem a Taça de Portugal tomar o lugar do Campeonato de Portugal e foram precisos 40 anos para os dois clubes voltarem a estar frente a frente numa final. É obra!

Coimbra, em julho Demos um pouco de atenção àquela que foi a última final entre FC Porto e Sporting com o nome de Campeonato de Portugal. Três comboios especiais vindos de Lisboa e quatro do Porto despejaram em Coimbra, no dia 4 de julho de 1937, milhares e milhares de pessoas plenas de entusiasmo, agitando bandeirinhas verdes ou azuis, soltando pilhérias provocantes conforme a preferência clubística, e ao meio-dia já as portas do Campo do Arnado se abriam para que cerca de 12 mil adeptos esperassem, com a maior das paciências, o início do jogo, que estava marcado para as 18h. Ufa! Pachorra dos que estalavam cabeças ao sol, procurando poupar-se com chapelinhos cónicos feitos de jornal. Há uns, mais poupados, que em troca do privilégio da visão dos pormenores preferem espalhar-se numa colina próxima e espreitar ao longe mas de borla.

Os portistas orgulhavam-se de gente como o guarda-redes Soares dos Reis, o brasileiro Vianinha, Lopes Carneiro, António Santos e, sobretudo, o seu avançado madeirense, Artur de Sousa, ao qual todos chamavam Pinga. Por seu lado, os lisboetas exibiam estrelas como João Jurado, Manuel Marques, Pedro Pireza, Manuel Soeiro e Adolfo Mourão.

“Priiiiiii”, soa o apito do árbitro Santos Palma, de Santarém.

A peleja é rija.

O vento estava a favor dos portistas no primeiro tempo. E eis que eles aproveitam as benesses da meteorologia. Bola pelo ar, domínio de Lopes Carneiro e o pontapé certeiro engana o enorme Azevedo.

Ah! Esse fresco de fim da tarde que arrefece o campo enquanto os ânimos aquecem…

Os lisboetas impõem o físico. Soeiro força o choque com Vianinha e foge para entregar a Mourão. Este toca para Heitor, o empate está feito e assim se irá para o intervalo.

Afinal, o FC Porto não tirou grande proveito dos favores do vento.

Será o Sporting a fazê-lo, agora que se troca de campo?

Parece que não.

Há um equilíbrio efetivo.

Ninguém pode apostar de caras no grupo vencedor. O risco seria enorme.

Pireza remata, remata e remata, mas nunca acerta com a baliza. Ouve assobios.

Carlos Nunes é certeiro: faz o 2-1.

Soares dos Reis teima em queimar tempo, em atirar bolas para fora. O público não gosta. Leva a sério essa tão inglesa e tão formidável regra do fair play.

O jogo torna-se duro, o árbitro mete os pés pelas mãos quando Reboredo desvia com a mão uma bola que vai bater, em seguida, no braço de Jurado. Os sportinguistas não querem acreditar na injustiça de tal penálti. Vianinha está-se nas tintas para as questões de justiça e bate Azevedo pela terceira vez.

Faltam 15 minutos.

Porfiam os que vestem de verde e branco às riscas. Pireza continua na sua teimosia de rematar a torto e a direito e, finalmente, com a colaboração de Soares dos Reis, consegue meter a bola na baliza contrária. Mas é tarde demais. Seria preciso esperar 40 anos…