A preocupação com a habitação para as famílias tem sido apresentada como uma das prioridades de agenda da atual solução governativa.
Todavia, o Governo tem revelado um comportamento completamente errático que destrói as intenções de investimento daqueles que estariam dispostos a mobilizar as suas poupanças para disponibilizarem habitações às famílias portuguesas.
De acordo com a economia social de mercado, os recursos financeiros deveriam ser incentivados para serem canalizados para resolverem eficientemente as prioridades sociais que existem.
Mas é exatamente o oposto que está a acontecer, com as numerosas contradições que têm sido evidentes em termos de política habitacional.
Quando o atual Governo chegou ao poder herdou uma notável recuperação no investimento em reabilitação urbana, a par de uma procura turística que ultrapassava tudo o que anteriormente se imaginara.
Então, o Governo tomou logo em 2016 duas medidas desastrosas que contradizem frontalmente a sua apregoada preocupação em promover o investimento na habitação:criou um imposto de confisco, designado por “imposto Mortágua”, destinado exclusivamente a imóveis destinados a habitação permanente.
Pois é, quase não dá para acreditar. Se tiver uma casa alugada há muitos anos com um contrato vitalício e por um valor degradado, tem de pagar o imposto Mortágua. Mas se tiver alugado para um bar de alterne, estará isento.
Relativamente às rendas antigas degradadas, a lei de 2012 previa a sua evolução para valores sociais que, sendo superiores aos valores ridículos anteriormente existentes, se situavam, ainda assim, muito abaixo do mercado.
Esta lei previa ainda que o Estado desse um subsídio aos inquilinos que tivessem dificuldade em pagar mesmo essas “rendas sociais”. Só que o novo Governo decidiu abolir esses subsídios de renda, ficando assim os proprietários condenados a receber apenas as rendas ridículas já anteriormente existentes. Ou seja, obrigados pelo Estado a substituírem-se ao próprio Estado para fazer assistência social!
Após esta atuação inicial, prosseguiu-se numa dança de contradições verdadeiramente suicida que está a liquidar o mercado de arrendamento para habitação:
a) Na lógica de fugir ao confisco do imposto Mortágua, muitos investidores, entre os quais um conhecido vereador do Bloco de Esquerda na Câmara de Lisboa, decidiram investir no arrendamento de muita curta duração para turistas.
Para obstar a este fenómeno, a Câmara de Lisboa avançou para um sistema burocrático complexo para travar estes “alojamentos locais”.
b) O presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, porque se apercebeu de que o imposto Mortágua era um completo tiro no pé em termos de política da habitação, resolveu fazer um desconto no IMI para os imóveis com contratos para habitação, ou seja, precisamente às vítimas do imposto Mortágua.
Mas ninguém no atual Governo se lembrou de abolir o imposto Mortágua para os imóveis que estão arrendados a famílias com contratos vitalícios ou de muito longa duração.
E, entretanto, a Autoridade Tributária não aplicou ainda a maior parte dos descontos do IMI decididos pela própria Câmara de Lisboa já em 2018 ! O terrorismo burocrático no seu melhor…
c) Perante a subida das rendas dos novos contratos, provocado pelos desincentivos ao investimento para habitação de que o Governo é o único responsável, este mesmo Governo decidiu criar mais um “monstro burocrático” para incentivar novos contratos de “arrendamento acessível”.
Pois é, o mesmo Governo que se recusa a apoiar as rendas sociais estabelecidas para contratos muito antigos vem agora tentar que novos investidores acreditem num sistema a que o próprio Governo retirou a necessária confiança!
E ainda com o requinte burocrático de determinar que, no caso das novas “rendas acessíveis”, quem escolhe o inquilino não é o proprietário do imóvel, mas sim uma monstruosa teia de concursos públicos.
Estas contradições insanáveis conduzem apenas a mais um nado-morto.
d) O governo decidiu agora reduzir o IRS apenas para os novos contratos de arrendamento habitacional de duração superior a cinco anos.
Isto é, quem tem contratos antigos e vitalícios, de que apenas recebe rendas miseráveis, não pode ter desconto no IRS. A lógica deverá ser que os investidores que já estão habituados a sofrer devem sofrer até morrer…
E o Governo certamente espera que os novos investidores andem distraídos …
Como é evidente, com tais contradições suicidas, a atual política de habitação está condenada ao completo fracasso.
Para desgraça tanto das famílias portuguesas que precisam de habitação como de quem investiu para lhas proporcionar!
Para evitar situações desastrosas como esta, convido o leitor a assinar a petição http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania.
Professor catedrático do Instituto Superior Técnico.
Subscritor do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”