1. É a imagem da campanha: Pedro Marques a olhar fixamente, entre o desconfiado e o perplexo, para o boneco do Noddy. Muito provavelmente, Pedro Marques – o cabeça-de-lista do PS às europeias do próximo domingo, que ninguém conhece – identificou-se com a personagem infantil: é que, tal como o genérico daquele desenho animado canta que se “abram alas para o Noddy”, Pedro Marques só é candidato ao Parlamento Europeu para abrir alas para o Costy, o seu “Querido Líder”. A escolha de Pedro Marques, como já explicámos no nosso artigo anterior aqui no i, foi apenas motivada pela ambição de António Costa ir, rapidamente e em força, para Bruxelas – é, pois, mais uma negociata à PS de Costa. A lista do PS às europeias não passa de uma comunhão de interesses: António Costa precisa de uma pessoa de confiança em Bruxelas, que lhe abras alas para um lugarzinho qualquer; Pedro Marques, por seu turno, deixou-se encantar pelo salário muito apetitoso e as mordomias que só a União Europeia consegue oferecer. Portanto, lá vai Pedro Marques abrir alas para o Costy, Costy!
2. E o nosso Costy parece estar com sorte. Na sequência do nosso texto da passada semana aqui no i, a informação que avançámos de que António Costa está preparando a sua fuga para Bruxelas não só não foi desmentida como foi reforçada: afinal, o nome de Costa circula nos bastidores da União Europeia como provável futuro… presidente da Comissão Europeia. Dirão os leitores mais cautos: tal será impossível, pois os candidatos à comissão já são conhecidos, já realizaram, inclusivamente, debates entre si. Tal objeção não procede: embora, alegadamente no âmbito de um reforço do processo democrático europeu, se tenha exigido que as forças políticas europeias apresentem o seu candidato à liderança da Comissão Europeia (o Spitzenkandidat), a verdade é que a escolha de uma destas personalidades não é obrigatória. O que significa que a liberdade dos líderes europeus e do Parlamento Europeu é – do ponto de vista jurídico – total, podendo desprezar por completo os candidatos apresentados ao eleitorado europeu.
3. Quais são os requisitos juridicamente vinculativos para a escolha do presidente da Comissão Europeia? Primeiro, os líderes europeus têm de ter em consideração os resultados das eleições europeias; segundo, o presidente da comissão terá de ser aprovado por uma maioria qualificada no conselho e por maioria absoluta no Parlamento Europeu. Pois bem, atendendo à possível fragmentação política no parlamento que resultará das eleições de domingo, será necessária uma dose significativa de negociação, paciência e habilidade para formar a próxima Comissão Europeia. Das próximas eleições europeias resultará, pois, uma nova composição política que será uma verdadeira… geringonça. Pois bem, habilidade, negociação no sentido de compra de votos, geringonça e perceção de que o sistema alcançou o seu “grau zero” remetem-nos para quem? Para o geringonçado António Costa, pois claro! É oficial: António Costa já está em pré- -campanha para se mudar para Bruxelas – nos últimos dias, os contactos com embaixadas de países europeus em Lisboa intensificaram-se (com França e Alemanha à cabeça); hoje, Costa jantará com Emmanuel Macron em Paris. António Costa é definitivamente o candidato da França de Macron à Comissão Europeia, podendo, por esta via, o socialista geringonçado português juntar, ao dos socialistas, o apoio dos liberais.
4. Isto, além de António Costa não gerar resistências junto dos setores políticos mais à esquerda: os verdes não afastarão um voto favorável à escolha de Costa; assim como o Grupo Confederal da Esquerda Unitária não poderá negar a sua concordância com a escolha de Costa – afinal de contas, neste grupo político europeu estão integrados o BE e o PCP (em Bruxelas estão juntinhos!), que formaram um Governo informal em Portugal com o mesmo líder geringonçado poucochinho. Acresce ainda que a CDU alemã – líder de facto do PPE, o grupo mais conservador do Parlamento Europeu, onde se juntam PSD e CDS – elogiou por diversas vezes (por conveniência estratégica e oportunismo tático, em função dos interesses específicos da Alemanha) o trabalho de Costa. Seria, pois, contraditório que a CDU alemã rejeitasse a candidatura de António Costa – aliás, o (quase ex-)primeiro-ministro já fez questão de recordar este pormenor a alguns políticos e diplomatas alemães… Do que ficou exposto resulta, destarte, que António Costa se afigura como a personalidade política que melhor poderá reunir consensos entre várias forças políticas representadas no Parlamento Europeu, formando uma espécie de geringonça europeia.
5. No fundo, os líderes europeus querem que António forme uma comissão geringonçada que permita isolar a nova força política (muito provavelmente, pujante) dos ditos populismos – unindo todo o outro bloco, desde os radicais de esquerda até ao PPE. É seguramente esta a ideia de Emmanuel Macron, que dirá no jantar de hoje, em Paris e em privado, com António Costa. Adicionalmente, Macron terá uma vantagem: passará definitivamente a ser o “Senhor Europa”, pois o dever de fidelidade de António Costa será para com ele – e não para com a Alemanha, o que representará uma mudança significativa da Realpolitik europeia dos últimos (longos) anos… Macron tentará, por esta via, mostrar uma imagem de autoridade na Europa – que não consegue mostrar no próprio país que governa. Importa ainda referir um aspeto que tem sido ignorado: já compararam o programa (se é que se pode falar de um programa…) político do PS para estas europeias com a mensagem política de Emmanuel Macron? É que são iguais! O PS limitou–se a fazer um copy-paste das mensagens do Presidente Macron sobre o futuro da Europa, repetindo-as aqui para consumo doméstico. Em rigor, até a ideia do “novo contrato social” é uma imitação rasca do “nouveau contrat social” que o Presidente francês divulgou no final do ano passado!
6. Não deixa de ser curioso constatar que o mesmo António Costa que chegou ao poder em Portugal através de golpada, desprezando convenções constitucionais da democracia portuguesa, será o mesmo António Costa que (provavelmente) chegará à liderança da Comissão Europeia por via de mais uma golpada em que se desprezarão os candidatos que foram apresentados ao eleitorado e a regra instituída em 2014… É apenas o padrão costista de atuação.
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Escreve à terça-feira