Reza a lenda que a cidade espanhola de Pontevedra foi fundada por Teucro, herói da Guerra de Tróia que, sentindo-se infortunado na sua terra, rumou à Galécia, actual Galiza, e aí se estabeleceu. Certo é que dos estudos históricos e arqueológicos já realizados não resta evidência de que a origem da cidade possa ser anterior à ocupação romana. Da lenda, porém, ficou o mítico Teucro, ainda hoje louvado numa curiosa inscrição em latim gravada na fachada da Casa Consistorial, ou Casa do Concello (sede do município), interessante edifício oitocentista – em espanhol dito “estilo decimonónico”. Ficou ainda a bonita Praça do Teucro, outrora a mais senhorial da cidade, em cujas principais fachadas, brasonadas, ressoam os brilhos da antiga heráldica da cidade. E muitas são as praças e os recantos, os restaurativos e as esplanadas. De resto, brasões, alguns magníficos, e edifícios monumentais são coisa que por ali abunda, e a arquitectura religiosa não se fica atrás; a Basílica de Santa Maria Maior, estilo gótico tardio com influências do manuelino, é o mais emblemático exemplar. Aliás, todo o centro histórico “es precioso”! E todo pedonal – em teoria, porque na prática não é bem assim… –, o que deu azo a vários prémios internacionais de mobilidade inteligente. Finalmente, é lindo ver o rio Lérez espreguiçar-se à roda da cidade, remansoso e limpo, vaidoso das pontes, antes de se enfiar nas Rias Baixas, ali mesmo em Pontevedra.
De igual modo, reza a lenda (?!) que somos um povo de brandos costumes; nem sempre, mas a recente “crise política”, que se esticou de sexta a sexta, foi exemplo de brandura e não só: as artimanhas, as piruetas e os flic- -flac à retaguarda foram espectaculares! Moleza nenhuma! E se tudo, aparentemente, não serviu para atingir os objectivos de quem esperava disso colher proveito, serviu para ficarmos cientes de que, acima de tudo, temos um Governo que é intransigente no que toca à política das “contas certas”. Esperavam os portugueses mais folga na propalada, e prometida, reposição de rendimentos? Tenham calma! Primeiro há outras contas a pagar. Há que assegurar que a banca não se desmorone – não ao colapso dos bancos, mas não à inimputabilidade dos banqueiros amnésicos. Há que garantir o pagamento do serviço da dívida – dívida nunca discutida, e muito menos renegociada. Há que conceder incentivos fiscais aos grandes investidores – que depois expatriam (offshore incluído) boa parte dos lucros. E, ó suma divindade, há que respeitar o défice! Só faltaria que o chefe do Eurogrupo, Mário Centeno, não fosse escrupuloso, obstinado, no cumprimento das regras europeias! Aliás, tem-se revelado, e mais não parecia, rendido ao estilo TINA (there is no alternative), e se corta no investimento, e se nos faz viver abaixo das nossas possibilidades – o superávite primário não é bastante –, é por um bem maior: a Europa. E é na cena europeia que se joga o prestígio – e se tem a recompensa – dos grandes actores políticos. Até já se fala em António Costa para a próxima presidência do Conselho Europeu. Credibilidade do país? Êxito (europeu) dos protagonistas? Tirem vossas conclusões.
Gestora, escreve quinzenalmente, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990