As principais são a diminuição da média decadal do aumento do PIB mundial anual a preços constantes que se verifica desde o final da ii Guerra Mundial e o aumento das desigualdades de riqueza à escala global, mas especialmente nos EUA. Neste país, apesar dos avanços no tratamento das doenças do coração e do cancro, assiste-se há três anos consecutivos, de 2015 a 2017, à diminuição da esperança de vida à nascença provocada principalmente pelo aumento dos suicídios, pela crise dos opioides e pelas doenças crónicas de fígado. Nos EUA, os rendimentos dos 90% da parte inferior da distribuição dos rendimentos médios a preços constantes estão estagnados. Apenas há crescimento no grupo dos 10% e, especialmente, no 1% dos rendimentos mais elevados. Na UE, o crescimento anual do PIB é anémico, os rendimentos da classe média estão na maioria estagnados e, em Portugal, o PIB per capita em paridade de poder de compra era 82,1% da média da UE em 2009 e, em 2017, apenas 76,6%.
Há muitas opiniões sobre as causas desta situação mundial, mas as principais razões são: demográficas nos países com economias avançadas; aumento da dívida pública e privada à escala global que, de acordo com um relatório recente do FMI, é já bastante superior à de 2008, antes da crise financeira e económica gerada nos EUA; sobre-exploração dos recursos naturais; maior procura de energia e de água a nível mundial; degradação e poluição do ambiente e alterações climáticas que se manifestam por uma maior frequência e intensidade de alguns fenómenos extremos, tais como ondas de calor, secas, fogos florestais, inundações, tempestades extratropicais e ciclones tropicais. Portugal é, na UE, um dos países mais vulneráveis às alterações climáticas devido à natureza dos impactos e à menor capacidade de adaptação que decorre do seu atual desenvolvimento socioeconómico, relativamente baixo.
A importância que os governos dão hoje em dia à economia circular, na qual há reciclagem e reutilização dos recursos naturais, tem origem no facto de que, sem ela, o crescimento económico fica muito mais difícil. É necessário abandonar a economia linear, onde não há reciclagem nem reutilização; caso contrário, a procura crescente dos recursos torna-os mais escassos, logo mais caros, e isso prejudica o crescimento económico. Porém, estamos ainda muito longe de uma economia circular.
Todas estas tendências tenderão a agravar--se nos próximos anos e décadas se não houver mudanças no modelo económico e financeiro prevalecente à escala global que permitam desenvolver a sustentabilidade social, económica e ambiental. O atual modelo está cada vez mais desajustado a um planeta dominado pelo homem, que não tem limites para a sua ambição de prosperidade económica e de consumo de bens e serviços, a sua ganância e o seu egoísmo, e cuja população humana global continua a crescer vigorosamente. De acordo com Joseph E. Stiglitz, é necessário desenvolver um novo contrato social entre os eleitores e os governantes eleitos, entre os trabalhadores e as empresas, especialmente as grandes multinacionais que monopolizam largos setores da atividade económica, e, finalmente, entre os pobres e os ricos.
Porém, a solução mais consensual nos meios políticos, económicos e financeiros, e na qual se concentram quase todas as esperanças, é o progresso tecnológico, concretamente a Quarta Revolução Industrial, que inclui a nanotecnologia, engenharia genética, biologia sintética, geoengenharia do clima e, sobretudo, o de-senvolvimento e a aplicação da robótica e da inteligência artificial em todas as áreas da atividade humana, desde os transportes à medicina, ao comércio e indústria, à gestão das cidades, aos serviços de justiça, à segurança e à guerra. A insistência apenas neste tipo de solução, que acaricia o ego e desenvolve a húbris humana, tem o perigo de gerar uma classe de humanos “sem utilidade”, como lhe chama Yuval Harari, e que George Wells, já em 1901, no seu ensaio An Experiment in Prophecy, designava por “pessoas do abismo”. Outra forma de encarar o problema é reconhecer, tal como o filósofo alemão Markus Gabriel, que os cidadãos enfrentam o perigo de se transformar em meros “proletários digitais”, ao serviço das empresas tecnológicas multinacionais gigantes, em detrimento da valorização e defesa dos valores humanos universais.
Com a fé ilimitada no poder da ciência e da tecnologia, os problemas da sustentabilidade passam a interpelar muito menos a geração social contemporânea e, especialmente, o seu comportamento. Neste discurso, a tecnologia irá certamente resolver todos os problemas que irão colocar-se às gerações futuras. Será assim? Ou será que a insustentabilidade do sistema atual irá gerar um futuro muito incerto e perigoso? O grupo social dos 1% que detêm uma parte crescente do poder e da riqueza mundial certamente que saberá e terá os meios necessários para evitar as adversidades desse futuro.
Porém, a maior parte da população dos países mais vulneráveis e frágeis e uma grande parte da população economicamente desfavorecida dos outros, em particular “a classe dos sem uso”, irá sofrer. A sua prosperidade económica e o seu bem-estar irão diminuir de forma acentuada. Se se aceitar a imprescindibilidade de uma transição para a sustentabilidade a nível da exploração dos recursos naturais, da conservação do ambiente, das alterações climáticas e do comportamento individual e coletivo, teremos necessariamente de inverter a tendência para o aumento das desigualdades através de pactos sociais baseados na ética e na solidariedade intra e intergeracional.
Filipe Duarte Santos
investigador, especialista em alterações climáticas