Hoje, 1.o de Maio, celebramos pela 45.a vez o Dia do Trabalhador. E só o celebramos porque há 45 anos aconteceu o 25 de Abril, a Revolução dos Cravos, que nos libertou da longa noite fascista. Como também celebrámos, em Abril, os 50 anos da crise académica de 69, a rebelião dos estudantes de Coimbra na qual, no dizer do actual reitor daquela universidade, “se deu início à Revolução de Abril”. Concorde-se ou não, certo é que a revolta dos estudantes fez rebentar o dique do descontentamento juvenil e, não por acaso, foram os jovens capitães de Abril que deram início ao processo revolucionário.
Somos muitos os que vivemos esses tempos, com mais ou menos idade, com mais ou menos consciência política, mas todos guardamos uma memória vívida “desse dia inicial inteiro e limpo” imortalizado no poema de Sophia. E no entanto…
Assistimos em Março às manifestações da greve climática estudantil, inspirada no movimento lançado pela jovem sueca Greta Thunberg, e mais recentemente ficámos a conhecer o internacional Extinction Rebellion que, apesar de já ter no cadastro uma série de acções, saltou para a ribalta quando jovens activistas interromperam o discurso de António Costa numa comemoração socialista. É grato ver a inquietação dos jovens perante a insanidade dos atentados ambientais, e triste vê-los arrepiados com o destino que lhes estamos a legar. Portanto…
Podemos andar alheados das questões ambientais, mas há momentos em que o frente-a- -frente com a natureza nos atinge como um soco no estômago e nos sentimos infinitamente insignificantes, mal-grado a arrogante ganância humana. Correr estrada adiante, em pleno Parque da Peneda-Gerês, tendo na mira aldeias serranas perdidas nos confins minhotos, e nem por isso dadas ao desalento, é experiência garantidamente compensatória, dir-se-ia mesmo inebriante. Germil, aldeia típica de montanha nos cimos da serra Amarela, espelha o descaso político a que são votados estes povoados, porém, assume-se desenxovalhada no seu casario de granito talhado ou de reboco tradicional, quelhas empedradas, quintais floridos, e nos pequenos socalcos à roda da aldeia onde verdejam as culturas de subsistência. Para lá chegar há que fazer quilómetros, serra adentro no meio dum silêncio de cortar a respiração que o ar rarefeito nos insufla, por entre tojos, urzes, giestas, tudo em flor, e encharcar os olhos no que se nos depara: encostas e cumeadas pinceladas de amarelo, lilás-roxo e branco, como se cobertas por originais tapeçarias. E quando aparece o arvoredo são bosques de folhosas, onde pontuam carvalhos, a fugir de vista. Descendo às faldas da Amarela, outra aldeia serrana, esta de fronteira, vem ao caminho: é a aldeia de Lindoso. O mesmo isolamento, apesar da estrada que liga a Espanha lhe passar rente. Impõe-se o castelo medieval, mandado erguer por D. Afonso iii, séc. xiii, que domina o casario, aqui um tanto adulterado por construções “modernas”, e a espaçosa, e espantosa, eira plantada com dezenas – há quem diga mais de cinco – de vetustos espigueiros, ainda hoje usados para secar cereais. A dois passos, o rio Lima, que por aqui se avista espraiado em albufeiras, sendo a mais importante a do Alto-Lindoso. Louvemos enquanto temos!
Gestora
Escreve quinzenalmente, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990