Visitar um castelo é sempre viajar no tempo. Quando muitos dos castelos portugueses foram construídos , tinham o propósito de defender um local. E a partir de agora serão as autarquias desses locais a tomar conta dos muros que outrora serviram de proteção. Com a descentralização iniciada com o atual Executivo, decidiu-se transferir as competências sobre estes monumentos que até agora estavam a cargo dos ministérios da Administração Interna e da Cultura para os municípios onde estão inseridos. No total, há 37 castelos de norte a sul do país que deixarão de estar na dependência do Estado central, sendo que 25 deles estão classificados como monumentos nacionais.
A questão gerou controvérsia e não foi pelos melhores motivos. O decreto-lei aprovado no início deste ano, assim como as propostas enviadas aos municípios nas mesmas datas, são claros: o que até aqui foi da competência da tutela, agora passa para as autarquias. E aqui, a grande mudança centra-se na realização de obras de reparação ou de manutenção. Mas há, pelo menos, um problema, os milhares de euros necessários para fazer obras nos monumentos nacionais podem estragar as contas aos municípios que, a partir de agora, terão de assumir todos os encargos. Para os autarcas, a transferência de competências é, sobretudo, a passagem da gestão e da conservação dos castelos para as câmaras municipais.
Quem não aceita Com vista panorâmica, o Castelo de Mértola, no Alentejo, fica num monte da vila – foi construído no século XV e já apresenta sinais de degradação. As intervenções de reparação e manutenção são necessárias, mas, em caso de transferência de competências, essa responsabilidade passa para o respetivo município.
Ao i, Jorge Rosa, presidente da Câmara Municipal de Mértola, sublinhou a posição do órgão que lidera: não aceitar a proposta do Governo. “Enquanto tivermos opção de decidir por nós e enquanto essa delegação de competências tiver os parâmetros e os critérios que estão nas competências, vamos sempre recusar, mas justificadamente”, diz Jorge Rosa. E as razões, diz, são tão claras quanto a decisão tomada: A aceitar a proposta, teria de ser o município a fazer as obras; a aceitar a proposta, teria de ser o município a assumir do pagamento, quer destas, quer de futuras obras. O projeto chegou a esta vila do Alentejo “sem nenhuma intervenção suportada pelo Governo e sem nenhuma verba prevista para esse efeito”, garante o presidente.
Segundo o autarca, quando questionou o Governo sobre a possibilidade de uma compensação, a resposta dada pelo Executivo a Mértola foi clara: é para isso que servem as receitas da bilheteira do castelo.
No entanto, para Jorge Rosa, o argumento não é, de todo, válido. “O museu tem cerca de 30 a 35 mil visitantes que pagam um bilhete de dois euros ou dois euros e meio por visita”, começa por explicar, frisando que, no total, são cerca de 60 mil euros anuais. Um valor que diz ser insuficiente para as obras que o castelo precisa: “O investimento é de vários milhões”.
Em Mértola, a medida não é vista com bons olhos e, enquanto for possível recusar, o município vai assumir sempre a mesma posição. Jorge Rosa assume que “como autarcas responsáveis”, não tiveram outra opção que não a de recusar. No entanto, mantém a esperança num outro desfecho: “Estamos a aguardar que o Governo volte atrás e nos seja proposta uma negociação onde possamos dizer ‘nós aceitamos a gestão do castelo e muralhas mediante esta e aquela intervenção e estas verbas’”. “Nessa altura nós não estaremos contra a delegação de competências e aceitaremos, mas para já, não há condições para que isso aconteça”, diz.
De salientar que na hora de distribuir dinheiro, nem todos os castelos são iguais. Neste momento, só são atribuídas verbas aos municípios cuja transferência de competências inclui também a gestão de recursos humanos. Nesta situação estão apenas nove castelos – Castelo de Belmonte, Elvas, Bélver, Marialva, Amieira, Viana do Alentejo, Velho de Freixo de Numão, Algoso e ruínas do Castelo de Alcanede. No caso específico de Mértola, explica Jorge Rosa, “o Governo acha que Mértola é uma terra muito turística e teria visitantes suficientes para suportar as despesas”.
Além de Mértola, também Santa Maria da Feira e Arraiolos recusaram a transferência de competências. Sobre este assunto, Ângela Ferreira, secretária de Estado da Cultura garantiu na semana passada que a tutela vai negociar com as autarquias que recusaram competências na área do património.
Quem aceita Para algumas autarquias, a transferência de competências é apenas a formalização daquilo que já acontecia até agora. Exemplo disso é o Castelo de Montemor-o-Velho, onde tem sido o município a realizar as intervenções necessárias. Por este motivo, vão “exercer as competências que foram transferidas no que diz respeito à gestão e conservação do castelo”, adiantou ao i Ana Luísa Ferreira, responsável pela comunicação da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho.
Sem qualquer tipo de financiamento contemplado, tal como muitos dos castelos cuja gestão passa para os municípios, em Montemor-o-Velho, “o executivo decidiu assumir por unanimidade” a decisão, uma vez que “todos sabem que a câmara tem gerido o castelo, apesar de essas competências não serem suas”, explica Ana Luísa Ferreira.
Castelos
– Castelo de Santa Maria da Feira
– Castelo de Arnóia
– Castelo de Bragança
– Castelo de Outeiro
– Castelo de Rebordão
– Castelo de Miranda do Douro
– Castelo de Mogadouro
– Castelo de Penas Róias
– Castelo de Algoso
– Castelo de Castelo Melhor
– Castelo de Numão
– Castelo Velho de Freixo de Numão
– Castelo de Monforte
– Castelo de Montalegre
– Castelo de Belmonte
– Castelo de Montemor-o-Velho
– Castelo de Avô
– Castelo de Penela
– Castelo de Linhares
– Castelo e muralhas de Celorico da Beira
– Castelo de Marialva
– Castelo de Pinhel
– Castelo de Alfaiates
– Castelo de Trancoso
– Ruínas do Castelo de Alcanede
– Castelo de Mértola
– Castelo da Vidigueira
– Castelo de Alandroal
– Castelo de Évora Monte
– Castelo de Montemor-o-Novo
– Castelo de Viana do Alentejo
– Castelo de Avis
– Castelo de Elvas
– Castelo de Bélver
– Castelo de Terena
– Castelo de Arraiolos
– Castelo de Amieira